A escolha de Rui Moreira de promover uma ex-vereadora socialista para o executivo autárquico, garantindo assim a maioria que tinha perdido nas urnas, caiu como um balde de água fria no PSD local — com quem o presidente da Câmara do Porto firmou um acordo. “Fomos completamente apanhados de surpresa”, confessa Miguel Seabra, líder da concelhia PSD/Porto, acrescentando que soube da decisão apenas pela comunicação social e a recebeu com “estranheza”.

“O acordo de governação e estabilidade traçado até 2025 tem sido cumprido por ambas as partes, não vemos necessidade de ver uma eleita do PS ter pelouro. Aliás, essa hipótese nunca esteve em cima da mesa”, sublinha o social-democrata em declarações ao Observador.

O autarca do Porto revelou a escolha de Catarina Santos Cunha, antiga vereadora do PS com o estatuto de independente desde novembro, para integrar o executivo autárquico, garantindo assim uma maioria que tinha perdido nas últimas autárquicas. Cristina Pimentel, até aqui vereadora com o pelouro dos Transportes, vai para a direção da STCP (Serviços dos Transportes Coletivos do Porto), e Fernando Paulo, antigo vereador da Habitação, volta a integrar o executivo.

Se a ascensão do antigo vereador Fernando Paulo já era expectável, a entrada de uma vereadora com pelouro de “uma outra força política” não fazia, de todo, parte dos planos. Miguel Seabra garante que os sociais-democratas têm sido “colaborantes” e agido “de boa fé”, votando favoravelmente às medidas do executivo municipal.

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“Não esperávamos esta descortesia por parte do presidente — deslealdade talvez seja uma palavra muito forte — de não reconhecer o esforço do PSD para ajudar a governar a cidade”, insiste Miguel Seabra.

O líder da concelhia garante que o impasse atual não é sinónimo de um “amuo” por parte do partido, que não esperava que os dois vereadores sociais democratas [Vladimiro Feliz e Alberto Machado] ganhassem pelouros na câmara.

“Não é uma questão de amuo, no acordo não exigimos lugares nem pelouros, podíamos perfeitamente tê-lo feito, mas não aceitámos”, explica. Seabra revela ainda já ter contactado Francisco Ramos, presidente do movimento independente de Rui Moreira, mas reconhece não estar ainda na posse “de todas as informações necessárias” para o PSD tomar uma decisão final.

“É prematuro falar de um desfecho. Tenho que apurar mais informações para as analisarmos devidamente na reunião de amanhã [quinta-feira]”, salvaguarda Seabra.

Rui Moreira promove ex-socialista e fica com maioria no Porto. Garante que acordo com PSD é para manter

Surpresa, tensão e “deslealdade institucional”. Que rumo tomará o PSD/Porto?

No aparelho social-democrata ninguém esconde o choque com a decisão de Moreira. “Quando soubemos que a vereadora [Catarina Santos Cunha] tinha ficado com o estatuto de independente levantaram-se dúvidas e os boatos existem sempre. Mas nunca fomos informados desta intenção”, frisa um dirigente social-democrata local. Esta troca de cadeiras no executivo municipal do Porto “apanhou todos de surpresa”, principalmente “os militantes base do partido”.

Resta saber o que acontece agora ao acordo de governabilidade assinado entre sociais-democratas e Rui Moreira. No PSD/Porto, as opiniões dividem-se: há quem recorde que o compromisso tem sido respeitado por todos e que “as condições não se alteraram desde o dia em que foi assinado”; mas há também quem perspetive um momento definidor para o partido na cidade, até pela pressão interna dos que sempre se opuseram ao acordo com Moreira.

Um antigo dirigente do PSD/Porto, que preferiu não ser identificado, diz ao Observador não achar “normal” que as mudanças no executivo municipal liderado por Rui Moreira não tenham sido “devidamente articuladas” com os sociais-democratas, falando mesmo em “deslealdade institucional”.

“Tenho dúvidas que existam condições reais para manter este acordo, os dirigentes não foram consultados e esta não é uma situação simpática”, defende a mesma fonte.

O mesmo ex-dirigente considera que incluir o nome Catarina Santos Cunha na equipa de vereadores com pelouro é envolver o número três da lista do PS. “Pode estar em rutura com o PS, mas isso não apaga a sua ligação ao partido, às suas ideias e ao seu programa eleitoral”, afirma, alertando que “em política não há coincidências”.

“É estranho que isto ocorra dias depois de o PS ter maioria absoluta nas legislativas” diz, recordando ainda a troca de críticas entre Rui Rio e Moreira à boleia do julgamento do Caso Selminho. “Espero que esteja decisão não seja fruto de nenhum estado de alma.”

Certo é que há uma decisão a tomar e adivinha-se, por isso, uma reunião tensa do PSD/Porto. “Não há dúvidas de que existem visões diferentes dentro da concelhia sobre esta matéria. O próprio acordo foi uma situação debatida e trabalhada, mas que acabou por ser consensual. Esta atitude do movimento de Rui Moreira pode romper com esse consenso”, nota o antigo dirigente do PSD local. No Porto, o PSD pode optar agora por continuar a ser “solidário”, mantendo-se ao lado de Rui Moreira, ou escolher ser “mais exigente”, fazendo uma oposição “mais firmada” e assumindo-se com uma “verdadeira” alternativa, com um projeto político para 2025.