Anna Faris, Angelina Jolie, Ashton Kutcher, Britney Spears, Christina Aguilera, Gwen Stefani, Heidi Klum, Jennifer Garner, Megan Fox, Angelina Jolie (outra vez), e mais do que uma Kardashian (Kim recomendou-a às irmãs Kourtney e Khloe). A lista de pessoas muito importantes, e muito à beira de se divorciarem, que recorreram aos serviços de Laura Wasser incluiu ainda o célebre caso que opôs Johnny Depp a Amber Heard. E podíamos continuar. Aos 51 anos, a advogada de Los Angeles é um dos nomes mais famosos em matéria de direito da família, de tal forma solicitada pela elite de Hollywood que dificilmente se irá separar do rótulo de “rainha dos divórcios”, ou “Diss Queen”. Na passada quarta-feira, foi a vez de Liam Hemsworth tratar dos papéis para oficializar a sua separação de Miley Cyrus. De novo, a burocracia e outras possíveis dores de cabeça serão mediadas por Wasser, que pouco ou nada adiantará sobre esta e outras pastas. “Temos os lábios selados. Nunca falamos dos nosso casos”, sentencia em cada entrevista que dá, ciente que a discrição é provavelmente a única ou das poucas que casa bem e para vida com o seu trabalho.

A tática para minimizar a exposição pública dos seus clientes envolve diferentes truques aplicados ao longo dos anos, que ajudam a despistar atenções e a abrandar o circo mediático. Passa mesmo por entregar os papéis “na sexta-feira ao final do dia, em vésperas de um feriado ou na véspera de Natal”, admitiu à Bloomberg, confessando ainda que por vezes aconselha as celebridades a fazerem um compasso de espera, para que a notícia da sua separação se dilua entre outras separações que pelo caminho possam dividir o mal pelas aldeias da imprensa (não foi por acaso que os divórcios de Gwen Stefani/Gavin Rossdale e Jennifer Garner/Ben Affleck, ambos clientes de Wasser, foram tornados públicos na mesma altura).

Mas o recato da advogada de pouco serve perante a inquietação permanente de eventuais funcionários dos tribunais de Los Angeles — as suas línguas conseguem ser mais rápidas que as pernas de um velocista dos 100 metros e quem agradece é o site de fofocas de celebridades TMZ que costuma avançar com a bomba antes mesmo da sua explosão. “Às vezes envio alguém a correr ao tribunal para conseguir um simples carimbo e quando me trazem os documentos de volta já está nas notícias”.

Laura a chegar a tribunal em Los Angeles, em fevereiro de 2013 © Valerie Macon/Getty Images

Até que a Internet nos separe: “A evolução da dissolução”

Com uma experiência de mais de 25 anos no meio, Wasser lançou no verão de 2018 a plataforma que visa facilitar ao máximo um processo desta natureza e democratizar os seus préstimos: It’s Over Easy é a ferramenta que permite resolver tudo online e da forma mais indolor possível, a partir de 750 dólares, valor que naturalmente ainda pode provocar alguma agonia às carteiras mais sensíveis mas está a milhas de um serviço convencional.

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Por essa altura, voltou a frisar a sua visão do divórcio, assumindo-o como “uma evolução na forma como uma família funciona”, afastando a ideia catastrofista de “fracasso ou pesadelo” e revendo a própria mudança na forma como os americanos olham para o assunto. Tudo para ditar o mínimo de dano no orçamento e no bem estar da prole. À The Hollywood Reporter defendia esta solução low budget em contraste com o valor médio de um processo de separação nos EUA: varia de estado para estado, mas situa-se em regra geral nos “20 mil euros”. Números à parte, a descontração imprimida a It’s Over Easy mostra como gosta de ativar o descomplicador: por aqui os casais, ou futuros ex-casais, tanto encontram dicas úteis sobre a guarda dos filhos como recomendações para quando voltarem a estar disponíveis para novos romances, contactos de nutricionistas, terapeutas, branqueadores de dentes e solários. “Os millennials fazem tudo online, das compras ao namoro. Por que não divorciarem-se online?”, defende Laura, que alimenta ainda o podcast “DivorceSucks!”.

A cantora Miley Cyrus e o ator Liam Hemsworth no desfile Saint Laurent Men’s Spring-Summer 2020, em Malibu, em junho de 2019, numa das últimas fotos enquanto casal. © KYLE GRILLOT/AFP/Getty Images

Embalada por um outro caso badalado bem recente, agora o da separação do agente de Hollywood Patrick Whitesell de Lauren Sanchez, que entretanto surgia nas manchetes como a nova namorada de Jeff Bezos, também ele a encabeçar mais um divórcio a envolver muitos milhões, a revista Town&Country recuperou em fevereiro de 2019 um artigo escrito por Wasser um ano antes para esta publicação. Porque afinal, muitos pontos de discórdia são intemporais e a dose de drama, ontem como hoje, pode atingir níveis estrondosos.

“Não vi tudo mas já vi muito (…) Pensem por exemplo na mulher que passa o seu tempo livre enquanto espera pelo divórcio na garrafeira de casa, a arrancar centenas de rótulos da preciosa coleção do marido só para ela perder valor no mercado dos vinhos. Ou no marido que copiou todo o disco rígido do computador e enviou por email fotos da mulher nua com o professor de ténis dos filhos, e ainda os recibos das suas cirurgias estéticas, que fez chegar aos amigos chegados e a todos os elementos da associação de pais do colégio dos miúdos”.

E viveram felizes até certo dia: o difícil é viver com “menos de 150 mil dólares por mês”

Um longo perfil na Porter dedicado à especialista mostra como a advogada, mãe de dois filhos, conjuga com destreza a vida pessoal, social (sempre a esbanjar estilo, na circunstância a usar um vestido Valentino) e profissional como ninguém, e apesar dos conselhos que eventualmente possa partilhar, admite que para muito boa gente as velhas máximas continuam a prevalecer. “Somos educadas a sonhar com o anel de noivado, com o belo dia do casamento, com a lua de mel, em engravidar. É absurdo. É divertido se tiveres o resto em perspetiva: uma carreira, as dificuldades de educar uma criança. Mas se tudo em que pensas é no casamento isso é um enorme problema”.

É também a ela que muitos casais recorrem quando se justifica um acordo pré-nupcial, um tema nem sempre consensual mas que aprecia seguir porque, enfim, “é bom lidar com pessoas que se vão casar” (e não apenas, deduzimos, com aquelas cuja relação chegou ao fim). Mas há mais: pactos deste género revelam muito sobre os protagonistas, e as possíveis discussões “expõem as fragilidades” que enfrentarão pelo caminho. “Há pessoas que aparecem e dizem ‘não vou assinar isto. Pensava que éramos uma equipa!’. E então ele diz: ‘mas eu ganho 20 milhões por filme e trabalho há 20 anos para ser uma super estrela. Porque é que haverias de ficar com metade?’ E eu normalmente represento esta pessoa”, descreve Wasser, mostrando como algumas destas situações ditam o fim dos planos de casamento e como a trama da Cinderela continua a vigorar alegremente. “Há mulheres que se sentam à minha frente no escritório e me dizem que não conseguem viver com menos de 150 mil dólares por mês (135 mil euros). Se me faz revirar o olhos? Às vezes sim, mas se tiverem direito a isso, é a lei”.

Por outro lado, há padrões que desde logo merecem a sua recusa: quando falamos de pedidos totalmente irrealistas e que só farão todas as partes perder tempo. “Não represento uma pessoa que me diga que não quer que a outra parte veja os filhos ou que me diga que não pagará pensão de alimentos”, esclarece, recomendando que contratem alguém que patrocine uma visão idílica. Não será por acaso que em agosto de 2018 Angelina Jolie deixou de contar com Laura apostando em outra especialista, talvez devido ao endurecimento da sua estratégia.

Foi em outubro de 2013, em West Hollywood, que Laura lançou o livro “It doesn’t have to be that way”, um conjunto de lições para suavizar o impacto dos duelos nesta hora difícil © Imeh Akpanudosen/Getty Images

De K-Fed a Kardashian: como garantir metade de uma fortuna “a comer bombons”

Foi num voo entre Irlanda e Nova Iorque, em 2004, que Britney Spears considerou oportuno declarar-se ao dançarino que a acompanhava há três meses. “Estivemos a falar sobre a vida, sobre ter filhos. De repente eu disse: e se nos casássemos?”, descreveria mais tarde à People. Spears tinha 22 anos, 27 milhões de álbuns vendidos, algo que lhe rendera já uns 30 milhões na conta bancária, e um casamento relâmpago prévio no curriculum (meio ano antes estivera casada 55 horas com um amigo de infância depois de visitar uma capela em Las Vegas). Em 2016, a Bloomberg recordava o episódio e como a probabilidade do enlace Spears-Federline ativou os alarmes: a entourage da cantora tratou de arranjar wedding planner, anel de noivado…e contactar Laura Wasser. “Muitas vezes, sobretudo jovens mulheres, não querem o acordo pré-nupcial. Estão apaixonadas, vivem uma fantasia, acham que nunca se vão divorciar, e a última coisa que querem é um velho de fato a dizer-lhes o que devem fazer legalmente”, define Wasser, que sondou Britney por telefone prevenindo-a das consequências financeiras de um casamento ruinoso.

“A Califórnia, ao contrário da maioria dos estados, trata os bens adquiridos durante o casamento como propriedade comum, o que significa que em caso de divórcio tudo será divido. Aqui podes passar o dia a comer bombons no sofá enquanto o teu marido trabalha e mesmo assim garantes metade da fortuna dele. O mesmo se aplica a royalties de tudo o que produzires. Metade de cada página de um romance, cada canção, cada quadro, pertencerá ao teu marido ou mulher. A não ser que assines o tal acordo pré-nupcial”, explica a advogada.

Conhecida pela capacidade de gerar entendimentos, Wasser voltou a representar Britney durante um ano, quando em 2006 anunciou a sua separação de Kevin. Distanciou-se do processo em setembro de 2007, quando a disputa pela custódia dos filhos se tornou demasiado má e Spears entrou numa espiral descendente. Para a posteridade fica outro divórcio que resultou de uma relação que durou dois meses. Poucos se lembrarão do efémero enlace em 2011 entre Kim Kardashian e Kris Humphries mas para Laura o processo, que seguiu nesse mês de outubro para o Tribunal Superior da Califórnia, deu-lhe experiência em casos de dissolução/anulação de casamentos.

Britney Spears e Kevin Federline antes do tumultuoso divórcio, que levaria Laura a distanciar-se © James Devaney/WireImage

850 dólares à hora e sempre a somar: “Quanto mais discutem, mais dinheiro eu ganho”

Há um conselho que Laura repete aos seus clientes, sobretudo chegada a um patamar em que se pode dar ao luxo de selecionar quem representa: se o nível de litígio atingir proporções estratosféricas, é caso para dizer que quem ganha é a casa: “Quanto mais discutem, mais dinheiro eu ganho”, lembra a quem está do outro lado, ainda que muitos façam orelhas moucas: “Prefiro gastar o dinheiro consigo do que com ela/ele”, contra argumentam não raras vezes, como retratou em tempos ao site Law Crossing, que revela que Wasser se faz pagar qualquer coisa como 850 dólares à hora (767 euros) e que apesar do seu semblante delicado tem a reputação de ser um verdadeiro “bulldog” na barra do tribunal, sempre pronta para uma “batalha dura”. Laura ri-se dos predicados sugeridos e garante que os pares reconhecem a sua simpatia e macieza no discurso, condizentes com a sua “baixa estatura”.

Excluindo os casos da associação onde presta serviços pro bono, os valores podem apoquentar até os clientes que julgávamos mais abonados. Veja-se o caso de Alec Baldwin, que chegou a recorrer ao escritório de Wasser em 2002 para se divorciar de Kim Basinger, dispensando-o poucos meses depois. “Não tenho o dinheiro do Tom Cruise”, justificou então o ator, sobre os pesados honorários. E nem sequer chegou ao mercado dos juízes particulares, um recurso em franco crescimento no estado californiano, a que muitos milionários recorrem (por cerca de 1.000 dólares/hora) para acertarem todos os detalhes o mais afastados possível do olhar do público.

No começo de março de 2016, a advogada tinha 45 casos em mãos, a maioria dos quais divórcios. Muitos deles só seriam despachados depois da cerimónia dos Óscares desse ano: os seus clientes “não gostam de desfilar sozinhos na passadeira vermelha”. Para o resto do mundo, a época alta de divórcios são os meses de janeiro e fevereiro, quando “as festas estão por fim terminadas e as pessoas podem parar de fingir que são felizes”.

‘Kramer contra Kramer’? “Ao menos sejam simpáticos”

Da Vogue à Elle, da Interview à Flair, Wasser é presença regular nas páginas das principais revistas. Nascida e criada em Los Angeles, o estudo das leis já acompanhava a família mesmo antes de dar os primeiros passos no ramo. É-lhe familiar um meio privilegiado e o ambiente de Beverly Hills dos anos 70 e 80, quando vários amigos viram os pais divorciar-se de forma especialmente violenta. “Foi a era Reagan, a era Kramer contra Kramer. Havia muito dinheiro, muitas drogas, e alguns divórcios mesmo feios. Quase que as casas vinham abaixo”, recorda no artigo da Porter a mulher que aos fins de semana e férias de verão troca os saltos altos pela praia em família em Point Dume.

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Laura formou-se em Retórica em Berkeley, frequentou a Loyola Law School e apesar do sentido mais ao menos óbvio, diz que não houve exatamente um momento em que decidiu tornar-se advogada. Recorda as brincadeiras de miúda e como adorava explanar as suas razões numa discussão, e ainda como o seu nome tem uma forte razão de ser. Laura Allison Wasser ou LAW (lei) foi o batismo escolhido porque o pai soube que tinha passado no decisivo exame do Supremo Tribunal da Califórnia no dia em que ela foi concebida. Não estranha que seja uma das associadas da firma Wasser, Cooperman & Mandles, fundada pelo patriarca do clã, Dennis Wasser, em 1976. A filha tinha 26 anos quando em 1995 se juntou ao escritório de advogados — o mesmo que saltou para o estrelato quando Denis assumiu o caso da antiga número um do ténis mundial Billie Jean King, em 1981, quando esta, ainda casada, se viu forçada a admitir que mantinha uma relação com uma mulher. Quanto a Laura, a porta para a alta-roda de Hollywood abriu-se em definitivo quando se encarregou do divórcio de Stevie Wonder, a quem deu uma entrevista para a Interview (onde conta alguns dos pedidos mais estranhos dos clientes, incluindo a luta por um papagaio).

Para trás ficou o colégio interno na Suíça, as muitas viagens pela Europa, e o casamento de 15 meses com um espanhol que a levou a fixar-se durante algum tempo em Madrid, antes de regressar a casa. Não voltou a casar-se depois desse episódio aos 25 anos — prefere “longos namoros” — e não quer que as pessoas pensem que é “anti-amor”: acredita que a maioria dos casais consegue resolver divergências se falarem honestamente e com respeito dos problemas.

“Conheço muitas pessoas com casamentos maravilhosos para a vida”, disse à Bloomberg, mas ao mesmo tempo não esquece outro tipo de situações frequentes: “ainda no outro dia recebi uma chamada de uma mulher casada há 19 anos que tinha acabado de encontrar umas notas no escritório do marido com os seus planos para se divorciar. Ainda lhe perguntei se seria para um livro mas ela disse-me que não, que ele trabalhava na banca”.

Wasser, que partilha uma custódia verbalmente acordada com os pais dos seus dois filhos, foi a responsável pela redecoração dos escritórios da Wasser, Cooperman & Mandles na Century Plaza Towers, um arrranha-céus em Los Angeles onde agora se destacam os ambientes clean em tons crus. Quando chegam clientes à sua sala, sentam-se numa das cadeiras em pele de cor verde com vista para a sua secretária. À mão de semear, uma caixa com lenços. Ao fundo, uma moldura com as palavras mais apropriadas para o desfecho deste filme: “The End”.