O primeiro-ministro libanês, Hassan Diab, confirmou que ia resignar ao cargo numa declaração transmitida na televisão, noticiou a Al Jazeera. O Presidente Michel Aoun anunciou, também pela televisão, que aceitava a renuncia do cargo, mas que tinha pedido ao governo que se mantivesse em gestão até à eleição de um novo executivo.

A decisão do primeiro-ministro, anunciada pelas 17h30 (hora de Lisboa), surge uma semana depois da explosão que devastou a capital do país e no meio dos protestos que pediam a demissão do Governo. Antes de pedir a demissão, o governo o desastre no porto de Beirute ao Supremo Tribunal Judicial libanês, que lida com crimes políticos e de segurança do Estado.

“Declaro hoje a renúncia deste governo”, disse o primeiro-ministro. “Que Deus proteja o Líbano”, repetiu três vezes. Este “passo atrás”, diz o governante, é para se juntar ao povo “e poder travar a luta pela mudança ao lado destes”.

Para Diab, o que agora se assiste é o resultado da “corrupção endémica” no país — uma corrupção maior do que o próprio país. Mas o governante entende que é uma situação que o precede, visto só estar no cargo desde janeiro deste ano. No entanto, a sua eleição contou com o apoio do grupo Hezbollah e aliados, precisamente as fações que os libaneses queriam ver fora das reformas que o governo estava incumbido de fazer, refere o Financial Express.

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“[A classe política] deveria ter vergonha de si mesma, porque sua corrupção foi o que levou a este desastre que estava escondido há sete anos”, diz o governante, citado pela France 24, referindo-se às mais de duas mil toneladas de nitrato de amónia acumuladas sem condições de segurança.

O maior problema no Líbano, é o próprio sistema eleitoral, refere um repórter da Al Jazeera em Beirute, Bernard Smith, que “está feito para proteger a elite política no país” — a mesma que é acusada de corrupção.

“Para mudar o sistema, é preciso que a elite política concorde”, diz o jornalista. “Mas mesmo uma explosão catastrófica como a de terça-feira pode não ser o suficiente para fazer com que estas elites abram mão do poder. É por isso que as pessoas acreditam que é preciso pressão internacional.”

As demissões começaram no fim de semana

“Todo o Governo apresenta a sua demissão”, já havia anunciado esta segunda-feira o ministro da Saúde do Líbano, Hamad Ali Hassan, num encontro com a imprensa local no final de uma reunião com o Governo, citado pela Associated Press. O ministro também tinha adiantado que o primeiro-ministro Hassan Diab se iria dirigir ao Palácio Presidencial para “entregar a resignação, em nome de todos os ministros”.

Enquanto aguarda a formação de um novo governo, o executivo de Hassan Diab será responsável por despachar assuntos correntes, escreve o L’Orient-Le Jour, confirmando que o primeiro-ministro visitaria o Palácio Baabda para apresentar formalmente a renúncia do seu gabinete ao Presidente Michel Aoun. Esperava-se que o Presidente aceitasse a renúncia, tal como veio a acontecer.

A demissão em peso surge na sequência de uma série de protestos que se seguiram à violenta explosão que abalou a capital do país em 4 de agosto e que pressionaram a saída dos responsáveis. O primeiro-ministro tinha dito no domingo que iria pedir eleições antecipadas, mas isso não foi o suficiente para acalmar os protestos.

Nas ruas, os manifestantes continuam sem dar tréguas, esta segunda-feira. No domingo, no segundo dia de protestos, a polícia lançou gás lacrimogénio para tentar dispersar os manifestantes que tinham bloqueado uma estrada junto ao Parlamento, em Beirute, e atiravam pedras.

LEBANON-PROTEST-BLAST

@Getty Images

O governo libanês, liderado por Hassan Diab, reuniu esta segunda-feira à tarde em Beirute, mas havia já indicações oficiosas de que o executivo poderia cair, na sequência das acusações de corrupção que levaram a uma crise económica sem precedentes, à má gestão da pandemia de Covid-19 e às explosões que mataram cerca de 160 pessoas e feriram cerca de 6.000.

Segundo a Constituição libanesa, a demissão de sete ministros implica a queda do governo. Esta segunda-feira de manhã, a ministra da Justiça libanesa, Marie-Claude Najm, apresentou a demissão do Governo. Seguida do ministro das Finanças libanês, Ghazi Wazni.

No domingo, dois ministros tinham apresentado igualmente a demissão do executivo libanês, com base nas mesmas premissas: de manhã, a ministra, da Informação, Manal Abdel Samad, e, à tarde, o do Ambiente e do Desenvolvimento Administrativo, Damiamos Kattar.

Manal Abdel Samad, num breve discurso transmitido pela televisão local, pediu desculpas aos libaneses pelo “enorme desastre” em Beirute.

“Peço desculpas aos libaneses, não correspondemos às vossas expectativas”, afirmou, justificando a decisão com a falha do governo em fazer as reformas necessárias e com as explosões que abalaram a capital do Líbano. “Face à enorme catástrofe […] e […] a um regime estéril que desperdiçou numerosas oportunidades, […] decidi apresentar a demissão do governo”, indicou, por seu lado, Damiamos Kattar.

Neste momento de dor que une todos os libaneses, vejo uma esperança na capacidade dos jovens em progredir para um novo Líbano que responda às suas aspirações e aos seus sonhos”, acrescentou o agora ex-ministro.

Além dos três ministros, pelo menos nove deputados do Parlamento libanês também haviam apresentado a demissão.

Apoio financeiro só se houver reformas

O ministro das Finanças Ghazi Wazni, que se demitiu esta segunda-feira, era o principal negociador com o FMI (Fundo Monetário Internacional) sobre o plano de resgate que ajudasse o Líbano a sair da crise financeira em que se encontrava. Kristalina Georgieva, diretora-geral do FMI, disse este domingo que o fundo está disposto a ajudar o Líbano e até a “duplicar os esforços”, mas para isso pede a união de todas as instituições para “levarem a cabo as tão necessárias reformas”.

“O compromisso com estas reformas irá desbloquear milhares de milhões de dólares em benefício do povo libanês. Este é o momento de os legisladores do país agirem de forma decisiva. Nós estamos prontos para ajudar”, afirma Kristalina Georgieva.