A EDP já foi notificada do valor que pode vir a perder dos pagamentos recebidos pelas centrais elétricas abrangidas pelo regime dos custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC). Em causa está um valor máximo de 357,9 milhões de euros associado aos aspetos considerados inovadores na concretização desta legislação durante o Governo de José Sócrates, em 2007. Esta conta foi feita pela Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), a pedido do secretário de Estado da Energia, mas ainda não está fechada, porque a EDP respondeu ao valor notificado com “observações e críticas”, refere o relatório e contas do primeiro semestre, divulgado esta quinta-feira.

Na prática, e se este cenário se confirmar, a elétrica poderá ter de enfrentar uma perda de receitas que recebeu no passado, e que foram financiadas pelos consumidores da eletricidade. Isto porque os atos legais que fundamentaram estes valores serão considerados nulos. Em causa estão os contratos que suportam as chamadas rendas às centrais da elétrica liderada por António Mexia. Contratos que estão a ser investigadas pelo Ministério Público, por suspeitas de favorecimento de governos, mas também pela comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas do setor elétrico.

E se os polémicos contratos das rendas da EDP forem nulos?

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Caso se “venha a consubstanciar uma posição contrária à EDP, mesmo após as observações que a EDP produziu em resposta à notificação, é intenção do Grupo EDP analisar todos os meios ao seu alcance para defender os melhores interesses da EDP e dos seus acionistas”.  O Observador questionou a empresa e a secretaria de Estado da Energia sobre o ponto de situação deste processo, mas não obteve comentário para já.

Não é evidente como será materializado o acerto de contas entre a elétrica e os consumidores de eletricidade, até porque a EDP ainda tem direito a receber pagamentos, por via dos CMEC, no valor de 154 milhões de euros, nos próximos dez anos. Este montante, calculado pelo regulador da energia, também é contestado pela empresa. No entanto, o objetivo do Governo será usar esse saldo que passa a ser positivo para os consumidores da eletricidade de forma a reduzir a dívida tarifária e também a baixar o preço final. A diferença entre os 357,9 milhões pagos a mais e os 154 milhões a receber nos próximos dez anos dá, a valores atuais, cerca de 200 milhões de euros.

A conta ao ganho para a EDP, que nesta lógica terá sido uma perda para os clientes da eletricidade, foi pedida na sequência de um parecer emitido pelo conselho consultivo da Procuradoria Geral da República no ano passado. Esse parecer considerava que os aspetos da legislação e regulamentação dos CMEC, que introduziram inovações face ao quadro legal aprovado por uma lei do Parlamento em 2004, podiam ser considerados nulos.

Governo impõe corte de 100 milhões à EDP e admite nulidade de atos políticos que validaram rendas

Quando homologou o valor final a pagar à elétrica até ao fim dos contratos CMEC, o secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, salvaguardou que o ajustamento final destes pagamentos só seria feito quando o Governo tivesse recebido a conta ao impacto financeiro dos tais aspetos inovadores dos diplomas e regulamentos que concretizaram este modelo a partir de 2007.

Fica agora a saber-se que a elétrica poderá ter recebido mais 357,9 milhões de euros do que teria direito pela lei de 2004, mas a conta só ficará fechada quando a secretaria de Estado da Energia homologar o valor final que receber da DGEG que, por sua vez, pode incorporar algumas observações feitas pela elétrica.

Segundo a notificação da DGEG, o valor máximo de 357,9 milhões de euros de sobrecompensações às centrais elétrica resulta de duas situações.

  • A não previsão legal de testes à disponibilidade das centrais elétricas, a maioria são barragens, que são remuneradas pelos CMEC.
  • E os pagamentos recebidos pelas centrais no mercado dos serviços de sistema.

Estas situações já tinham sido sinalizadas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos e pela Autoridade da Concorrência, ainda durante o anterior Governo, e motivaram uma auditoria independente feita por uma consultora internacional que apontou para margens anormais em algumas centrais. A auditoria não foi conclusiva sobre os valores da sobrecompensação que a EDP terá encaixado, mas foi pedido um desenvolvimento deste trabalho.