O facto de o Euro 2020 contar com público em todos os jogos, em todas as cidades, em todos os estádios, proporcionou momentos quase inesquecíveis ao longo de todo o espectro que vai do mau ao bom. Vamos lembrar-nos para sempre do silêncio aterrador de Copenhaga quando Eriksen colapsou, assim como vamos lembrar-nos para sempre de Luca, o adepto suíço que viveu com emoção a passagem nas grandes penalidades contra França. Vamos lembrar-nos para sempre dos cânticos homofóbicos dirigidos a Cristiano Ronaldo durante o jogo contra a Hungria, assim como vamos lembrar-nos para sempre da emoção dos mesmos húngaros ao longo do Portugal-França e enquanto a Alemanha perdia em Munique.

O que aconteceu em Wembley, na passada semana e durante o jogo dos oitavos de final entre Inglaterra e Alemanha, caiu para o lado péssimo do espectro. Já no período de descontos, quando Thomas Muller foi substituído por Jamal Musiala, a realização do jogo — não só para as emissões televisivas mas também para a transmissão que passava nos ecrãs gigantes do estádio — focou uma jovem adepta alemã que não conseguia conter as lágrimas, agarrada ao pai. Afinal, os ingleses estavam a vencer, com golos de Sterling e Harry Kane, e os alemães estavam à beira de ser eliminados do Euro 2020. Quando a imagem da criança alemã apareceu nos ecrãs de Wembley, os adeptos ingleses riram e assobiaram, já depois de terem vaiado o hino nacional da Alemanha antes do apito inicial.

Passou das lágrimas à versão Hulk em 90 segundos, tornou-se o adepto do Euro e já tem viagem paga para ir ver a Suíça

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A atitude foi interpretada como “vergonhosa” e “de partir o coração” pela opinião pública e pela esmagadora maioria da comunicação social e um adepto inglês, já depois de a imagem da jovem alemã se ter tornado absolutamente viral e ter também sido alvo de abuso online, tentou compensar a situação. Joel Hughes, de Newport, lançou uma angariação de fundos para juntar dinheiro para ajudar na educação da criança e para, no fundo e como confirmou em todas as entrevistas que deu, provar que “nem toda a gente no Reino Unido é horrível”.

De lá para cá, ao longo de cerca de uma semana, a iniciativa conseguiu angariar 36 mil libras, algo como 42 mil euros. A quantia, porém, não vai para a jovem alemã: a família, que entretanto já foi encontrada, já garantiu na página da angariação de fundos que o valor reunido será entregue à UNICEF, a organização das Nações Unidas que é responsável por garantir ajuda humanitária e de desenvolvimento às crianças do mundo inteiro.

“Para preservar o bem-estar da nossa filha e da nossa família gostaríamos de permanecer anónimos. Contudo, queremos agradecer a toda a gente pelo apoio fantástico. A nossa filha gostaria de pedir que todas as generosas doações sejam encaminhadas para a UNICEF, tendo assim a certeza de que a vossa boa vontade irá fazer a diferença”, podia ler-se na mensagem da família alemã. Já Joel Hughes, que começou a campanha para responder ao “abuso vil que foi feito às imagens da pequena criança”, mostrou-se “mais do que grato” pela resposta massiva à angariação de fundos, cujo objetivo inicial não passava das 500 libras.