O Novo Banco vai fazer um novo pedido de capital ao Fundo de Resolução, relativo ao exercício de 2021, que irá superar os 200 milhões de euros, apurou o Observador. Esse pedido de injeção por parte do Fundo de Resolução, um organismo público sob a gestão do Banco de Portugal, é, em grande medida, consequência da aplicação de uma lei fiscal aprovada no parlamento em final de 2020 depois de proposta pelo Partido Ecologista Os Verdes (PEV).

O anúncio será feito ao final da tarde desta quarta-feira, a propósito da apresentação de resultados anuais de 2021. O evento vai acontecer, tudo indica pela última vez, na histórica sede do Banco Espírito Santo no “coração” de Lisboa, porque o Novo Banco já anunciou estar a preparar a mudança da sede para as instalações que já ocupa no Tagus Park, em Oeiras.

A legislação em causa – que tem um impacto (bruto) de mais de 100 milhões de euros no valor que será pedido ao Fundo de Resolução – está relacionada com o alargamento das taxas agravadas do Imposto Municipal de Imóveis (IMI) e do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) para empresas com ligações a jurisdições offshore.

O entendimento – para já, não-vinculativo – da Autoridade Tributária (AT) é que essas taxas agravadas devem ser cobradas no caso da carteira de imóveis do Novo Banco. Isto porque a AT considera que se enquadra na legislação aprovada aquilo que é a estrutura acionista do fundo Lone Star, que, através da empresa Nani Holdings, é dono de 75% do Novo Banco e tem uma malha complexa de fundos que operam e têm sede em várias jurisdições, incluindo offshores.

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A lei de 2020 que só agora se tornou um problema para o Novo Banco

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As empresas localizadas em offshores que criem um veículo para deter imóveis em Portugal passaram a estar sujeitas a taxas agravadas de IMI e de IMT segundo uma proposta do PEV aprovada em novembro de 2020.

A proposta foi lançada para “evitar que um proprietário, residente num offshore, beneficie indiretamente da suspensão de tributação de IMI através da criação de uma entidade veículo em território nacional “ e, em simultâneo, alarga “a taxa agravada do imposto aplicável aos prédios de uma entidade veículo que seja criada por entidade com domicílio fiscal num offshore”.

Os códigos do Imposto Municipal sobre os Imóveis (IMI) e do Imposto Municipal sobre Transações Onerosas (IMT) já contemplam taxas agravadas para os imóveis detidos por sociedades sedeadas em offshores. No IMI a taxa aplicável nestas situações é de 7,5% e no IMT é de 10%.

A medida proposta pelo PEV veio apertar mais a malha a estas situações, tendo sido aprovada com a abstenção do PSD, CDS-PP, Chega e Iniciativa Liberal e o voto favorável dos restantes partidos durante as votações na especialidade do Orçamento do Estado para 2021 (OE2021).

Apesar de a lei ter sido aprovada ainda em 2020, quando se negociava o Orçamento do Estado para 2021, o Novo Banco só terá sido confrontado com este problema durante este último exercício.

O banco contestou a aplicação da lei ao seu caso e entregou à Autoridade Tributária um parecer onde explica os seus argumentos. Porém, enquanto não existe uma decisão final e vinculativa do fisco, o banco acabou por colocar de parte uma provisão por contingências fiscais – e, como qualquer provisão que um banco assume, vai subtrair aos resultados e ao capital, ampliando o pedido ao Fundo de Resolução.

Contactada pelo Observador, fonte oficial do Novo Banco não fez comentários.

Novo Banco fica ainda mais perto de esgotar os 3.890 milhões

Se for satisfeito, este pedido de mais 200 milhões de euros ao Fundo de Resolução elevará para mais de 3.600 milhões o valor já entregue à instituição, desde que foi feita a venda da maioria do capital ao fundo Lone Star. Nos termos dessa venda, ficou previsto um mecanismo de capital contingente que poderia levar a que até 3.890 milhões de euros fossem injetados no banco, pelo que o valor total irá ficar ainda mais próximo de ser esgotado.

O pedido será feito ao Fundo de Resolução apesar de o banco ter fechado o exercício de 2021 com lucros que devem aproximar-se dos 200 milhões de euros. O Jornal Económico já tinha noticiado, a 18 de fevereiro, que os lucros devem chegar perto dos 200 milhões. Ao que o Observador apurou ficarão um pouco abaixo desse valor.

Por ter de fazer essa provisão fiscal, os rácios de capital não sobem tanto quanto poderiam subir pelo efeito dos resultados positivos que vão ser apresentados esta quarta-feira. Ao que o Observador apurou, o rácio de capital do banco não vai além dos 11,1%, o que significa que o Fundo de Resolução é chamado a fazer uma injeção – como um “top up” – que eleve esse rácio até 12%.

Ficou definido nos termos do contrato de venda do banco ao Lone Star que uma das vias pelas quais o Fundo de Resolução poderia ter de injetar capital no Novo Banco seria quando o rácio de capital do banco descesse para menos de 12%. O Fundo de Resolução é chamado a entrar em cena quando existem perdas no perímetro de ativos “herdados” do BES e sempre que, por essa ou por outra razão, o rácio de capital não chega a 12%.

O Fundo de Resolução é um organismo público que é alimentado por contribuições feitas pelo sistema financeiro nacional. Porém, dada a magnitude das necessidades que envolveu a resolução do BES (e do Banif), os bancos têm várias décadas para, através dessas contribuições, ressarcir os empréstimos públicos que foram feitos ao Fundo de Resolução para que este pudesse injetar capital nos bancos onde foi chamado a intervir.

Ministro disse ter “forte convicção” de não haver mais injeções

Além do impacto significativo desta provisão por contingência fiscal, o pedido de injeção por parte do Novo Banco também inclui outros fatores que já vêm de trás.

O principal fator está relacionado com as divergências que continuam por resolver entre o Novo Banco e o Fundo de Resolução, depois de o tribunal arbitral ter dado razão ao organismo público no processo sobre a aplicação das normas de contabilidade do IFRS9. Apesar disso, como essa chamada de capital não foi satisfeita, o Novo Banco volta a pedir ao Fundo de Resolução o valor que foi retido no ano passado: 169 milhões de euros.

Apesar de estar assim previsto nas regras – e embora o próprio Novo Banco conteste a aplicação da lei que está na base de mais de metade da chamada de capital –, a decisão deverá ser polémica já que o ministro das Finanças, João Leão, afirmou ao jornal Eco a 23 de fevereiro ter a “forte convicção de que não seja devido qualquer pagamento” para o Novo Banco, relativamente às contas de 2021.