O presidente da Câmara de Santarém manifestou esta terça-feira “incredulidade” com a Associação 25 de abril que questionou a atribuição da Ordem da Liberdade à cidade e criticou a “utilização indevida da figura de Salgueiro Maia” e dos militares de Abril.

“Vasco Lourenço não perde uma oportunidade de fazer a sua ‘prova de vida pública’ em claro menosprezo pelos valores de abril”, afirma uma nota enviada por Ricardo Gonçalves à agência Lusa, na qual o autarca escalabitano manifesta “desapreço” e “incredulidade” com o teor do comunicado divulgado na segunda-feira pelo presidente da Associação 25 de abril.

“A Associação 25 de abril deveria ter a humildade de aceitar que o 25 de abril não é propriedade de nenhuma ideologia política, de nenhuma ordem profissional e de nenhuma cidade! O 25 de abril é de todos aqueles que vivenciam os seus valores diariamente, conquistando a autoridade moral para si próprios, pelo exemplo de seus atos”, afirma.

Ricardo Gonçalves lamenta que a Associação 25 de abril não tenha “estudado um pouco sobre a grandiosa história de Santarém”, sublinhando que a proposta que levou à atribuição da distinção a Santarém no passado dia 25 de abril, subscrita por todos os grupos parlamentares, invoca “inúmeros factos históricos que justificam a atribuição desta condecoração à cidade”, muito para além do seu papel na Revolução de Abril de 1974.

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Como exemplos aponta o papel da cidade na reconquista cristã, na abolição da pena de morte e no fim da escravatura, na afirmação do liberalismo e do regime republicano e, também, da democracia e da liberdade (pelo papel desempenhado pela Escola Prática de Cavalaria e por Salgueiro Maia), realçando o facto de, durante vários anos, ter sido em Santarém que, a 18 de maio, se celebrou a “festa solidária da paz e das liberdades” até ser banida pelo Estado Novo por ser “demasiado ideológica”.

Ricardo Gonçalves refere ainda as distinções atribuídas à cidade em 1919 pelo então Presidente da República António José de Almeida – Ordem da Torre e Espada de Valor, Lealdade e Mérito – e em 2000, pelo chefe de Estado do Brasil Fernando Henrique Cardoso, da Ordem de Rio Branco.

Reconhecendo a “grande dívida de gratidão para com todos os militares de Abril que tiveram a coragem e a ousadia de derrubar a ditadura em 1974”, o autarca diz “compreender” que a condecoração “incomode aqueles que não sabem respeitar aquela liberdade que muitos ajudaram a reconquistar”.

“Mas a história está escrita e a verdade é que Santarém foi reconhecida por serviços relevantes prestados em defesa dos valores da Civilização, em prol da dignificação da pessoa humana e da causa da liberdade”, acrescenta, declarando o seu “orgulho” por ter recebido em nome do município “tão distinta e justa condecoração”.

No comunicado divulgado na segunda-feira, Vasco Lourenço afirma não poder calar a “indignação e o protesto por mais uma utilização indevida da figura de Salgueiro Maia e da generalidade dos militares de abril”, considerando ainda que “quem atribuiu a condecoração [o Presidente da República] não é digno do Portugal de abril”.

O presidente da Associação 25 de abril declarou-se “perplexo”, lembrando que Cavaco Silva negou a pensão a Salgueiro Maia enquanto foi primeiro-ministro.

O antigo Capitão de abril questionou ainda porque é que a condecoração foi atribuída a Santarém, e não a outra cidade do país, como por exemplo Lisboa, onde tropas “intervieram decisivamente e o seu povo teve papel preponderante no apoio aos militares do MFA”.

“É também no mínimo interessante que uma cidade, com os responsáveis autárquicos rejubilantes, seja galardoada apenas porque tinha no seu território a unidade militar de onde saíram as referidas tropas”, ironizou.