Os partidos da oposição timorense exigiram esta terça-feira ao Governo que seja mais claro nas medidas do seu programa em áreas como justiça e reforma administrativa, que consideraram “irrealistas” e “pouco claras”, e como se enquadram nos programas em curso.

Em causa está a interpretação do artigo 108 da Constituição, que define como deve ser o programa do Governo, um documento em que “constarão os objetivos e as tarefas que se propõe realizar, as medidas a adotar e as principais orientações políticas que pretende seguir nos domínios da atividade governamental”.

A oposição tem insistido, desde o inicio do debate, na segunda-feira, no que considerou ser falta de clareza sobre algumas das medidas anunciadas no programa, com falta de explicação sobre como o Governo de Mari Alkatiri vai realizar o que anuncia.

Dionísio Babo, ex-ministro e deputado do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), questionou a vontade do executivo de “reajustar a política de reforma administrativa”, medida que disse ser “pouco rigorosa, pouco clara e desprovida de sentido político útil”, tendo em conta o que foi feito nos últimos anos.

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Babo disse que os anteriores Governos – de que fez parte – “fizeram um trabalho intenso para implementar uma política de descentralização” faseada e que o programa do Governo parece sugerir que “esse trabalho não serve e tem que ser reajustado”.

“Mas não explica as razões e quais são os problemas concretos que propõe realizar para resolver os problemas. O Governo pretende um cheque político em branco”, disse Babo.

Qual é a intenção de ajustamento político? Isto tem que ser muito bem explicado. É um reajustamento da política ou um desmantelamento do que se tem vindo a estabelecer, com uma solução complemente diferente? O Governo vai alterar a reforma administrativa iniciada, vai alterar a divisão administrativa em vigor? E vai levar a cabo eleições municipais?”, questionou.

Referindo-se a outras “inconsistências” do programa do Governo, Babo deu como exemplo a sustentabilidade de finanças públicas com o Governo sem esclarecer quais serão “as suas fontes alternativas de financiamento” ou como concretizar os projetos de expansão da rede escolar.

Na sua intervenção, Carmelita Moniz, deputada do CNRT, criticou várias propostas do Executivo, incluindo a pretensão “de reajustar” as atividades do Centro de Formação Jurídica, quando ainda nem foi implementado o decreto-lei sobre esta matéria, aprovado pelo anterior Governo.

“Fala de programa e atividades não adequadas, mas não explica de forma clara e objetiva, concretizando estes aspetos. Governo propõe melhorias na qualidade de formação jurídica, mas qual é o objetivo? Não vejo resposta a estas questões no programa do Governo”, disse. A deputada questionou em particular a intenção de transformar o centro “numa verdadeira escola de direito”, o que pode entrar em conflito com as faculdades de Direito e subverter a natureza profissionalizante do centro.

Carmelita Moniz questionou ainda o projeto de expansão da rede de tribunais, que considerou irrealista, já que não há recursos, inclusive humanos, para poder concretizar esse objetivo em cinco anos. Timor-Leste tem 34 juízes de direito, 32 procuradores e 31 defensores públicos. “O programa tem que ser realístico e ter em conta a realidade do país”, afirmou.

Deputados do Partido Libertação Popular (PLP) insistiram também no que disseram ser a falta de informação mais detalhada e precisa no programa do Governo, com Demétrio de Carvalho a dar como exemplo as referências a objetivos económicos e ambientais.

Demétrio de Carvalho citou a falta de dados macroeconómicos e a pouca clareza sobre como vão ser adotadas as medidas previstas, o mesmo ocorrendo em áreas como o ambiente “e o compromisso com a implementação da Declaração de Paris”, sem explicar como o fará. “O Governo diz que o programa não precisa de mais detalhes porque não é o Orçamento. As suas respostas não inspiram confiança, senhor primeiro-ministro”, afirmou.

O segundo dos cinco dias previstos de debate começou com o primeiro-ministro, Mari Alkatiri, na tribuna de honra, ladeado pelos seus cinco ministros de Estado, Rui Gomes, José Ramos-Horta, Rui Araújo, Mariano Sabino e Estanislau da Silva. Estes debates são o primeiro grande teste ao Governo minoritário formado pela coligação da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) e do Partido Democrático (PD), que controlam 30 dos 65 lugares do Parlamento Nacional.

A oposição – Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), Partido Libertação Popular (PLP) e Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO) -, que controla 35 lugares, constituiu-se como alternativa de governação, caso o programa de Governo seja chumbado e, consequentemente, o Executivo caia.