Cabo Verde vai propor aos credores internacionais a conversão de uma parte da dívida pública externa em fundos climáticos, para financiar a recuperação económica no pós-pandemia e a mitigação das consequências das alterações climáticas.

“Estamos a propor, e todos os pequenos países insulares também, que seja feita uma conversão de parte da dívida externa em fundos climáticos. Significa que os países desenvolvidos, que são nossos credores, possam converter uma parte da dívida externa em linhas de financiamento, em fundos, para investimento nas alterações climáticas”, anunciou o vice-primeiro-ministro de Cabo Verde, Olavo Correia.

À margem da 9.ª Conferência sobre as Mudanças Climáticas em África, que decorre desde quarta-feira na cidade de Santa Maria, na ilha do Sal, o governante explicou que a conversão da dívida pública externa servirá, na proposta em cima da mesa, para financiar projetos nas energias renováveis, no acesso à água e à energia, na economia circular e em “todas as matérias” relacionadas com a resposta às alterações climáticas.

Pensamos que ao mesmo tempo também podemos criar novos instrumentos de financiamento. Os fundos verdes, os fundos azuis, a conversão da dívida em fundos de investimento, mas também contribuição de parceiros internacionais para criar um bolo de financiamento maior para permitir que os nossos países consigam investir nos setores da educação, da saúde, das infraestruturas, mas também nas áreas que têm a ver com a promoção das alterações climáticas”, explicou o também ministro das Finanças.

Face à crise económica provocada pela pandemia de Covid-19, com quebra nas receitas fiscais e a necessidade de aumento de apoios sociais e às empresas, o Governo cabo-verdiano está a recorrer desde abril de 2020 ao endividamento público para financiar o funcionamento do Estado, tendo o endividamento externo disparado para um valor global de quase 1.700 milhões de euros.

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Por isso pensamos que temos aqui um caminho a percorrer e queremos fazer um apelo à comunidade internacional para que aceda a esses novos desafios de financiamento, criando condições para que o acesso seja mais fácil para os nossos países e em melhores condições, para que tenhamos condições de continuar a investir nos setores fundamentais para o nosso futuro”, disse Olavo Correia.

O ‘stock’ da dívida pública de Cabo Verde aumentou em julho para mais de 269.258 milhões de escudos (2.427 milhões de euros), equivalente a 153,6% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado para 2021, devido à pandemia, de acordo com dados do relatório síntese da execução orçamental.

Até julho, a dívida pública contraída internamente valia o equivalente a 47,3% do PIB cabo-verdiano (42,7% em julho de 2020), aumentando para mais de 82.986 milhões de escudos (748 milhões de euros), enquanto a dívida externa valia 106,3% (107,7% em 2020), equivalente a 186.672 milhões de escudos (1.683 milhões de euros).

O alívio, restruturação ou perdão da dívida externa de Cabo Verde é um objetivo de curto prazo assumido pelo Governo, que está em conversações com credores internacionais, nomeadamente Portugal, para libertar recursos financeiros para a retoma económica após a pandemia.

O primeiro-ministro Ulisses Correia e Silva pediu na quarta-feira “respostas globais” aos afeitos das alterações climáticas e uma “posição única africana” na 26.ª Conferência sobre Mudanças Climáticas da ONU (COP26).

Discursando na abertura da 9.ª Conferência sobre as Mudanças Climáticas em África, o chefe do Governo cabo-verdiano começou por apontar vários efeitos das mudanças climáticas, sobretudo nas zonas africanas a sul do Sahel, e sublinhou que a pandemia de Covid-19 veio demonstrar de forma mais evidente os graves impactos globais das alterações climáticas, entendendo que só podem ser mitigados e reduzidos com mecanismos de prevenção, regulação e de respostas globais.

Esta abordagem, obviamente, não desresponsabiliza cada país individualmente, amplifica, sim, as responsabilidades, para situá-las ao nível do planeta e de compromissos com as gerações futuras”, frisou.

Para o primeiro-ministro cabo-verdiano, o continente africano tem um “papel indispensável” nos esforços globais para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e limitar o aquecimento global a 1,5 graus Celsius.

Relativamente a Cabo Verde, disse que as mudanças climáticas são uma “ameaça real” para o arquipélago, e reafirmou a meta de atingir 30% de produção de energia elétrica a partir de fontes renováveis até 2025, ultrapassar os 50% em 2030 e alcançar 100% em 2040.

A 9.ª Conferência sobre as Mudanças Climáticas em África reúne mais de mil participantes em formato híbrido, virtual e presencial, e é organizado conjuntamente pelo Governo de Cabo Verde e a Comissão Económica das Nações Unidas para a África (UNECA).