Antes da novidade, recuemos alguns anos. Em 2008, quando a plataforma alemã SoundCloud apareceu era descrita como o YouTube do áudio e conquistou a preferência de músicos e utilizadores em todo o mundo, tendo até ajudado à decadência do MySpace, famoso site de partilha de música que fez história nos primeiros anos do novo  século. Acontece que a realidade da internet muda muito depressa e, de acordo com várias publicações especializadas, a SoundCloud demorou demasiado tempo a alterar o modelo de negócio e acabou ultrapassada por serviços de streaming de áudio como o famoso Spotify (que até é mais velho, nasceu em 2006) ou o não menos famoso Apple Music.

Em 2016, a empresa tentou apanhar o comboio, que estava em andamento e em alta velocidade: lançou o serviço SoundCloud Go para se aproximar do modelo Spotify — venda de assinaturas e acesso em streaming a milhões de músicas de alta fidelidade, sem publicidade pelo meio e com hipótese de reprodução offline. Três anos depois, esse mesmo serviço chega a Portugal — começou a funcionar nesta terça-feira, adiantou a empresa ao Observador. O preço é de 6,99 euros por mês (para acesso web e sistema operativo Android) ou de 9,99 euros (sistema operativo Apple), com oferta dos primeiros 30 dias.

Além do SoundCloud Go, a cujo nome acresce agora um sinal de mais (plus), a plataforma anunciou outra novidade para o território português: a introdução de anúncios publicitários na versão gratuita, à semelhança do Spotify, cujas receitas presumivelmente servirão para distribuir entre os criadores de novos conteúdos. As inserções de publicidade são fornecidas em Portugal pelo revendedor Targetspot (do grupo belga Radionomy).

Em conversa telefónica na segunda-feira, o vice-presidente para a área de marketing, Anthony Gabriele, disse que a SoundCloud atua hoje em duas frentes.

“Por um lado, servimos criadores de som, DJ ou autores de podcasts, por exemplo, que estão a começar a dar nas vistas ou que já são profissionais estabelecidos. Por outro lado, somos um serviço para utilizadores que querem descobrir as melhores novidades musicais.”

Ou seja, se a plataforma vive de conteúdos gerados pelos utilizadores, conteúdos carregados numa nuvem de dados de acesso mundial, o que muda a partir desta semana é que esses mesmos utilizadores passam a poder tirar proventos (“monetization opportunities”, disse Anthony Gabriele), enquanto os ouvintes comuns passam a ter acesso a “mais de 200 milhões de faixas originais, DJ sets ou remixes da autoria de mais de 20 milhões de criadores de todo o mundo”.

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O responsável de marketing não especificou quanto dinheiro pode cada criador ganhar. “Depende da popularidade do criador, do número de ouvintes”, sublinhou Anthony Gabriele, remetendo para explicações que se encontram na página creators.soundcloud.com. “Na nossa plataforma temos desde criadores que fazem música na cave do prédio até autores contratados por grandes editoras, por isso não será possível indicarmos os rendimentos médios. O importante é sublinhar que damos aos artistas todas as ferramentas para começarem do zero, para autopublicação, para construirem o seu público e chegarem à profissionalização.”

O Observador testou antecipadamente o novo serviço na versão web e na aplicação para iPhone e verificou, por exemplo, que não se encontrava disponível o novo disco dos Gift (“Verão”, publicado em fins de março), que todos os registos de Conan Osiris podiam ser escutados e que de Amália Rodrigues havia uma ampla seleção de álbuns, mas nenhum deles era o mais conhecido da fadista (“Busto”, de 1962). Questionada sobre quantos artistas portugueses estão já hoje disponíveis, fonte oficial da SoundCloud respondeu que a plataforma é utilizada por “vários criadores” emergentes e deu como exemplos Moulinex e Violet.

Na segunda-feira à noite, o site e a aplicação estavam escritos em português do Brasil, ainda que a empresa preveja operar entre nós com uma versão em português europeu. No caso do Spotify, a aplicação para telemóvel, nomeadamente a que corre nos iPhone, é também a do português do outro lado  do Atlântico.

Sendo inevitável a comparação com o Spotify (ou o YouTube Music ou a Apple Music, igualmente serviços de streaming muscial), perguntámos a Anthony Gabriele se vê a plataforma sueca como concorrente.

“São serviços diferentes, com objetivos diferentes. O Spotify aposta tudo nos ouvintes, foca-se em chegar a milhões de pessoas em ter o último single de um artista global. Nós queremos sobretudo pensar nos criadores, ajudá-los a desenvolver a carreira e ligá-los aos ouvintes”, respondeu.

Mas será que os portugueses estão interessados em pagar por mais um serviço de streaming? “Na verdade, os números de outros países mostram que em muitos casos há clientes que já hoje são assinantes da SoundCloud e do Spotify ao mesmo tempo. À parte isso, 41% dos nossos clientes só pagam pela SoundCloud, normalmente os utilizadores mais novos. Neste ecossistema, não consideramos o Spotify nosso rival, trabalhamos todos em paralelo.”

A SoundCloud descreve-se como “a maior plataforma de partilha de áudio no mundo” e o “ecossistema de referência para músicos emergentes ou estabelecidos e ouvintes que querem descobrir música nova”, mas não revela o número de pessoas registadas.

Além de Portugal, o serviço SoundCloud Go+ está hoje presente em 14 países, incluindo EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Holanda, Itália e Espanha. A chegada a Portugal relaciona-se com o facto de a SoundCloud considerar que o país “é hoje um mercado fundamental”, com um “conjunto muito forte de criadores, sobretudo na área do hip-hop e do R&B, mas não só”, disse o responsável de marketing.