Portugal e UE estão “bem informados” sobre o “que se passa” em Cabo Delgado e ajudarão a preparar as forças moçambicanas “da melhor maneira para lidarem com essa ameaça”, garante o chefe da missão militar europeia em Moçambique.

“Estamos muito atentos àquilo que se passa lá e ajudaremos a preparar as forças da melhor maneira possível para lidarem com essa ameaça. Estamos bastante bem informados sobre aquilo que se passa em Cabo Delgado”, afirmou em entrevista com a Lusa Nuno Lemos Pires, o brigadeiro-general português que vai chefiar a missão de treino militar da União Europeia (EUTM) em Moçambique.

Escusando-se a “entrar em grandes detalhes”, o oficial português, que parte esta terça-feira para Maputo para aí integrar a “força de planeamento avançada” da missão da UE, descreve “o inimigo” como “típico dos conflitos de insurgência radical, animados por este tipo de ‘jihadismo’, que infelizmente se expande por várias zonas do continente”.

“Obviamente que não há só uma cara, o que se passa em Cabo Delgado traduz o que se passa numa região alargada, que tem muitas metástases, muitas infiltrações provenientes de várias zonas de África”, descreve o brigadeiro-general do Exército, ex-subdiretor-geral de Política de Defesa Nacional no Ministério da Defesa Nacional e professor da Academia Militar.

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A missão militar da UE, não é, porém, uma “missão efetiva”, faz questão de sublinhar Lemos Pires. “Esta é uma missão não executiva, de reforço de treino, de apoio, de aconselhamento às Forças de Defesa e Segurança de Moçambique, para que elas possam, com mais propriedade, com mais treino, ser elas a responder aos desafios levantados, nomeadamente em Cabo Delgado”, esclareceu.

Também por isto, deixa claro o general português, a missão da UE “não chega tarde” a Moçambique, quando as forças moçambicanas ao lado das forças ruandesas e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC, na sigla em inglês) já retomaram as posições até agora sob o controlo dos insurgentes radicais islâmicos.

“São coisas diferentes. A missão da União Europeia chega a tempo daquilo que foi permitido e Portugal começou por fazer exatamente esse primeiro passo da capacitação [das forças moçambicanas]. São objetivos diferentes. A missão da UE é não executiva, as missões do Ruanda e da SADC são executivas” e, enquanto tal, vão para teatro de guerra.

“Neste contexto, é bom lembrar o sucesso das forças de defesa e de segurança de Moçambique”, sublinhou Lemos Pires.

“Às vezes falamos do Ruanda e da SADC como se fossem resolver a situação. Não. Vieram dar uma ajuda significativa a um esforço concentrado e uma aposta muito forte, com a colocação em Cabo Delgado do major-general [Cristóvão Artur] Chume, que é o Chefe de Estado-Maior do Exército moçambicano, com forças do exército e da marinha moçambicanas, que têm, junto com as forças internacionais, conseguido, de facto, algum sucesso no terreno”, afirmou o general.

“Honra seja feita às forças do Ruanda e da SADC, mas é bom lembrar o esforço muito grande que foi feito por estes militares do exército e da marinha de Moçambique, que conseguiram nestes últimos meses, de facto, restabelecer grande parte da paz e da segurança na região”, fez ainda questão de realçar.

É um esforço coletivo, lá está. Porque o problema não é só de Moçambique, é um problema regional. Nós todos sabemos isso”, concluiu.

Outra perceção que tem passado é a da associação das várias forças e missões militares presentes em Moçambique à defesa dos interesses das grandes companhias internacionais no gás natural liquefeito moçambicano, cujas jazidas offshore ao largo de Cabo Delgado têm o potencial para transformar o país no sétimo maior produtor mundial desta energia.

“A União Europeia não tem nada a ver com isso”, defendeu Lemos Pires. “Eu tenho um mandato muito claro, que é público, foi publicado pela UE no dia 12 de julho. Quem quiser pode ver o que lá está, não há qualquer relação deste mandato com interesses privados. A única coisa que há é ajudar a garantir a segurança das pessoas, a vida das pessoas”, acrescentou.

A UE vai desenvolver durante dois anos uma “missão não executiva de reforço de treino, de aconselhamento às Forças de Defesa e Segurança de Moçambique”, que acompanhará, “lado a lado”, a componente civil da presença europeia em Moçambique, reforçou.

“Se formos ver o investimento feito pela União Europeia em Moçambique, é muito mais elevado o montante investido em desenvolvimento do que propriamente em segurança”, afirmou.

Estamos a falar de centenas de milhões de euros com que a União Europeia tem ajudado, em ajuda humanitária imediata, em apoio ao desenvolvimento, em elaboração de fábricas, de esgotos e infraestruturas sanitárias, enfim, o apoio internacional da União Europeia está perfeitamente alinhado com os objetivos da minha missão”, salientou ainda Lemos Pires.

“Portanto, a minha ligação com a embaixada da União Europeia em Maputo vai ser permanente. Aliás, vou aterrar lá amanhã [esta terça-feira] e a primeira pessoa que vou ver será o senhor embaixador [Antonio Sánchez-Benedito Gaspar], como é óbvio”, disse o general português.

“Temos que estar ali, sempre lado a lado, para ver o que faz cada uma das componentes. Porque elas não estão separadas. Fazem parte do mesmo objetivo final”, concluiu Nuno Lemos Pires.