“Há acordo e isso não é nada irrelevante”, assim começou por comentar o desfecho da cimeira do clima, COP 26, em Glasgow, em declarações transmitidas pela RTP.

“Chegámos a um acordo”, disse, considerando que “foram razoavelmente cumpridas as expectativas de uma COP que era manifestamente a mais importante desde o Acordo de Paris”. De onde saiu que a cada cinco anos deveria haver maior ambição nas medidas para conter a subida da temperatura do planeta. “Era fundamental que a cada cinco anos houvesse maior ambição e houve maior ambição”, declarou.

Admite que os ambientalistas têm razão quando falam de que o acordo “soubo a pouco” nomeadamente no mercado de carbono e na redução da utilização do carvão. Matos Fernandes admite que era também vontade de Portugal que todos os créditos de carbono que foram atribuídos desde Quioto desaparecessem de cima da mesa, mas “não conseguíssemos”. Contudo, acrescenta, “manifestamente, foram muito reduzidos”.

Por outro lado, “o acordo pela primeira vez se fala, com sinal forte, no fim do carvão e no fim ao subsídios aos fósseis”, o que diz que Portugal tem vindo a fazer há uns anos. “Todos gostámos mais do phase out, desaparecimento de [carvão]”. Por imposição da Índia ficou prevista apenas o phase down, ou seja a redução.

“Mas este é um desafio que ninguém ganha sozinho. Só ganhamos se o ganharmos todos. Este é um acordo multilateral, tem de haver unanimidade. E foi encontrada em torno desta forma de escrever”, explicou, dizendo que, por isso, “é um acordo no mínimo daquilo que poderíamos desejar, mas ligeiramente acima desse mínimo”.

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Matos Fernandes realça ainda do acordo o mecanismo de transparência no âmbito do qual todos os países têm de fazer report igual independentemente do grau de desenvolvimento. E reforça a cada 5 anos tem de haver maior ambição e ambição projetada para 10 anos.

À Lusa, realça o artigo sobre os mecanismos de mercado, “que de alguma forma limitam aquilo que era a quantidade de créditos atribuídos em anos passados”.

“Além disto há claramente a meta de 1,5ºC (graus celsius), com compromisso de reduzir até 2030 em 45% as emissões comparadas com 2010, isto fica escrito e é da maior importância”, disse o governante, acrescentando: “Manifestamente trabalhou-se bem nestes 15 dias”. À RTP realça que saiu de Glasgow um caminho para o 1,5ºC.

Quanto ao financiamento, João Pedro Matos Fernandes considerou que se está no caminho dos apoios de 100 mil milhões prometidos, e disse que esse vai ser o grande tema da próxima cimeira, no Egito, porque se os países ricos não conseguirem este valor os países em vias de desenvolvimento vão ter boas razões para se queixar.

“Uma coisa que eu considero muito importante e que nos batemos desde o primeiro dia, é que o dinheiro para a adaptação duplica”, já com verbas para perdas e danos do passado, disse ainda o ministro do Ambiente, concluído que “as partes estiveram à altura do compromisso”.  Admite que o mecanismo é de difícil concretização, mas a ideia “é boa”.

Numa declaração divulgada no site da Presidência, Marcelo Rebelo de Sousa lamenta que “não tenha sido possível um consenso mais ambicioso, nomeadamente no que diz respeito aos combustíveis fósseis, à redução de emissões, aos prazos para atingir os objetivos limitados em discussão, ao apoio financeiro aos países menos desenvolvidos, para se adaptarem às mudanças que aí estão e mitigarem os efeitos para os seus povos”. Ainda assim, saúda “o pequeno passo” dado pelo COP26, que “ainda assim representa um avanço, tímido, na luta contra as alterações climáticas”.

Histórico foi como o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, apelidou o acordo de Glasgow, admitindo que resta “muito por fazer nos próximos anos” para travar as alterações climáticas. “Ainda há muito mais a fazer nos próximos anos. Mas o acordo de hoje é um grande passo em frente e, crucialmente, temos o primeiro acordo internacional para reduzir o carvão e um roteiro para limitar o aquecimento global a 1,5 graus”, disse num comunicado, citado pela Lusa.

Comissão Europeia: “perfeito é inimigo do bom”

Já o representante europeu na cimeira do clima da ONU (COP26) saudou o acordo como “muito bom” apesar das cedências de última hora, afirmando que “em política, o perfeito é inimigo do bom”.

Em declarações aos jornalistas à saída do plenário final da cimeira, o vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, afirmou que a comunidade internacional pode estar satisfeita com o compromisso conseguido e que se pode dizer que em termos de aquecimento global até fim do século, se sai da COP26 com “uma oportunidade de ficar bem abaixo dos dois graus e ainda com uma hipótese de ficar em 1,5 graus”.

“Tivemos que concordar com isto. Se tivéssemos dito que não, poderíamos não ter acordo nenhum”, afirmou, referindo-se à emenda de última hora que a Índia, apoiada por outros países, forçou na versão final da declaração que sai de Glasgow, que troca “acabar” por “reduzir” no parágrafo sobre o uso de carvão para produção de energia.

Timmermans argumentou que se se tivesse insistido em recusar a alteração, “isso seria tão inaceitável [para os países que apoiavam a emenda] que teriam feito cair o acordo inteiro e aí teríamos perdido uma oportunidade”.

“Obviamente, estou desapontado, mas também temos que nos lembrar que há um par de meses, ninguém queria falar de carvão. Claro que as pessoas estão a apontar que isto é menos do que tínhamos na versão anterior, mas é muito mais do que alguma vez tivemos”, declarou.

Está aprovado o “Pacto do Clima de Glasgow”, com o carvão e o petróleo na mira e promessas de mais dinheiro para países pobres

“Muito significativo” o que aconteceu em Glasgow

O enviado especial dos Estados Unidos para o Ambiente, John Kerry, considera que o acordo alcançado na COP26 em Glasgow aproxima o mundo “mais do que nunca” de “evitar o caos climático”, dizendo mesmo que “a verdade é que o que aconteceu aqui é muito significativo”, disse.

Numa conferência de imprensa no final da conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas, Kerry afirmou que essa conclusão “não é um exagero”, pois acredita que o pacto alcançado hoje à última hora, após tensas negociações e apesar de divergências entre os 197 países presentes, aprofunda os compromissos firmados no Acordo de Paris de 2015.

“Eu realmente acredito que, como resultado desta decisão e como resultado dos anúncios que foram feitos ao longo das últimas duas semanas, estamos na verdade mais perto do que nunca de evitar o caos climático e garantir um ar mais limpo, água mais segura e um planeta mais saudável”, afirmou.

Numa referência à controversa alteração de um parágrafo onde é proposta de fim faseado do uso do carvão como fonte de energia e dos subsídios a combustíveis fósseis, Kerry salientou que essa questão é inédita neste tipo de declarações.

O antigo secretário de Estado norte-americano admitiu que o texto não é perfeito e que não gostou da forma como a emenda foi alterada, mas que teve de fazer uma escolha entre aceitar, ou por em risco o resto do acordo, que tem outras conquistas.

As explicações da Índia

Tendo pedido a alteração em relação à diminuição do carvão, o ministro do Ambiente indiano, Bhupender Yadav, considera que a Índia, juntamente com o Brasil, África do Sul e China, demonstraram “grande flexibilidade” na COP26 para aceitar medidas de combate às alterações climáticas face aos desafios internos de desenvolvimento.

“Reconhecemos a necessidade de avançar e alcançar resultados concretos na COP26. Para isso, demonstrámos grande flexibilidade para chegar a um resultado que seja aceitável para todos”, disse Bhupender Yadav numa intervenção no plenário final da 26.ª cimeira do clima das Nações Unidas (COP26), a decorrer em Glasgow, falando em nome do grupo BASIC, composto pelo Brasil, África do Sul, Índia e China.

Os países do BASIC, acrescentou, “comprometeram-se com ações climáticas ambiciosas sem esquecer os desafios de desenvolvimento sérios que enfrentamos em casa”.

Yadav apelou aos países desenvolvidos para “darem um passo em frente para cumprir não só os seus compromissos de reduzir emissões, mas também de acelerar financiamento, transferência de tecnologia e desenvolvimento de competências nos países em desenvolvimento”.

Embora tenha notado “sinais encorajadores” em várias áreas e progresso em termos de financiamento, salientou a “profunda preocupação com a falta de mecanismos para pôr em prática estas medidas.