O Tribunal de Loures absolveu esta sexta-feira a mulher acusada de, em 2015, matar um homem e deixar o corpo numa mala de viagem num descampado em Loures, alegando não haver prova “segura e suficiente” para condenar a arguida.
A mulher, que se encontrava em liberdade com termo de identidade e residência, estava acusada por quatro crimes: homicídio qualificado, profanação de cadáver (estes em coautoria), burla informática e furto. Esta sexta-feira, na leitura do acórdão, a juíza Ana Clara Baptista começou por falar para os familiares da vítima, José Lavos, sublinhando que poderiam ter “dificuldade em compreender as dinâmicas processuais”, tendo em conta a mágoa e a dor por que estão a passar, mas referindo que as regras processuais “dão a garantia de que todos são tratados pela justiça de igual forma”.
A juíza explicou que a arguida estava absolvida pelo crime de homicídio qualificado uma vez que, de acordo com a matéria de facto apresentada, “não há prova suficiente e segura” de que tenha praticado o crime.
Seria manifestamente impossível praticar o crime por força das queimaduras que tinha na altura, já que a autópsia revelou que a morte tinha sido por estrangulamento”, disse a magistrada, referindo-se às queimaduras sofridas num acidente de trabalho.
Por limitações de investigação, acrescentou, não foi possível estabelecer ligação entre a arguida e outra pessoa que tivesse cometido o homicídio. “Não sabemos quem cometeu o crime”, sublinhou.
Em relação ao crime de profanação de cadáver, Ana Clara Baptista referiu que o tribunal chegou à mesma conclusão, tendo em conta as queimaduras sofridas. Além disso, indicou, o facto de ter sido encontrada uma mala da mesma marca do que aquela que tinha o corpo na casa da arguida “não permite concluir” que tinha participado nesse crime.
Quanto ao crime de furto, relativamente ao cartão multibanco da vítima, a juíza revelou “não haver dúvidas de que a arguida fez levantamentos, confessados pela própria”. Porém, pelos testemunhos em tribunal ficou provado que José Lavos lhe tinha emprestado o cartão e que a arguida o tinha em sua posse porque a vítima a ajudava financeiramente.
Em relação à burla informática, o tribunal considerou que a arguida não podia ser condenada, partindo do pressuposto que a arguida tinha o cartão multibanco e o seu código porque lhe tinha sido dado pela vítima, logo “não estava a enganar o sistema porque estava autorizada pelo titular do mesmo”.
A juíza lembrou o princípio in dubio pro reo, ou seja, na dúvida razoável quanto à culpabilidade do arguido, este tem a presunção de inocência dado que a culpa penal tem de estar plenamente comprovada.
Ana Clara Baptista afirmou não se conseguir dizer “com base nas provas produzidas que a arguida matou ou participou nos factos, só na posse do cartão multibanco”.
Não foi infirmado por ninguém no tribunal, não se pode dizer que está a mentir. Há comportamentos de José Lavos que suportam a sua informação e, melhor do que ninguém, saberá o que fez. Todos temos a nossa consciência e temos de viver com ela, sendo que será o nosso pior juiz”, afirmou a magistrada.
A acusação do Ministério Público (MP) referia que a arguida, atualmente com 63 anos, tinha um companheiro, mas mantinha uma “relação amorosa” com a vítima, a qual teria matado (através de asfixia), com a ajuda de um terceiro, não identificado durante a investigação para ocultar a relação extraconjugal e para ficar com um cartão de multibanco.
Em 18 de fevereiro, o próprio MP pediu a absolvição da mulher alegando “insuficiência de provas”.
A acusação referia que, “em conjugação de esforços e na execução de plano comum, em local e data não concretamente apurados, mas compreendida entre 10 e 28 de agosto de 2015”, a arguida e o cúmplice “desferiram pancadas em diversas partes do corpo” e asfixiaram a vítima até à morte.
De seguida, acrescentava a acusação, a arguida e a pessoa que a auxiliou “colocaram o corpo de José Lavos dentro de uma mala de viagem — mala preta — e abandonaram-na num local descampado na Rua Principal Estrada de Carcavelos, Fontanelas”, na freguesia de Lousa, concelho de Loures, “dentro de um buraco de formações rochosas, colocando-lhe pedras em cima com o intuito de tornar mais difícil a sua descoberta”.
Durante as alegações finais, o procurador do MP declarou que “não foi recolhida prova suficiente” para afirmar que a “arguida materializou o homicídio”.