Sem os “vistos gold” e os outros estímulos fiscais destinados aos residentes estrangeiros, o preço da habitação não teria disparado e, consequentemente, os mais jovens teriam mais facilidade em emancipar-se, vulgo sair de casa e constituir família. Pouco claro à partida, o raciocínio está na base da proposta do Conselho Económico e Social (CES), que quer acabar com o benefício fiscal para estimular a natalidade.

“Portugal está a ter aumentos nos preços da habitação acima de qualquer das economias da zona euro e está, num conjunto de 40 países, entre aqueles que apresenta maior rácio entre o preço e rendimentos, ou seja, em que os preços estão mais longe da média de rendimentos. Isso mostra que estes preços estão a responder a uma procura que não tem nada a ver com os residentes mas com estrangeiros”, explica a sociológa e coordenadora do parecer do CES, Ana Drago, citada pelo Público. “Sabemos que o setor do mercado habitacional se concentrou na chamada renovação de luxo e no alojamento turístico, e sobretudo nas áreas metropolitanas e isso criou dificuldades acrescidas aos jovens casais.”

Com 72.316 nascimentos até ao final de novembro, Portugal registou mínimos históricos de natalidade. Contas feitas são menos 6.058 crianças do que no mesmo período de 2020. A expectativa é que os dados relativos ao ano passado ainda sejam piores. Os constantes aumentos registados no mercado imobiliário, aliados aos baixos rendimentos e à insegurança laboral dos vínculos precários, ajudam a emoldurar a quebra. No cenário europeu, Portugal é o quinto país da UE onde os jovens saem mais tarde de casa.

“Do que estamos a falar é de uma espécie de ausência de futuro, da impossibilidade de os jovens conseguirem perspetivar um futuro em que os seus desejos, nomeadamente em relação à família que querem constituir, se possam realizar, o que leva a que a que o país seja abandonado à primeira oportunidade”, sintetiza, a antiga bloquista, Ana Drago.

De resto, no documento, que propõe a alteração de paradigma rumo a uma segurança social mais sustentável o CES reconhece que “as dificuldades no acesso à habitação traduzem-se no crescimento sustentado da percentagem de jovens adultos, entre os 18 e os 34 anos, que permanece em casa dos progenitores, adiando a sua autonomização e a criação de um núcleo familiar próprio.”

Na lista de desafios e apelos do CES rumo a uma economia mais sustentável, a redução do horário normal de trabalho, o combate à precariedade e a revisão dos escalões do IRS são tidos como essenciais para resolver o desequilíbrio. A generalização das consultas de ginecologia nos centros de saúde, o reforço do ‘cheque dentista’ e o aumento das licenças parentais também.

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