Centenas de pessoas juntaram-se na praça com o nome do líder zimbabueano, a mais de oito mil quilómetros do centro dos festejos, na praça Marquês de Pombal, em Lisboa, repetindo os cânticos glorificando o Benfica, que ainda hoje voltaram a passar persistentemente na televisão por cabo em Moçambique.

“As nações são feitas assim, não escolhemos, nascemos nelas e esta é envolvência delas”, justifica Gilberto Mendes, 50 anos, um ator moçambicano que ajudou a compor a festa vermelha no centro de Maputo, citando uma velha máxima do seu clube, reiterada pelo seu pai, que “só é bom chefe de família quem é benfiquista”, e lamentando as irmãs que, pelo casamento, “se extraviaram”.

À praça Robert Mugabe, mal o árbitro apitou o fim do Benfica-Nacional, que determinou o 35.º título do clube da capital portuguesa e o seu terceiro consecutivo, na última jornada da principal liga de futebol de Portugal, centenas de pessoas começaram a afluir ao lugar que se convencionou da festa benfiquista, trazendo camisolas das últimas temporadas, muito barulho e alguma cerveja.

“Benfica é o mundo inteiro”, declara Sarmento Fernandes. “Olha para aqui, é só olhar”, prossegue o hoteleiro moçambicano de 36 anos, apontando para a praça e avenidas adjacentes cheias. E também para os seus irmãos e primos que quiseram estar presentes para avisar que se trata de algo “contagioso”, insistindo: “olha para aqui”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A festa benfiquista na capital moçambicana decorreu sem aparato policial, depois de nas últimas semanas as autoridades demonstrarem uma forte presença face aos anúncios anónimos de manifestações não autorizadas contra as revelações de endividamentos escondidos nas contas públicas.

Mais uma e pela terceira vez, este título acabou por trazer uma grande e invulgar presença nas ruas, provavelmente também não autorizada, em sintonia com algo que se passava apaixonadamente a mais de oito mil quilómetros de distância.

“Talvez pela influência de Portugal, porque os portugueses são quase nossos pais, criaram nossa língua e influenciaram nossa cultura e de certa forma puxámos essa cultura para acompanhar o campeonato português e os jogos”, diz Ana Pinto, jornalista, 23 anos, uma das muitas moçambicanas que encheram a praça do centro de Maputo para festejar o tri do Benfica.

Em ano de crises múltiplas em Moçambique, foi hoje notória uma menor presença de expatriados portugueses no centro da capital face ao ano anterior, refletindo a conjuntura adversa no país africano, mas não acompanhada por moçambicanos benfiquistas.

“Em qualquer país, em Portugal, na Europa, em África, Ásia, o Benfica é o maior do mundo”, diz o empresário de um dos mais conhecidos restaurantes portugueses em Maputo, novamente impressionado pela festa de um título do Benfica e, no entanto, continua a considerar todos bem-vindos, tenham a cor clubística que tiverem.

A noite futebolística em Maputo viveu-se em planos paralelos de dois televisores em vários lugares, um sintonizado em Braga, no jogo com o Sporting, e outro, em simultâneo, na Luz, do Benfica com o Nacional.

Em vários restaurantes da capital moçambicana, os adeptos vermelhos estiveram sempre em maioria, os verdes mais tímidos, guardando na intimidade a possibilidade do anticlimax do ano.

Após o adversário ter estado quatro minutos em vantagem no campeonato, o Benfica marcou logo a seguir, definindo o caminho imparável do título e agendando de vez o início da festa que, de muitos lugares na capital, confluiu na Robert Mugabe.

Tanto Benfica como Sporting golearam hoje, mas só um fez a festa em Maputo, numa festa sem alternativa conhecida se resultado inverso acontecesse.