Enviado especial do Observador, em Tóquio

Quinze medalhas em Campeonatos da Europa, por sinal uma por cada participação na prova, das quais seis de ouro (e a última em abril, na Altice Arena). Cinco medalhas em Campeonatos do Mundo, entre quatro pratas e um bronze. Uma medalha nos Jogos Olímpicos, conquistada na última edição do Rio de Janeiro. Se juntarmos a isso o décimo lugar no ranking mundial de -57kg e toda a experiência internacional de uma longa carreira, era natural que Telma Monteiro fosse apontada às medalhas. Ou melhor, era natural que Telma Monteiro fosse apontada aos quartos, onde poderia encontrar a número 1 do mundo. Não conseguiu. E até o diploma falhou.

Depois de ter começado o dia com uma vitória tranquila frente à costa-marfinense Zouleiha Abzetta Dabonne, Telma Monteiro cruzou com a 14.ª do ranking mundial, a polaca Julia Kowalczyk. Começou com a adversária a ser punida com um castigo, não conseguiu resolver as coisas antes dos quatro minutos iniciais, perdeu depois de dez minutos de combate por acumulação de castigos, os dois últimos quase consecutivos. Logo de seguida perdeu com a canadiana Jessica Klimkait mas, para a portuguesa de 35 anos, o sonho de se tornar a primeira judoca nacional a alcançar duas medalhas olímpicas (e logo consecutivas) já tinha caído por terra.

A reação depois da derrota foi diferente daquela que teve por exemplo em Londres, quando foi afastada também no golden point pela norte-americana Marti Malloy (que viria a conseguir a medalha de bronze nesse ano de 2012) logo na primeira ronda, mas sobrou a tristeza e a desilusão de não ter pelo menos chegado a esse duelo com a canadiana que lidera a categoria de -57kg. Se foi ou não a última participação nos Jogos, nem a própria decidiu. Mas há uma certeza para o futuro, tão certa como a necessidade que sente nesta fase de descansar: só estará em Paris-2024 ou em qualquer outra grande competição se sentir que tem condições para ganhar.

“O mais importante é descansar. Não sei o que vai ser o futuro mas se quiser ir a Paris, vou. Disso tenho a certeza. Tomar alguma decisão agora seria errado mas já estou no judo ao mais alto nível há muito tempo e muito bem. Para Paris, será um apuramento olímpico muito exigente e não consigo pensar em chegar a um nível mais ou menos. O nível de exigência que tenho é que decide. Não quero ser uma atleta de alta competição mais ou menos, quero pensar que posso ganhar sempre. Tenho de estar disponível para treinar a um nível que me permita pensar que eu posso ganhar sempre”, comentou aos jornalistas portugueses presentes na zona mista após o combate, recordando também as muitas e arreliadoras lesões que foi tendo nos últimos cinco anos e que fizeram com que, logo depois do Rio de Janeiro, tivesse de ser sujeita a uma intervenção cirúrgica: “Foram dois anos a correr atrás das lesões e agora preciso mesmo de descansar, física e psicologicamente”.

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Antes, na zona das televisões, Telma Monteiro tinha admitido à RTP a frustração por não ter conseguido melhor no segundo combate do dia. “Estou triste, obviamente. O combate fisicamente foi muito exigente, fiz tudo o que estava ao meu alcance para conseguir ganhar, foi ao golden score, com seis minutos. Saí com a sensação de que dei tudo o que tinha para dar mas obviamente que estou triste, porque sempre que entro no tapete…”, referiu, antes de uma paragem para recuperar o fôlego e evitar as lágrimas que já tinham ameaçado no tatami.

“Não gosto de pensar naquilo que não posso controlar. No que podia controlar, dei tudo o que tinha. Para mim é sempre um orgulho representar Portugal e esta é a única maneira que sei lutar: dar tudo a acreditar que posso sempre estar no pódio. Quando entrei no tapete, desde que estou a treinar, não é dar tudo hoje, é dar tudo todos os dias. A minha mentalidade é sempre essa, infelizmente nem sempre é possível. O meu sonho e objetivo aqui era repetir o feito no Rio, estar novamente no pódio olímpico. Sabia da dificuldade que teria mas enfrentei a competição com coragem, pois esta é única maneira de pisar o tapete, representar o país, a dar tudo, levantar a cabeça a acreditar que podemos chegar lá. Quero agradecer a todas as pessoas que acreditam em mim, não só hoje mas sempre. Isso, apesar de estar muito triste, dá-me algum conforto”, salientou.

“Paris em 2024? Em primeiro lugar, sei que os portugueses não me exigem mais. Muito pelo contrário, eles apoiam. Sou eu quem exige a mim mesma dar sempre mais. Não é pela exigência dos portugueses porque dos portugueses não sinto isso. Sinto expectativa, sinto acreditar e sinto que querem que ganhe. E eu quero ganhar também, quero retribuir. Não sei qual é o meu futuro, vou de férias e descansar, mas quando me voltarem a ver no tapete, se acontecer, podem exigir que ganhe, porque é isso que quero de mim. É assim que sei representar Portugal e é sempre um orgulho representar Portugal. Sinto que dei tudo o que tinha. Não foi possível mas espero que fiquem orgulhosos da forma como represento sempre Portugal. Às vezes não é só ganhar, mas a forma como o fazemos, como lutamos. Hoje foi mais como eu lutei”, concluiu a judoca do Benfica.