A Ordem dos Médicos (OM) acusou esta segunda-feira o primeiro-ministro de confundir o seu papel, com declarações “incompreensíveis, factualmente erradas e que enfermam em problemas conceptuais que importa clarificar”.

A Ordem reagiu assim, em comunicado, às declarações do primeiro-ministro, António Costa, no concelho de Sintra, a criticar o exercício dos poderes regulatórios de algumas ordens profissionais, em especial a dos Médicos, para restringir a concorrência e limitar o acesso à formação, considerando que tal impede a resposta às carências.

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Em resposta, a OM vem esclarecer que “a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) é a entidade responsável pela avaliação e acreditação das instituições de ensino superior e dos seus ciclos de estudos, pelo que um novo curso de medicina carece de aprovação pela A3ES e não pela Ordem dos Médicos, como deu a entender o primeiro-ministro quando defendeu a existência de um novo curso ministrado por uma universidade privada”.

“Não deixa de ser curiosa, no entanto, a forma combativa como o primeiro-ministro defende a existência de cursos de Medicina nas universidades privadas”, considera.

Em relação ao ‘numerus clausus’ nos cursos de Medicina, explica que “a sua definição é da competência da Direção-Geral do Ensino Superior, na dependência do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e não da Ordem dos Médicos”, que “nem sequer é ouvida”.

“Mesmo assim, importa lembrar que o ‘numerus clausus’ de Medicina sofreu um aumento exponencial nas últimas décadas. Os ingressos em Medicina mais do que duplicaram em apenas 20 anos, de cerca de 600 vagas em 1999 para mais de 1.500 no último ano. Importa também lembrar que este aumento de vagas tem levado a uma maior insatisfação no terreno com a qualidade da formação, seja pela limitação das infraestruturas físicas, seja pela dificuldade de resposta em termos de tutoria e ensino clínico prático, uma vez que os quadros mais experientes do SNS têm saído do setor público, seja por aposentação ou para setor privado, social e estrangeiro”, acrescenta.

A OM afirma que este aumento na formação pré-graduada “tem também impacto na formação pós-graduada, isto é, no acesso a uma especialidade, onde, mesmo assim, a Ordem dos Médicos tem conseguido alargar, todos os anos, as capacidades formativas atribuídas, atingindo um recorde de 1.729 vagas identificadas para 2019 e mais de 1.800 já identificadas para 2020”.

Relativamente à existência de médicos em número suficiente, diz a Ordem que Portugal “tem o terceiro maior rácio de médicos por cada 1.000 habitantes da União Europeia a 28, à frente de países como Alemanha, Holanda, Bélgica e Reino Unido”.

“O país conta com um rácio de 4,8 médicos por 1.000 habitantes, quando a média da UE28 é de 3,6 (dados Health at a Glance: Europe 2018). O problema não está, por isso, no número de médicos existentes no país e sim na incapacidade que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem tido em atraí-los e mantê-los, com um projeto de carreira estimulante e duradouro”, argumenta.

A Ordem justifica esta posição, afirmando que “no SNS o rácio baixa para 2,8 médicos por 1.000 habitantes, mesmo considerando que dos 28 mil médicos, quase 9.000 são internos em formação (dados Balanço Social da Administração Central do Sistema de Saúde, 2017)”.

“A afirmação do primeiro-ministro causa também estranheza, uma vez que tanto ele como o Ministério das Finanças e Saúde têm vindo a público assegurar, por diversas vezes, que o SNS nunca teve tantos médicos”, conclui.