O grupo parlamentar socialista vai pedir ao Tribunal de Contas que faça uma auditoria ao Novo Banco o quanto antes. Os deputados do PS vão formalizar esse pedido esta sexta-feira e esperam que o Parlamento aprove este requerimento na comissão de Orçamento e Finanças.

Mas ainda que o pedido de auditoria chegue rapidamente ao Tribunal, a história recente mostra que os juízes podem demorar mais de um ano a entregar o relatório. O limite legal é um ano, mas o prazo pode ser prorrogado até 18 meses. Isto significa que a auditoria, que começou por ser exigida pelo Bloco de Esquerda, dificilmente estará concluída a tempo de validar um novo pedido de injeção de capital, que em regra acontece em maio.

Depois de o PSD ter desafiado os outros partidos a requererem a auditoria antes de janeiro do próximo ano — o Parlamento só pode pedir duas por ano –, os socialistas decidiram antecipar-se e apresentar, junto da Comissão de Orçamento e Finanças, um pedido de auditoria suplementar ao abrigo da Lei de Enquadramento Orçamental.

Ao Observador, o deputado socialista Fernando Anastácio confirma a intenção e assume que, perante as reservas levantadas pelo PSD (e pelo Bloco de Esquerda), o PS decidiu acelerar o calendário. “Percebemos e compreendemos que há um conjunto de partidos que põe reservas em relação àquela auditoria em concreto [a da Delloite]. Portanto, não há razão nenhuma para esperar pelo próximo ano”, nota.

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O Novo Banco continua a ser um dos dossiês quentes do Orçamento do Estado para 2021, onde parece existir um impasse inultrapassável entre socialistas e bloquistas, que exigiram sempre uma auditoria pública ao Novo Banco. Mais a mais, o PSD sempre fez depender qualquer nova injeção de capital de uma inspeção às contas da instituição liderada por António Ramalho.

Tudo somado, coloca-se uma questão: a ser aprovada, a auditoria estará pronta antes de maio, altura em que as injeções de capital têm de estar fechadas? Fernando Anastácio não se compromete com prazos e reconhece que o Parlamento não tem instrumentos para impor qualquer prazo ao Tribunal de Contas.

Tribunal de Contas tem até um ano, mas pode pedir mais seis meses

Ao contrário do Governo, que não tem essa prerrogativa, o parlamento pode pedir duas auditorias por ano ao Tribunal de Contas, tendo ainda a possibilidade de solicitar auditorias suplementares, de acordo com uma resposta dada ao Observador pela secretaria-geral da Assembleia da República.

Já fonte oficial do Tribunal de Contas esclarece que a instituição tem um ano para apresentar os resultados, mas esse prazo pode ser prorrogável até 18 meses por motivos devidamente justificados.

Quando o auditor começa o seu trabalho pode sempre deparar-se com situações imprevistas que justifiquem prolongar o prazo que o próprio Tribunal tinha entendido como horizonte temporal para a realização da auditoria. Além disso é sempre preciso contar com o tempo do contraditório para as entidades públicas visadas.

O tempo da auditoria depende muito da complexidade dos temas. No caso do Novo Banco, o Tribunal deverá fixar-se na execução do acordo com a Lone Star que assegurou uma almofada de capital de até 3,89 mil milhões de euros — das quais falta gastar cerca de 900 milhões de euros. Para tal, terá de escrutinar a gestão e a venda de ativos (imóveis, créditos e participações financeiras como a GNB Vida) que provocaram perdas que, por sua vez, geraram pedidos de capital financiados com dinheiro público. Essa avaliação irá incluir um período de 2017 a 2019 (possivelmente 2020) e abranger a identidade dos compradores destes ativos, para verificar se o contrato está a ser cumprido no que toca à interdição de venda a partes relacionadas com a Lone Star.

De acordo com a consulta efetuada pelo Observador para os últimos cinco anos, na maioria dos pedidos as auditorias demoraram um ano ou mais a concluir e a divulgar. Foi o que aconteceu, por exemplo, nos pedidos de auditoria à privatização da TAP, feito em 2016 e divulgada em julho de 2018, ou a auditoria de acompanhamento do modelo de financiamento da ADSE (sistema de saúde do Estado), requerido em janeiro de 2018 e divulgado em outubro do ano passado.

Pandemia atrasou auditoria à privatização da ANA

Há até casos de pedidos feitos e que não se materializaram ainda em auditorias publicadas, como a que foi solicitada em outubro de 2018 sobre a privatização da ANA e a concessão dos aeroportos nacionais, decidida pelo Governo PSD/CDS, no final de 2012. Em relação a este pedido, o Tribunal de Contas esclarece que os trabalhos da auditoria ficaram atrasados por causa dos efeitos da pandemia. E acrescenta que enviou em Janeiro deste ano uma auditoria ao financiamento da atividade reguladora da aviação civil (desempenhada pela ANAC) que será uma primeira parte do pedido efetado pelo parlamento.

Mas há também tempos de resposta mais rápidos, como os casos das concessões de transportes públicos no Porto e ao Instituto de Ação Social das Forças Armadas, que demoraram cerca de um ano. Da pesquisa feita pelo Observador, a auditoria pedida pelo Parlamento que menos demorou neste período foi a que visou o Fundo Revita e os mecanismos de financiamento à reconstrução das estruturas destruídas pelos incêndios de 2017. Neste caso, o pedido seguiu em outubro de 2018 e teve resposta pública em julho de 2019, cerca de oito meses depois.

Ainda que este seja o tempo de referência para concluir a futura auditoria ao Novo Banco, seria muito difícil que o relatório estivesse concluído a tempo de autorizar as chamadas de capital da instituição, cujo calendário está fixado nos contratos de venda. A auditoria da Deloitte que abrange 18 anos de gestão do BES/Novo Banco demorou dez meses a ser elaborada e a sua entrega foi duas vezes adiada, pelo que a injeção financeira correspondente ao ano de 2020 foi autorizada sem conhecer o resultado.

Depois de reconhecidas as necessidades de capital geradas pelas perdas do ano anterior, o que acontece quando são divulgados os resultados anuais (fevereiro ou março), este valor tem de ser validado em assembleia geral e é depois submetido a verificações de várias entidades. Uma vez concluído este processo, o Fundo de Resolução tem um mês para realizar a operação. Em regra, a injeção tem sido realizada em maio, mas na verdade é desde o momento em que as contas do ano (neste caso de 2020) ficam fechadas que o Novo Banco tem autorização para contabilizar o reforço de capital no seu balanço, mesmo que depois o dinheiro demore alguns meses a chegar.

Atualizado com respostas do Tribunal de Contas.