Só um louco acha possível que um automóvel, concebido para andar na estrada, levar os miúdos à escola ou até ir às compras – contando que seja apenas um relógio, uma escova de dentes ou algo pequeno, porque a bagageira não é o seu forte –, possa ser simultaneamente tão rápido em pista quanto os Porsche 919 Hybrid, Toyota TS050 Hybrid ou Audi R18 e-tron Quattro, que vencem provas de resistência como as 24 Horas de Le Mans. Pois bem, esse “louco” tem nome: Adrian Newey, o engenheiro-chefe da equipa de F1 da Red Bull, para quem concebeu os fórmulas 1 que venceram quatro Campeonatos do Mundo consecutivos.

Depois das fotos oficiais de há uma semana, o novo AM-RB 001 – a denominação definitiva do modelo irá ser revelada posteriormente – teve direito ao seu primeiro banho de multidão. Ainda que contido, porque os convidados eram poucos, tal como poucas serão as unidades para venda, limitadas a um máximo de 150. Concebido por Adrian Newey, o mago especialista em aerodinâmica, o novo carro representa a materialização de um sonho que há muito o técnico britânico acalentava: conceber o melhor desportivo de estrada, seguindo as pisadas de Gordon Murray, outro inglês projectista de F1 que, depois de provar a sua mais-valia como responsável de design na McLaren, decidiu avançar com o primeiro McLaren de estrada.

E Newey não está sozinho neste projecto, uma vez que conta com todo o potencial tecnológico da Red Bull F1 Team e da Aston Martin, a quem caberá tornar o carro idealizado pelo especialista em F1 capaz de circular em estrada e resistir aos maus tratos durante 100 mil quilómetros ou mais. Todo um desafio, especialmente para quem desenha veículos que só têm que suportar uma corrida de F1 com uma hora e meia.

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Levezinho para ser rápido

Segundo Newey, o novo AM-RB 001 não será o hiperdesportivo mais potente do mercado, nem sequer o melhor em velocidade máxima. O que ele garante é que ninguém lhe fará frente em eficácia em curva. Em estrada, mas sobretudo em pista, onde o reputado engenheiro também quer provar a validade do seu primeiro carro de série e para a qual destina mais 25 unidades.

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Tal como acontece nos seus F1, o novo hiperdesportivo dependerá muito da aerodinâmica, embora não tenha nenhuma asa traseira proeminente, ao contrário dos seus rivais. Mas olhando melhor para a frente, com um elemento aerodinâmico junto ao solo, tipo asa de um fórmula, e para a zona lateral, torna-se óbvio que o AM-RB 001 vai ser capaz de gerar um enorme efeito solo, que cola literalmente o carro à estrada, sem o penalizar tanto em velocidade máxima, como as asas convencionais. E isso nota-se pela forma como a frente sobre-elevada deixa entrar ar sob o veículo, que depois é conduzido à volta do habitáculo e mecânica, antes de sair pelos painéis laterais e pela traseira.

Para tudo funcionar na perfeição, Newey necessitava de uma mecânica pouco volumosa e particularmente leve, pois está comprometido com a meta de 1 kg por 1 cv. Modelos híbridos como o La Ferrari (6.3 V12 de 800 cv associado a um motor eléctrico de 163 cv, totalizando 963 cv para 1.585 kg) ou o Porsche 918 Spider (4.6 V8 de 608 cv associado a dois motores eléctricos à frente somando 279 cv, mais um motor eléctrico/gerador acoplado ao V8 de 154 cv, totalizando 887 cv, para 1.704 kg) estão fora de hipótese, pois a complexidade da mecânica, os motores eléctricos e, especialmente, as baterias elevariam o peso da unidade motriz em mais 50%. Decidido que seria um motor a gasolina, foram testadas soluções V6 biturbo, V8 turbo e V12 atmosférico, sendo esta última a solução escolhida. Mais uma vez, o que pesou na decisão de Newey foi a melhor relação peso/volume, porque o técnico precisa do espaço à volta do motor para explorar a melhor aerodinâmica.

Contudo, o motor V12, que será desenvolvido pela Aston Martin e que recorrerá à experiência entretanto recolhida na competição, onde a marca compete na classe GT3, terá de fornecer qualquer coisa próxima dos 1.000 cv, apesar de existir quem afirme que a potência poderia descer até aos 900 cv, se o peso do carro baixasse para 900 kg, para manter a relação peso/potência. Ou seja, terá que ser um V12 capaz de fornecer 130 cv/litro (valor similar ao rendimento dos motores de combustão do LaFerrari e do Porsche 918) e com uma capacidade entre 6,9 e 7,9 litros, para atingir a cavalagem necessária.

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Mais rápido do que os carros de Le Mans

Se foi anunciada a produção de apenas 150 unidades do AM-RB 001 – mais 25 para competição –, a verdade é que segundo o CEO da Aston Martin, Andy Palmer, já foram recebidas mais de 370 encomendas, apesar de o preço final ainda não ser conhecido. Mas fica a promessa de que não andará longe de 3 milhões de euros. Antes de impostos.

Há razões de sobra para esta agitação de milhões para ter acesso ao carro mais rápido do mundo. Não em recta, que isso “é para meninos”. Mais rápido globalmente, ou seja, considerando a velocidade máxima, mas também a capacidade de travagem e a velocidade em curva. É isto que alimenta a reivindicação de Adrian Newey, que afirma que o seu carro vai ser mais veloz numa pista do que um carro de Le Mans. E sabendo que os Porsche 919 Hybrid não andam longe dos F1 actuais, não deixa de ser impressionante que se possa levar um filho à escola, ou ir às compras, num veículo que é capaz de se bater – na versão de competição – com os mais rápidos carros de corrida, como os LMP1 que vencem em Le Mans.

Segundo Newey, os LMP1 têm cerca de 1.200 cv para apenas 875 kg, mas apenas têm essa potência durante poucos segundos por volta, por limitação do regulamento e das baterias, período após o qual o valor deverá cair para cerca de metade, consoante o caso. O novo hiperdesportivo da Aston Martin e da Red Bull não terá limitações e poderá sempre contar com 1.000 cv, com a versão de competição a pesar menos do que uma tonelada, uma vez que será despida de todos os elementos de conforto – do ar condicionado ao rádio e sistema de navegação, entre outros. Um Porsche 918 Spider ou um LaFerrari dá uma volta a Silverstone em cerca de dois minutos, valor que o AM-RB 001 reduzirá em 20 segundos. Isto coloca o novo Aston Martin próximo de um minuto e 40 segundos, ou seja, ligeiramente abaixo dos 1.40,3 que o Porsche 919 Hybrid registou este ano. Até os 1.35,5 da melhor volta ao circuito inglês no Grande Prémio de F1 do passado fim-de-semana (Nico Rosberg) não andam longe do potencial do Aston Martin Red Bull.

Adrian Newey confessa o prazer que sentiu ao projectar o seu primeiro automóvel, mas admite que depois teve de recorrer à ajuda de Marek Reichman, o chefe de design da Aston Martin, para que o AM-RB 001 estivesse de acordo com a regulamentação no que respeita à segurança. Segundo o homem da Red Bull, uma coisa é desenhar um carro eficaz, outra completamente diferente é saber como fazer um pára-choques, por exemplo, algo que Newey nunca concebeu, tão pouca utilização têm na F1. Já Gordon Murray tinha reconhecido que, também ele, sentiu dificuldades nas coisas mais simples. E foi por isso que a McLaren teve de contratar um engenheiro da indústria automóvel para o ajudar a conceber um fecho de porta, um vidro eléctrico, ou qualquer outra coisa que tivesse de funcionar durante 10 anos ou mais sem problemas, desgastes ou avarias. Algo que também não faz parte dos requisitos na F1.

Com o projecto terminado em matéria de estilo, os primeiros protótipos do AM-RB 001 para teste deverão começar a ser produzidos em 2017, para as primeiras unidades serem entregues aos clientes no início de 2019.