O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia alertou esta terça-feira para a necessidade de uma “base legal” legítima para a aplicação de sanções a cidadãos russos, nomeadamente o congelamento de contas bancárias, por se tratar de uma “restrição da propriedade privada”.

“Portugal não está em guerra com ninguém, que eu saiba, e, portanto, as sanções que são aplicadas em Portugal têm que ter desde logo uma fonte legal, uma legitimidade legal, saber qual é a lei que prevê a aplicação destas sanções e as pessoas têm que ser sancionadas porque cometeram algum delito, ou portaram-se mal. E é por serem russas? Não me parece“, disse.

O presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo falava à margem de um encontro organizado esta terça-feira pela agência Lusa sobre “As novas ameaças e os desafios da cibersegurança” no qual participou num painel juntamente com a professora de Relações Internacionais na Universidade Autónoma Ana Isabel Xavier, o professor catedrático jubilado do Instituto Superior Técnico José Tribolet, moderado pela diretora de informação da Lusa, Luísa Meireles.

Na opinião do constitucionalista “é preciso saber qual é a base legal para congelar contas bancárias e qual é o instrumento que está a ser utilizado”.

“Eu sei que ao nível internacional há dois instrumentos que por causa do terrorismo têm sido aplicados pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas e pela União Europeia que são as listas dos terroristas, dos supostos terroristas. Mas isso é um assunto completamente diferente porque neste caso da Ucrânia não é nada disso que se trata”, explicou.

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Portanto, continuou, “é preciso saber qual é a legitimidade desse tipo de intervenções que são restritivas da liberdade individual e da propriedade privada, que são direitos que estão na Constituição e o confisco ou o congelamento de ativos financeiros das contas é propriedade privada, e só pode ser feito com base numa lei com intervenção dos tribunais“.

“Uma coisa são os estados deixarem de comprar petróleo ou gás à Rússia, isso é uma decisão económica de mercado, outra coisa é punir cidadãos russos através do congelamento dos seus bens”, exemplificou.

“Isto não é a apologia da Rússia, como é obvio, ou dos que sejam coniventes, mas é preciso distinguir o trigo do joio e isto não pode ser tudo “a eito” só pelo facto da pessoa ter uma ligação à Rússia ou uma nacionalidade”, acrescentou.