22 de setembro de 1996. Jacques Villeneuve venceu no Estoril, à frente de Damon Hill, o colega de equipa na Williams-Renault, e de Michael Schumacher, que encerrou o pódio. O português Pedro Lamy, ao serviço da Minardi-Ford, terminou a corrida em 16.º, o último de todos os que acabaram a etapa na sequência de quatro abandonos (Häkkinen, Verstappen, Pedro Diniz e Barrichello). A vitória de Villeneuve, na penúltima corrida do ano, assegurou que a luta pelo título entre o canadiano e Hill iria até à última semana do Mundial, no domingo seguinte, no Japão. Foi a última vez que um Grande Prémio de Fórmula 1 teve lugar em Portugal.

Até este domingo. 24 anos depois da vitória de Villeneuve no Estoril, o Autódromo Internacional do Algarve recebia a 12.ª etapa de um Campeonato do Mundo que teve de ser repensado e reconvertido e que encontrou asilo, entre outros sítios, em Portimão. Com cerca de 27.500 pessoas nas bancadas, o Autódromo albergava adeptos nacionais e internacionais e tornava-se a nova casa da Fórmula 1 em Portugal — um circuito diferente, diferenciado, desafiante e distinto de todos os outros. “A pista foi toda reasfaltada. É uma pista divertida e estes são os carros mais rápidos de sempre na F1. Estou muito curioso para os ver correr (…) A Fórmula 1 está muito feliz, estão muito felizes por virem a Portugal. Estão muito contentes com a reação das pessoas no mundo inteiro, a nossa corrida é a mais ambicionada de todo o Mundial, antecipam que vamos ser a corrida mais vista na televisão este ano. São tudo coisas a nosso favor. Gostam muito do circuito, dizem que a região é muito bonita, dizem que os portugueses são fantásticos, que são muito simpáticos”, explicou Paulo Pereira, o administrador do Autódromo, à Rádio Observador.

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Fórmula 1 em Portimão. “Os pilotos vão adorar”

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Depois de uma qualificação dura e inesperada, com Lewis Hamilton a agarrar a pole-position no último esforço depois de Valtteri Bottas ter dominado praticamente todas as sessões de treinos, as previsões meteorológicas apontavam para a possibilidade de chuva durante a corrida — para além do vento que já se fazia sentir no Algarve desde as primeiras horas da manhã. E o piloto inglês antecipou precisamente essa hipótese, já depois de ter dito que este circuito português é “um dos mais desafiantes” onde já competiu.

“Penso que vai ser uma corrida muito complicada, particularmente quando se tem o pneu mais duro. Na realidade, não funciona durante várias voltas. Vai ser interessante no início. Obviamente, perdemos um pouco de desempenho para quem vem atrás com pneus macios, especialmente o Max [Verstappen]. Realmente, não sabemos o que esperar. É também suposto chover. Isso significa que vai ser o dia mais difícil para todos, se chover na corrida. Com vento e pista húmida, isso seria gelo, se tivermos isso. Apenas penso que temos de nos preparar para todos os cenários. Se estiver seco, o reinício será realmente difícil com os pneus, com a velocidade a que o safety car vai. Sim, vai ser uma corrida difícil, isso é certo, uma vez que nunca estivemos aqui”, explicou o piloto da Mercedes, que este domingo podia chegar às 92 vitórias na Fórmula 1 e tornar-se o mais vitorioso de sempre na modalidade, superando o recorde anterior de Schumacher.

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As primeiras voltas do Grande Prémio de Portugal mostraram desde logo o potencial do circuito algarvio. Hamilton saiu bem e agarrou a liderança na primeira curva, Bottas e Sainz também conseguiram um bom arranque e Verstappen e Pérez envolveram-se num incidente que deixou a corrida do mexicano da Racing Point desde logo muito complicada. Escassos segundos depois, Bottas apertou com Hamilton e conseguiu roubar a primeira posição ao colega de equipa, que caiu mesmo para terceiro graças aos esforços de Carlos Sainz. O espanhol da McLaren surpreendeu e à segunda volta ultrapassou o segundo Mercedes, colocando-se na dianteira da corrida.

O momento de glória de Sainz, porém, durou poucas voltas. O espanhol só resguardou a liderança durante alguns minutos, sendo novamente ultrapassado tanto por Bottas como por Hamilton e depois por Verstappen e Gasly. Lá à frente, o finlandês foi o líder do Grande Prémio de Portugal até à volta 20, altura em que Hamilton atacou e recuperou a pole-position perdida logo nos metros iniciais. Mais atrás, Lance Stroll procurou superar Lando Norris mas acabou por bater no McLaren, não evitando um pião que o atirou para a cauda do pelotão.

Pelo meio, a surpresa ia sendo Charles Leclerc. O monegasco, que logo na qualificação esteve acima daquilo que a Ferrari tem feito esta época, ao arrancar de quarto, não perdeu espaço entre os pilotos da frente e à volta 27 era já terceiro, aproveitando a primeira ida às boxes de Verstappen. Nesta altura, era protagonista a extraordinária recuperação de Sergio Pérez: depois do incidente logo na primeira volta, que o obrigou a uma embrionária pitstop, o mexicano da Racing Point chegava à 20.ª volta numa incrível sexta posição a pouco mais de um segundo do Renault de Esteban Ocon. A luta pelo quinto lugar mostrou-se uma das mais entusiasmantes da corrida, com os dois pilotos a competirem lado a lado pela posição, numa enorme demonstração de qualidade que acabou por cair para o lado do mexicano.

Os dois Mercedes pararam à passagem da volta 40, ambos para trocar pneus médios por duros, e Hamilton continuou na frente com uma vantagem confortável. O inglês completou a volta mais rápida pouco depois, logo após trocar de pneus, e o finlandês perdeu algum tempo para Verstappen, ainda que nunca o suficiente para o holandês poder sonhar sequer com o segundo lugar. Mais trás, Leclerc não teve sequer hipótese de voltar a lutar pelo pódio, Lance Stroll acabou por desistir e a disputa mais interessante da reta final da corrida foi mesmo a batalha pelos pontos, com Raikkonen e Vettel — dois históricos da Fórmula 1 — a competirem pelo 10.º lugar.

No fim, Lewis Hamilton ganhou sem grandes imprevistos, Valtteri Bottas foi segundo e Max Verstappen encerrou o pódio. Charles Leclerc alcançou um positivo quarto lugar para a Ferrari, enquanto que Sergio Pérez terminou a impressionante escalada pela classificação na sétima posição, atrás de Gasly e Sainz e à frente de Ocon e Ricciardo. No último lugar com acesso a pontos, Vettel foi mais forte do que Raikonnen e terminou em décimo. Hamilton alcançou a 92.ª vitória da carreira, ultrapassou oficialmente o recorde que pertencia a Michael Schumacher e é agora o piloto mais vitorioso de sempre na Fórmula 1: ganhou, fez história e colocou Portugal na história. 24 anos depois, Portugal voltou à ribalta do automobilismo pela porta maior.