Podem ser necessários “pequenos aumentos nas taxas de juro” para assegurar que a economia norte-americana “não sobreaquece” fruto dos vários programas de estímulo económico aprovados pela Administração Biden – quem o disse foi Janet Yellen, chefe do Tesouro norte-americano. Foi esta pequena frase, poucos minutos depois “clarificada”, que lançou uma rápida correção negativa nas bolsas norte-americanas, sobretudo nas empresas tecnológicas, que estão entre as que mais têm beneficiado da política monetária seguida nos últimos anos e, do mesmo modo, são as mais vulneráveis a uma inversão da política quando ela existir. Só Apple, Microsoft, Google e Amazon viram esfumar-se 170 mil milhões de dólares em capitalização de mercado.

O índice Nasdaq, que reúne as principais empresas tecnológicas norte-americanas, chegou a cair cerca de 3% antes de recuperar, parcialmente, quando Janet Yellen voltou a público, minutos depois, para garantir que não antecipa que venha a haver “um problema de inflação” – e, se houver esse risco, existe a garantia de que a Reserva Federal dos EUA (o banco central norte-americano) tem ferramentas para o contrariar.

Num mercado financeiro significativamente impulsionado pela política monetária que tem vindo a ser seguida, com compras de ativos financeiros e taxas de juro em mínimos, há várias semanas esta questão está no centro de todas as atenções – com vários preços de matérias-primas (como a madeira, o milho e o minério de ferro) a atingirem máximos de vários anos e a indicarem que, mais tarde ou mais cedo, os preços poderão subir e há um risco de aumento indesejável da inflação.

Janet Yellen sublinhou que não estava a falar de algo iminente e acrescentou: “se alguém conhece a importância da independência da Reserva Federal, essa pessoa sou eu”. Janet Yellen foi até ao início de 2018 presidente da Reserva Federal, tendo sido substituída pelo atual presidente, Jerome Powell. Quando Joe Biden tomou posse como Presidente dos EUA, escolheu Yellen para liderar o Departamento do Tesouro dos EUA – Yellen que tinha sido duramente criticada por Donald Trump durante quase todo o tempo em que coincidiram os mandatos dos dois.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Powell, por seu turno, tem-se desdobrado em garantias de que ainda “estamos muito longe” do momento em que fará sentido avançar com o desmame das políticas extraordinárias de estímulo que foram intensificadas como resposta à crise económica provocada pela pandemia – um vírus que surgiu numa altura em que os estímulos monetários anteriores, lançados para combater a anterior crise financeira, ainda não tinham sido totalmente retirados. Mas vários dos membros da Reserva Federal, como Robert Kaplan, têm alertado que chegou a hora de reduzir os estímulos.

Para já, as garantias de Jerome Powell têm sido suficientes para manter as taxas de juro controladas nos mercados, apesar de alguma turbulência entre fevereiro e março. A “clarificação” feita por Janet Yellen surtiu efeito, devolvendo os juros a 10 anos novamente à região dos 1,6% – ainda assim, muito acima dos 1,1% a que os mesmos títulos eram negociados no início do ano.

Taxa de juro dos “Treasuries” a 10 anos. Fonte: MarketWatch

Também as bolsas norte-americanas parecem estar a recuperar, nesta manhã de quarta-feira, a recuperar mais algum do terreno perdido, mas os próximos dias irão ditar se os comentários de Janet Yellen acabam por ser interpretados, mais a frio, como um lapso ou um primeiro alerta aos investidores para que não assumam demasiados riscos e alavanquem demasiado os seus investimentos em dívida.

Para as bolsas, porém, o comentário, feito num webinar promovido pelo The Wall Street Journal, fez estragos. No pior momento da turbulência, durante a sessão de terça-feira, quatro das maiores ações da bolsa norte-americana – Apple, Alphabet (Google), Amazon e Microsoft – perderam 170 mil milhões de dólares em capitalização de mercado (cerca de 140 mil milhões de euros). Apesar disso, o índice Nasdaq continua mais de 5% acima do nível a que negociava no início do ano.