A greve dos pilotos da TAP veio alterar os planos de muitos portugueses e estrangeiros durante os próximos dez dias. Apesar do ambiente de paciência, resignação e tranquilidade -, são muitos os rostos daqueles que viram a vida afetada pela greve dos pilotos.

Joaquim e Maria Cândida olham impotentes para o painel de voos no aeroporto de Lisboa: são emigrantes em França e foram até à Madeira visitar o país de origem. Agora que chegaram à capital vêm-se encurralados por uma greve de pilotos. “A única coisa que nos incomoda é não termos sido informados com conveniência”, explica Joaquim. Agora correm o risco de não poderem assistir ao batizado da neta, em Paris, para onde emigraram há muitos tempos. “Marcámos esta viagem há quatro meses. Só queríamos ter recebido algum e-mail ou telefonema para termos tido tempo de refazer os nossos planos”, conta o avô. E ali ficam, de malas prontas, a percorrer o aeroporto em busca de outras alternativas.

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Joaquim e a mulher esperam uma solução que lhes leve de volta a Paris, onde a família os espera para o batizado da neta amanhã.

Mesmo ao lado, nas escadas rolantes que se dirigem à saída por aeroporto, um pai e filho brasileiros não estão tão tolerantes. “É uma vergonha, é inaceitável”, afirma Marcos. Vieram de São Paulo juntos para viajar pela Europa e Lisboa era a primeira paragem. “E não voltamos mais, nunca mais pomos o pé em Portugal”, acrescenta o pai. Viaja há vinte anos, em trabalho ou em lazer, diz nunca ter passado por qualquer situação do mesmo género, “e olhe que já vi muita coisa no Brasil!”. O problema é que a bagagem já havia sido enviada para Roma e os dois estavam cá sem roupa alguma.

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A sair do balcão de apoio ao cliente da TAP está Teresa: quer viajar para Genebra para começar uma formação profissional que lhe pode garantir um posto de trabalho. “Não posso perder este voo. Noutro dia qualquer isso não seria problema, mas não desta vez”. Por isso encosta-se a mais um balcão, debaixo do olhar da mãe, para tentar encontrar outra solução. Talvez um voo noutra altura do dia ou mesmo noutra companhia. O importante é sair de Portugal: amanhã a vida vai mesmo ter de mudar.

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Teresa agendou um curso no estrangeiro que começa amanhã. Se não embarcar pode perder a oportunidade.

Os voos cancelados não se resumem apenas à Europa: para além do Atlântico os problemas também persistem. Uma família de colombianos permanece na fila de atendimento na esperança de obter mais informações sobre a greve: vão para Bogotá, depois de passarem vinte dias em Portugal. “Ninguém entende que precisamos de regressar, senão podemos perder o nosso trabalho“, desabafa uma das senhoras. Trabalharam anos para juntar dinheiro só para esta viagem: “não esperávamos que acabasse assim”.

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Várias famílias permanecem nas filas com esperança que os voos sejam confirmados. Muitos só conseguem informações à hora de partida.

Num recanto do aeroporto há um balcão de atendimento menos agitado onde Pedro procura uma alternativa. É em Portugal que está instalada a sua vida, mas precisa de chegar a Munique para visitar os pais. “Vim para aqui tentar a minha sorte”, diz ele e repetem muitas das pessoas com quem o Observador conversou durante a presença no aeroporto. As queixas ouvidas com maior frequência são de brasileiros que vieram a Portugal visitar a família ou de emigrantes franceses que se viram presos no país de origem por uma greve incapaz de lhes levar para juntos dos filhos.

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Pedro quer viajar até Munique, onde a família o espera. Para isso, precisa de trocar os voos que comprou com meses de antecedência

Houve quem não se desse conta sequer da greve: “Mas há uma greve aqui no aeroporto? Será que vamos mesmo voar?”, pergunta espantado um rapaz holandês, sentado no chão junto à irmã. Os pais conseguiram fazer o check-in e foi-lhes garantido um voo de regresso a casa. Aqueles que saem dos balcões com voo marcado dizem que foi um mero golpe de sorte: “esta greve é um tiro no pé, mas só os pilotos é que não entendem isso”, responde um dos viajantes quando inquirido sobre a opinião quanto à paralisação dos pilotos.

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Há quem não dê pela greve: uma família de holandeses não sabia que os pilotos da TAP estavam sem trabalhar. O voo de regresso a casa foi confirmado.

Entre a confusão gerada pela greve marcada pelos pilotos, outras complicações surgem sem que se dê por isso. Na noite de ontem, um casal de Viseu conseguiu trocar a viagem da TAP entre Lisboa e Porto ontem à noite para um voo da Ryanair. Agora queriam chegar à Madeira e não conseguem: o piloto, provavelmente por conhecer mal o território do arquipélago ou a meteorologia da região, decidiu cancelar o voo. Mais uma vez em busca de soluções, o casal dirigiu-se a um balcão de informação. “Desenrasque-se”, respondeu a funcionária. Só que ninguém lhes paga um “desenrascanço” já envolve hotéis marcados e transportes pagos, conta o senhor.

Entretanto, as idas e voltas continuam a movimentar o aeroporto. À chegada, a maior parte das malas está etiquetado com a companhia aérea da Arábia Saudita. Os táxis continuam a transportar recém-chegados, as escadas rolantes permanecem entupidas de visitantes e os aviões continuam a rasgar o céu do Aeroporto da Portela, em Lisboa.