“Ainda há banqueiros ou deixou de haver banqueiros?”. À pergunta do moderador do Fórum Banca 2018, que reuniu os líderes de alguns dos principais bancos a operar em Portugal, o presidente da Caixa Geral de Depósitos, Paulo Macedo, deu uma resposta muito direta: “antigamente um banqueiro respeitado era aquele que assinava um crédito de 200 milhões só mediante um aperto de mão”. Essa prática contribuiu para os “erros do passado” e, se falamos em “banqueiros desses, espero que já não haja, apenas pelo que nos custou a todos”.

O comentário surgiu esta quinta-feira, no Fórum Banca 2018, organizado pelo Jornal Económico e pela consultora PwC. O presidente da comissão executiva do banco público defendeu que “hoje, os sistemas de concessão de crédito não são perfeitos mas são, claramente, melhores dos que os que havia no passado, quer seja através dos critérios de risco, de análise de rating, de modelos que evoluíram muito”. Contudo, tão ou mais importante, diz Paulo Macedo, é a “prática”:

Há coisas que, no passado, excederam claramente a questão dos modelos e da análise de risco. Houve muita asneira, que a banca tem de reconhecer que a fez, e da forma como deu crédito. Como dizia João César das Neves, um dos problemas foi a Old Boys Network [a rede dos velhos rapazes]. Um banqueiro respeitado era aquele que assinava um crédito de 200 milhões só com um aperto de mão. Não sabia as especificidades do que estava a assinar. Espero que, destes banqueiros, já não haja”.

Paulo Macedo comentou que “quem gere os bancos não pode pensar que o dinheiro é seu. O dinheiro é dos clientes e dos depositantes”. Associado a isso, diz Paulo Macedo, está a “confusão” em torno da definição do que é que deve ser a Caixa enquanto banco público. “Um banco público deve ser um instrumento da política económica? Parece que da última vez que fizeram isso deu mau resultado”, ironizou Paulo Macedo, acrescentando que “o que dizem quando o acionista deu ordens ao banco público para fazer isto ou aquilo não deu bom resultado”.

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Ao lado de Paulo Macedo estava sentado António Ramalho, presidente do Novo Banco (que resultou da resolução do Banco Espírito Santo), que reforçou o papel dos bancos como “compradores e vendedores de risco” — quase como “blockchains humanas” — e sublinhou que, hoje, “não há uma decisão de crédito que seja tomada por uma só pessoa” e que “os exemplos do passado são excelentes para aprender com eles, para o futuro”.

Mas para achar responsáveis por estes “erros”, o presidente da Caixa de Crédito Agrícola, Licínio Pina, defendeu que os “banqueiros” não são os únicos responsáveis — ele que não se considera “um banqueiro porque não tenho ações de nenhum banco, o meu banco não tem ações”. Uma parte dessa responsabilidade deve ser atribuída aos reguladores, que “deviam ter, à data, proposto algumas soluções macroprudenciais no sentido de evitar a escalada de transformação que existia: quando mais crédito faziam, mais dinheiro tinham. Era o modelo que havia e devia ter sido posto em causa mais cedo”.

Numa conferência onde também se debateu a inovação no setor bancário, e dois dias depois de outros banqueiros terem culpado a “inovação” pelos problemas que levaram à crise financeira, Miguel Maya, do MillenniumBCP, refutou essa ideia, dizendo que não se pode confundir “inovação com intrujice”. Ao contrário da “intrujice”, a inovação será, defendeu o presidente do MillenniumBCP, uma “arma fundamental” para que os bancos se reinventem e atraiam “os melhores talentos” para o conseguir fazer.

Contudo, apesar de concordar que o novo quadro de supervisão é uma obra “fenomenal”, criticou alguns aspetos em relação aos quais tem um sentimento “agridoce”, designadamente nas diferenciações que ainda se fazem entre os bancos dos vários países quando à ponderação dos riscos e, por outro lado, na fixação com os rácios de crédito malparado quando, na ótica de Miguel Maya, o que importa é até que ponto é que essas exposições estão (ou não) cobertas por imparidades. Além disso, o presidente do BCP pediu que os reguladores atuem no sentido de garantir que não há arbitragem regulatória no setor financeiro, fazendo com que as multinacionais tenham de se sujeitar às regras do mercado onde operam e não à regulação da jurisdição onde têm sede.

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