A erupção do vulcão submarino Hunga-Tonga-Hunga-Ha’apa, nas ilhas Tonga, foi de tal modo explosiva que o seu impacto foi sentido em vários pontos do mundo, até em Portugal. A explosão que ocorreu no arquipélago do Pacífico levou a que muitos países como Japão, Austrália, Nova Zelândia, Chile e Peru fossem atingidos por um tsunami em consequência da onda de choque atmosférica originada pela explosão vulcânica. Para a costa portuguesa, embora, não tivesse sido emitido nenhum alerta para risco de ondas gigantes, foi verificada uma subida do nível do mar.

De acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera, foram registadas “variações do nível do mar em praticamente todas as estações maregráficas em operação na costa portuguesa“, todas inferiores a meio metro. Os sinais atmosféricos da explosão foram verificados em Portugal na madrugada de dia 16 de janeiro de 2022, e as alterações do nível do mar foram registadas horas depois.

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Em Ponta Delgada, nos Açores, foi registada a maior amplitude, com a subida do nível do mar em 40 centímetros. Já no Funchal este aumento ficou pelos 20 centímetros, valor que não foi atingido em Portugal Continental, com exceção de Peniche — onde se registou uma subida na ordem dos 39 centímetros.

No sábado, a capital das ilhas Tonga, Nuku’alofa, localizada na ilha de Tongatapu, a 65 quilómetros sul do vulcão, foi atingida por um tsunami composto por ondas que atingiram 1,2 metros.

No Japão, foram registadas ondas que atingiram 2,7 metros de altura. Já na costa oeste dos Estados Unidos da América, algumas ondas terão ultrapassado os 1,2 metros, segundo o Serviço de Meteorologia Nacional sediado em San Diego, citado pela CNN. Nos EUA, foram registados pequenos tsunamis em regiões como a Califórnia, Alasca, e Havai.

EUA, Japão e Chile também emitem alertas de tsunami após erupção vulcânica

De que forma conseguiu o impacto desta erupção fazer-se sentir em todo o mundo?

Uma explosão da magnitude da do vulcão de Tonga deve-se a vários fatores. Ao Observador, José Pacheco, diretor do Instituto de Investigação em Vulcanologia e Avaliação de Riscos da Universidade dos Açores, explicou que esta erupção localiza-se numa região propícia ao desenvolvimento de erupções muito fortes, uma vez que o magma aqui formado é mais explosivo. Contudo, o investigador esclarece que “mesmo nos ambientes em que há uma maior propensão para as erupções mais explosivas, o número de erupções menos explosivas é sempre muito superior”.

No caso específico do vulcão de Tonga, cada uma das erupções que ocorreu foi sempre de teor mais violento que a anterior, pelo que havia já uma tendência observável que apontava para o cenário que viria mesmo a acontecer no dia 15. Houve, no entanto, um fator que contribuiu largamente para a magnitude desta erupção: o vulcão de Tonga ser um vulcão submarino.

Quando o magma entra em contacto com a água do mar, de acordo com José Pacheco, aumenta muito a explosividade da erupção desde que isso aconteça em determinadas condições. Se a erupção for muito profunda, a coluna de água vai acabar por impedir que a erupção chegue sequer à superfície, mas “se a erupção ocorrer, contudo, a uma profundidade baixa, o contacto do magma com a água do mar vai fazer com que a expansão explosiva do vapor da água aumente a explosividade da erupção, que foi o que aconteceu neste vulcão”.

Ainda em relação ao impacto do vulcão sentido em Portugal, com a subida do nível do mar, o vulcanólogo explicou que o tsunami que, ainda que de insignificante impacto na nossa costa, se fez sentir, é um fenómeno completamente diferente do tsunami que afetou as ilhas do Pacífico. “O tsunami que foi efetivamente gerado pela erupção gerou-se por uma enorme movimentação da massa de água, que foi resultante da explosão vulcânica propriamente dita. Gerou-se uma movimentação dessa massa, que fez com que se criasse uma onda que depois se propagou ao longo do Pacífico”, esclareceu o diretor do instituto de investigação.

“Em ambientes muitíssimo mais distantes como por exemplo os Açores, que está não só muito mais distantes como noutro oceano, o efeito daquilo que nós vimos não resultou do tsunami produzido pelo vulcão, mas sim da onda de choque foi produzida pela erupção. Esta onda é que viajou através da atmosfera e cobriu o planeta todo.”

Uma onda que, ao movimentar-se sobre o oceano Atlântico, foi a responsável pela subida do nível do mar, uma vez que se verificou uma aumento na pressão atmosférica por cima da água.

Vulcão dos Capelinhos: a fotocópia de Tonga mas de magnitude (muito) mais reduzida

Nos Açores, entre 1957 e 1958, o vulcão dos Capelinhos experienciou uma erupção parecida ao comportamento do vulcão de Tonga em dezembro de 2021, especialmente no que diz respeito ao mecanismo eruptivo de ambos.

Embora, como explicou José Pacheco, a magnitude da erupção dos Capelinhos tenha sido menor por ter um tipo de “magma mais primitivo e menos explosivo“. Estas erupções, ao contrário de fenómenos como o verificado em La Palma, são erupções hidromagmáticas.

Segundo o vulcanólogo, “nas erupções puramente magmáticas, a explosão resulta apenas da expansão do gás magmático. O magma tem vesículas de gás no seu interior tal como uma garrafa de coca-cola, e quando essa mistura de líquido e gás ascende à superfície, esse gás que está sobre uma grande pressão dentro de cada uma dessas vesículas, expande-se de forma explosiva”.

Já nas erupções hidromagmáticas, para além do gás magmático que está contido nas vesículas, o contacto deste magma a temperaturas muito elevadas – perto dos 1000 graus ou até acima disso – com a água, vai vaporizar a água. Esta, ao expandir-se a uma velocidade tal, gera uma explosão, o que vai aumentar a própria energia explosiva do vulcão. “Os mecanismos eruptivos são semelhantes. Durante as primeiras fases eruptivas, o vulcão de Tonga teve um comportamento semelhante ao dos Capelinhos, o que resulta do facto de serem ambos vulcões submarinos, mas o de Tonga é mais explosivo e o vulcão teve a capacidade de aumentar de forma abrupta a taxa de descarga e gerar uma erupção muitíssimo mais explosiva do que aquilo que alguma vez seria expectável nos Capelinhos”.

A explosão do vulcão Hunga-Tonga-Hunga-Ha’apa criou uma nuvem de gás, fumo e cinzas que atingiu os 20 quilómetros de altura.

Pelo menos seis mortos confirmados, mas os danos ainda estão a ser avaliados

A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, citada pelo The Guardian, afirmou no sábado que não tinha sido ainda estabelecido contacto com as zonas costeiras das ilhas Tonga além da capital. “Nuku’alofa está coberta por espessas camadas de cinza vulcânica, mas de resto as condições são calmas e estáveis”, afirmou a primeira-ministra.

Tanto a Nova Zelândia como a Austrália já enviaram esta segunda-feira aviões para analisar os danos nas ilhas Tonga, uma vez que no sábado e no domingo a nuvem de cinzas vulcânicas não permitiu condições seguras para que os aviões pudessem manobrar. Serão analisados danos a estruturas como estradas, portos e redes elétricas no país, para que se possa preparar uma próxima fase de auxílio à nação-arquipélago.

Perto de 80 mil pessoas terão sido afetadas, segundo a Cruz Vermelha, citada pela BBC, em consequência da erupção vulcânica e do posterior tsunami que assolou as zonas costeiras do oceano Pacífico.

Um arquipélago coberto de cinza: as primeiras imagens de Tonga após a erupção do vulcão

Embora não seja ainda possível avaliar todos os danos e o número de mortos, uma vez que as comunicações com o país ainda estão suspensas, pelo menos seis pessoas foram já confirmadas mortas. Duas, no Peru, terão morrido afogadas numa praia,  em consequência do tsunami que afetou a costa do país sul-americano, adiantou o The Guardian.

Segundo o mesmo jornal, uma mulher britânica de 50 anos, Angela Glover, morreu vítima do tsunami em Tonga, depois do seu corpo ter sido dado como desaparecido. O marido de Angela, que conseguiu apoiar-se numa árvore no momento de impacto da onda gigante, terá encontrado o seu corpo, depois de Angela Glover morrer a tentar salvar o seus cães do tsunami. O casal vivia nas ilhas Tonga desde 2015.

De acordo com a Reuters, três outras pessoas foram já confirmadas como tendo morrido em consequência do tsunami que afetou Tonga. A mesma agência dá conta do grau de destruição de uma das ilhas mais pequenas da nação do Pacífico, onde todas as casas foram destruídas pela onda gigante.

Ao Observador, José Carlos Kullberg, professor de Geologia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, explicou que erupções vulcânicas deste tipo são frequentes “ao longo de todo o anel de fogo do pacífico, a zona da Terra que tem maior atividade sísmica e vulcânica“, quando analisadas em intervalos de tempo relativamente grandes.

Em termos de milhões de anos, essa ocorrência é frequente. Houve nas ilhas Tonga, na década de 1930 uma explosão muito grande com a formação de uma caldeira de dimensão bastante grande. Não é com uma frequência diária nem anual, mas é comum ocorrerem estes explosões”, explicou o geólogo.

Em relação ao período de atividade do vulcão, José Carlos Kullberg acredita que a erupção ocorrerá num período muito mais curto do que aquele verificado, por exemplo, em La Palma.

“Neste tipo de explosões, como a de Tonga não é muito frequente que as erupções aconteçam à semelhança do que vimos diariamente, em La Palma — que teve um vulcanismo mais efusivo e levemente explosivo de vez em quando — onde estava sempre a sair lava e apenas pequenas explosões. A princípio, quando se trata de erupções como a de Tonga, as pressões acumuladas dentro do vulcão são atenuadas quando existem essas explosões, e posteriormente,  durante algum tempo, [o vulcão] fica sem atividade,” concluiu José Carlos Kullberg.

O vulcão de Hunga-Tonga-Hunga-Ha’apa, que embora seja um vulcão submarino, apresenta parte do cone vulcânico à superfície, tinha entrado em erupção, em 2015, recorda a ABC News.

Na altura, contudo, ao contrário do que ocorreu agora, a erupção levou à solidificação do material vulcânico em contacto com o mar, ligando as duas massas terrestres, Hunga-Tonga e Hunga-Ha’apa. As erupções verificadas agora, contudo, levaram ao desaparecimento desta massa vulcânica solidificada, que foi destruída durante as explosões.