Enviado especial do Observador, em Tóquio

– Qual é a sensação de ficar tão próximo da final?
– É difícil…

Portugal tinha apresentado recurso pela passagem numa porta do australiano Lucien Delfour, que tinha acabado a qualificação para a final de canoagem slalom na sexta posição. Antoine Launay ficou perto dos jornalistas na zona mista mas referiu que não faria grande sentido estar a falar sem saber se iria fazer a final ou se terminara essa qualificação no 11.º lugar. E houve uma imagem que deu ainda mais esperança, enviada ao presidente da Federação de Canoagem, Vítor Félix, onde dava ideia de que Delfour não tinha mesmo respeitado com a cabeça essa passagem pela porta. A opinião dos juízes que avaliaram no VAR foi outra, entenderam que mesmo no limite foi uma viragem legal e o atleta nacional acabou mesmo na 11.ª posição, a uma de chegar à corrida decisiva.

Depois, aguentou apenas três palavras. As lágrimas começaram a correr-lhe, baixou a cabeça com as mãos na cara, precisou do seu tempo para se recompor. Por alguns momentos houve mesmo aquela esperança de poder ter chegado à final. Só a seguir lhe caiu a ficha. Não aguentou. Era um sonho que acabara de ruir num instante.

“É muito difícil. Fui muito profissional, muito profissional… Eu gosto deste desporto mas é difícil. Foi por muito pouco que não entrei no jogo da final, muito pouco. Lá, o meu objetivo era lutar pelo pódio. Sinceramente, fiz tudo para isso. Sim, eu sei, faltou um pouco de velocidade, faltou 0,5, só um pouco para estar na final. Eu faço tudo, tudo, tudo, estava preparado, foi tudo perfeito. Sem a minha equipa toda aqui pode ser mais difícil mas o meu treinador e a equipa fazem tudo à distância. Estava preparado… Foi muito difícil, não poder jogar a final”, começou por dizer na zona mista, voltando a deixar cair algumas lágrimas por estar tão perto da decisão já depois de ter sido consolado por Vítor Félix e Pere Guerrero, técnico espanhol que deu a notícia do recurso.

Tendo ficado com o quinto melhor tempo quando fez a sua prova, sendo o nono a sair das meias-finais, Antoine Launay foi esperando para perceber se conseguiria ou não ficar entre os dez primeiros. Jiri Prskavec, número 1 do mundo, conseguiu o melhor registo (94,29), seguido do francês Boris Franeveu. Com o registo do germânico Hannes Aigner (97,97), terceiro do mundo e último a entrar, o luso-francês desceu para 11.º, ainda assim à frente de outros pesos pesados como o esloveno Peter Kauzer, ex-campeão mundial e vice-campeão olímpico, o suíço Martin Dougou ou o italiano Giovanni de Gennaro, todos com ranking mundial acima de Launay. Contas feitas, o luso-francês ficou apenas a 43 centésimos do sueco Erik Holmer, o último a apurar-se para a final.

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Aliás, e para se perceber a qualidade e intensidade com que foi disputada esta meia-final, o transalpino não aguentou a frustração e esteve largos minutos sentados na zona após o epílogo do percurso, deitando-se depois ao ponto de os próprios voluntários pensarem que se estava a sentir mal e tirarem-lhe a temperatura. Enquanto isso acontecia, Peter Kauzer perguntava a Launay se tinha ficado mesmo em 11.º, dizendo que se não fosse à final merecia os parabéns e desejando boa sorte caso conseguisse o apuramento que acabou por não surgir.

“Não foi a minha melhor prova porque havia um pouco de pressão, um pouco de stress. Fiz pequenos erros… Claro que posso melhorar mas tinha de estar na final. É difícil. Protesto? Sim, vi as imagens mas no final são os judges [uma das poucas palavras que não estava a conseguir dizer nem em português nem em espanhol) que têm de decidir. Eu daria o castigo de 50 mas agora está tudo terminado, decidiu e eu aceito. É assim”, continuou, sem dizer se estará ou não presente nos Jogos de Paris, país onde nasceu. “Vamos ver… São três anos, menos do que foi agora e costuma ser. Claro que queria estar na melhor forma, ainda melhor do que em Tóquio mas temos de ver com a equipa. Adaptámos muita coisa pela Covid-19. Estava tudo preparado para poder conseguir chegar à final mas fiquei em 11.º…”, frisou, sem disposição mental para falar sobre o que se seguirá na carreira.

– E desculpa…”, atirou, antes de cumprimentar todos os jornalistas e deixar a zona mista, após 15 minutos.

Apesar de ter feito mais uma vez um percurso sem penalizações e de ter conseguido um registo melhor do que tinha feito na qualificação, Antoine Launay não conseguiu essa meta que considerou estar ao alcance de ter feito lugar de final no Kasai Canoe Slalom Centre, colocado num Kasai Rinkai Park que costuma receber famílias não só pelos parques de diversões e a roda gigante mas também para almoços de barbecue que são realizados ao longo das várias áreas montadas para juntar algumas pessoas. E foi isso que fizemos durante largas, largas, largas centenas de metros (não foi uma maratona mas as pernas sentiram como tal), chegando à zona da prova prontos para um concurso da camisa molhada que pior ficou nas mesas para a imprensa onde se viam todos os atletas, um a um, a descerem a pista de slalom com o sol a bater e a fazer com que se visse melhor na TV.

“É muito duro… O Antoine esteve muito bem, desceu sem penalizações, melhorou muito na qualificação entre a primeira e a segunda, voltou a melhorar na meia-final, ficou às portas da final muito melhor do que a Itália, a Eslovénia ou a Suíça, países que estão muito à frente no ranking e no potencial. Ele mostrou que chegou na melhor forma possível. É duro, ainda mais com a dúvida da penalidade da Austrália, mas temos de saber lidar. Acharam que mesmo no limite conseguiu passar a porta, tem alguma dúvida mas temos de aceitar. É subjetivo, têm de tomar uma decisão, os ângulos de visão são diferentes… O desporto é assim, tomaram uma decisão e temos que aceitar. Mas as coisas correram muito bem ao Antoine, o slalom português ficou bem representado, sempre a melhor e sem penalizações, e se fosse à final tudo podia acontecer”, comentou Pere Guerrero.

“O Peter Kauzer tem quatro Jogos Olímpicos, teve duas medalhas e ficou atrás do Antoine. Não podemos comparar Portugal com os recursos que os outros têm, que são as grandes potências. Demos o máximo, todos demos o máximo, o Antoine chegou muito melhor do que para o Mundial onde acabou a final em sétimo depois de ter feito terceiro na eliminatória mas as coisas são assim. Sei que o Antoine agora está mal mas estou muito satisfeito com ele, fez muito bem as coisas todas”, completou o treinador espanhol da Seleção.