É o último discurso, o último apelo, a última tentativa. Portas pede que não lhe falte a voz (como aconteceu esta tarde a António Costa), e não falta. Nem a Passos. Numa praça da Figueira cheia de bandeiras azuis e cor-de-laranja, Passos pessoaliza a escolha de domingo: ou António Costa ou ele. Mas à pronúncia do nome do adversário, a audiência vaia e obriga Passos a pedir respeito. “Respeitamos todos os nossos adversários”, diz. E os assobios dão lugar a aplausos.

É de facto o último apelo. “Governa quem ganhar as eleições”, mas Passos adverte para um cenário em que isso não acontece. “Imaginem que os portugueses me escolhiam a mim, no domingo, mas acordavam, na segunda-feira, com António Costa – faria sentido?” E a mesma multidão que assobiou ao nome de Costa responde em uníssono: “Nãaaaaaaooo”. Passos tem a plateia, à exceção de um grupo que, ao fundo da praça, começou por vaiar o primeiro-ministro quando subiu ao palco, obrigando a juventude que acompanha a comitiva da coligação a entoar cânticos de apoio por cima.

Resta saber se tem os votos, os mandatos, e as condições para conseguir governar. E, hoje, último dia de campanha, é nesse sentido que vai o seu apelo: “A vontade popular deve ser respeitada, escolham o Governo que acham que é melhor, mas quando escolherem dêem-lhe condições para governar”, pediu. Pedido concedido. Pelo menos, lá está, para a plateia que o ouvia numa das praças centrais da baixa lisboeta e que começou logo a gritar “maioria! maioria! maioria!”. É isso que Passos quer, e pede, embora tenha permanecido, até ao fim da campanha, fiel à palavra proibida: absoluta.

Só esta tarde, num almoço em Cascais, é que se ouviu pela primeira – e última vez – a palavra mágica. Francisco Pinto Balsemão, fundador do PSD e militante número um, foi o convidado especial da coligação e pôs a plateia a rir e a aplaudir quando, do alto da sua experiência, se sentiu no direito de quebrar o tabu: “Eu sei que eles [Passos e Portas] preferem ser cautelosos e usar outros adjetivos, maioria estável, maioria significativa, mas eu não tenho de ser cauteloso e posso pedir uma maioria absoluta para domingo”.

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É que o “poder absoluto” assusta, e Passos prefere manter a postura de “humildade” que sempre disse ter. “Cumprimento com humildade os portugueses que se esforçaram e conseguiram arrumar a casa e abrir uma janela (ou “porta”, “passo a passo”, como se ouviu Portas dizer atrás do primeiro-ministro, brincando com os nomes) de esperança para o país”, disse em Lisboa, confidenciando mesmo aos portugueses que fazem boa figura lá fora. “Eu bem sei como vocês todos são admirados na Europa”, disse, acrescentando que, tal como diz o hino da coligação “cada vez somos mais”.

Passos diz que nunca “falhou” na missão que lhe tinha sido apresentada e volta a jogar no tabuleiro do tudo ou nada. “Por favor”, pediu. “Por favor, não vamos desperdiçar esta oportunidade e andar para trás”, insistiu. Portas, antes, já tinha dito que tinha “fé na vitória de domingo” e materializado o pedido: dar uma maioria “estável e coerente” à coligação para governar. Porque, caso contrário, vai tudo por água a baixo. “Custou-nos muito dizer adeus à troika, não vamos agora abrir um problema na União Europeia”, disse, advertindo para o facto de o PS estar a abrir as portas aos “amigos do Syriza”, leia-se PCP e Bloco de Esquerda, para chegarem ao poder.

Marcelo, Santana mais centenas de pessoas

O comício em Lisboa foi só a paragem final da caravana da coligação, que andou três semanas às voltas pelo país. Foi para os últimos dias, no entanto, que ficaram guardados os pesos pesados que serviriam como trunfos de última hora para a coligação. Marques Mendes apareceu no início da semana em Coimbra, assim como Rui Rio; Durão Barroso deixou uma mensagem em vídeo, Lobo Xavier, de muletas, apareceu ontem no Porto e hoje, em Lisboa, foi a vez dos ex-líderes Marcelo Rebelo de Sousa e Pedro Santana Lopes se juntarem à comitiva na maior demonstração de força entre o Largo do Carmo, o Chiado e a Praça da Figueira.

Cercados por um mar de gente, Passos e Portas, acompanhados de Marcelo, Santana e de vários ministros e nomes fortes do partido, como Pires de Lima, Rui Machete, Assunção Esteves, Assunção Cristas ou Maria Luís Albuquerque, que se juntou à bolha já no final, seguiram viagem pela baixa de Lisboa, apertados por um forte cordão de segurança. Eram centenas as pessoas que faziam a descida entoando gritos de apoio como “Vitória!”, “Portugal” ou “Eu quero ver, eu quero ver, maioria dia 4 quero ver”. Era um desfile de luxo para impressionar as telvisões e os lisboetas que, cerca de uma hora antes, já tinham visto passar a arruada do Partido Socialista.

Entre a multidão, Santana Lopes, que apareceu na qualidade de ex-líder e ex-primeiro-ministro, ainda quis deixar uma mensagem indiretamente dirigida ao Presidente da República: “não passa pela cabeça de ninguém que seja chamado a formar governo quem perde as eleições”, disse à Lusa no meio da arruada. Já Marcelo, aproveitou a boleia da coligação para espalhar o seu charme de quase candidato presidencial e ouviu da multidão que passava alguns incentivos: “Candidate-se, candidate-se!”. “Talvez daqui a quatro meses estejamos aqui outra vez para mais uma arruada”, ouviu-se.

Mas primeiro, as legislativas. E Passos e Portas não querem que ninguém fique em casa. “Por favor”.