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Portugal Fashion. Obras de arte, questões de género e o amor na era digital. O Bloom arriscou na passerelle

Este artigo tem mais de 2 anos

A 50.ª edição do Portugal Fashion arrancou na Alfândega do Porto e pelo Bloom desfilaram propostas arrojadas, imponentes e criativas. Houve vénias à pintura, referências à literatura e odes ao engate.

A 50.ª edição do Portugal Fashion acontece na Alfândega do Porto até sábado
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A 50.ª edição do Portugal Fashion acontece na Alfândega do Porto até sábado

MELISSA VIEIRA/ OBSERVADOR

A 50.ª edição do Portugal Fashion acontece na Alfândega do Porto até sábado

MELISSA VIEIRA/ OBSERVADOR

“Se eu fosse casa escolhia ser janela. Porque a janela é da casa o que não é, o vazio onde ela sonha ser mundo.” Foi inspirada nesta frase do escritor Mia Couto que Maria João Cunha, de 22 anos, desenvolveu a sua mais recente coleção, “Janela Aberta”. “É a janela que dá mundo e liberdade a uma casa. Esta metáfora de Mia Couto fez-me todo o sentido, principalmente porque fiz esta coleção num ano tão atípico de pandemia em que me faltava cor, dinâmica e alegria. A coleção é quase como se fosse uma janela para o público, ele pode sentir e interpretá-la como quiser”, diz ao Observador já depois do desfile.

Para conseguir criar essas janelas abertas para o mundo nas suas peças Maria João Cunha utilizou uma técnica de manipulação de tecido que aprendeu em Barcelona quando fez Erasmus. “É uma técnica feita à máquina a que chamo de favos, porque me fazem lembrar os favos de mel. Aprendi a base em Espanha e depois comecei a explorar a técnica com vários tipos tecidos, dos impermeáveis mais confortáveis aos cetins mais cerimoniais, e percebi que conseguia sempre resultados diferentes. É algo que nasce de muita experimentação, mas que também faz parte da minha própria identidade.”

O efeito é visível em vestidos, com vários comprimentos e volumes, e permite uma transparência nas peças, onde através de aberturas nas cortas e nas zonas laterais podem ver-se forros coloridos e até florescentes. “Achei engraçado ter cores contrastantes, são como se fossem mini janelas onde podemos ver um mundo cheio de cor. Há muita esperança impressa nesta coleção também.

MELISSA VIEIRA/ OBSERVADOR

Outra estreante na sala do Bloom – dedicada a jovens criadores da moda nacional – foi Darya Fessenko. Tem 26 anos e em cinco coordenados apresenta a sua interpretação do apocalipse em pleno século XXI. “Hoje em dia temos várias previsões, mas não temos nenhuma versão moderna de como seria o apocalipse e, de facto, muita coisa mudou. Pensei em criar várias personagens e cada uma corresponde aquilo que considero ser um pecado, não o pecado como o conhecemos no contexto bíblico”, começa por explicar ao Observador, minutos depois dos aplausos na passerelle.

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O primeiro coordenado do desfile é a personificação da figura da mitologia grega Pandora, o cinza e o prateado saltam à vista em armações nas botas de cano alto e em detalhes de alumínio numa espécie de luva. O segundo representa o canibalismo e com ele a crítica explicita a quem consome carne. “Num sobretudo vemos micas de plástico a imitar bolsos com várias caras, estes rostos foram moldados em barro e trabalhados com várias camadas de cola branca para fazer uma espécie de máscaras.”

Luxúria, guerra e morte foram os significados das sugestões que se seguiram, onde o vinil pintado à mão, os elementos gráficos, os acabamentos com laca e verniz ou o plástico, para dar um aspeto mais artificial a cada peça, reinam em casacos com ombros pontiagudos e calças com aberturas. Numa palete de tons que vai do preto ao branco, passando pelo vermelho e o verde tropa, a coleção de Dayra é marcada também pela própria maquilhagem, onde o aparentemente simples risco preto é usado para dar expressões diferentes a cada rosto.

MELISSA VIEIRA/ OBSERVADOR

Há dois anos, Diogo Van Der Sant apresentou a sua coleção de final de curso no Bloom, passou por Amesterdão e de regresso a Portugal pisou novamente a passerelle do Portugal Fashion. Na bagagem trouxe um trabalho criativo inspirado na obra da pintora Olga Albizu, natural de Porto Rico, com quem se cruzou por acaso na internet. “Sou sempre puxado para peças de arte que explorem esse lado mais abstrato, a partir dos quadros dela comecei a fazer transformações de vários materiais até chegar a este resultado”, afirma ao Observador a caminho do backstage.

A coleção começa com um coordenado branco total, que funciona como uma tela, e depois vai evoluindo na cor, passando pelo azul turquesa, o amarelo vivo, o cinza e o vermelho, crescendo também nas formas e nos volumes, essencialmente em vestidos e macacões. Os tecidos rígidos e estruturados são dead stocks de fábricas pintados e tingidos, pois para Diogo “o foco está sempre na cor”.

No calçado, na maquilhagem, nos ombros e até nos cabelos são visíveis pinceladas coloridas que transmitem o universo da pintura e do experimentalismo. “É uma mistura de tinta acrílica com silicone que dá algum relevo a este detalhe. Não gosto só de estampados, a textura é algo muito importante no meu trabalho”, sublinha o jovem designer.

Nos acessórios reinam os chapéus matiné e anéis muito originais. “Adoro os anos 50 e tenho uma paixão por chapéus desde miúdo, na coleção anterior apostei num modelo com abas enormes, mas este ano decidi fazer uma coisa mais subtil, simples e delicada ao mesmo tempo. Os anéis são basicamente blocos de tinta espalhada sobre plástico que depois aproveito para dar um apontamento de cor extra aos looks.”

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Sílvia Rocha, o nome por detrás da marca Ahcor, foi finalista do concurso Bloom em 2020 e nesta edição voltou a mostrar o que vale. A ideia para a coleção partiu da uma pergunta ouvida numa mesa de café: “afinal, o que é ser feminino?”. “Comecei a pensar na definição de masculino e feminino, nas características físicas que transmitem cada género e a questionar essa catalogação. Tinha urgência em abordar este assunto, mas trago perguntas e não respostas ou soluções, só quero que as pessoas se confrontem com isso também”, partilha ao Observador, acrescentando que esta é a primeira vez que traz as questões de género para cima da passerelle.

A liberdade de se ser quem é, sem medo da rejeição, foi outro aspeto que a designer quis explorar numa peça enigmática e cheia de significado que abriu o desfile. “É uma espécie de capacete em tecido, onde só os olhos são visíveis, que nos protege do preconceito e que nos permite tapar, esconder e usar como capa, aquela capa que muita gente nos impõe.” Em vestidos, macacões e calças há sobreposições de peças, mangas com folhos, drapeados, transparências e botões que se tornam protagonistas.

Numa palete de cores que varia entre o laranja, os azuis e os verdes, chamam a atenção materiais clássicos, como fazendas com padrões jacquard menos tradicionais, malhas, rendas e até veludos. “Queria muito ter pelo, encontrei este com um animal print, que usei em punhos e bainhas, e transportam-me para sítios livres e exóticos”, acrescenta Sílvia Rocha, enquanto arruma o charriot nos bastidores.

MELISSA VIEIRA/ OBSERVADOR

Ainda entre os cumprimentos da família e as fotografias com o sorriso aberto após o desfile, está Vítor Dias, de 27 anos. O designer da Famalicão trabalha desde os 18 anos nesta área e vive agora um momento de validação. “Comecei por fazer vestidos de noiva na minha garagem, mas depois fartei-me da onda mais cerimonial e apostei no streetwear, que é aquilo que mais consumo. Hoje é um culminar de oito anos de muito trabalho, sinto que há uma validação do meu trabalho depois de ouvir tantos nãos e isso traz-me mais confiança.”

O mote para a sua mais recente coleção partiu da forma como os relacionamentos amorosos surgem e se desenvolvem nesta era digital. “É uma sátira e uma crítica à forma como nos relacionamos em sites de engate, um retrato de toda essa facilidade. Hoje há uma expectativa em relação ao outro, mas é tudo muito visual e carnal, tudo se resume a uma imagem.” Há fivelas com fitas negras que dão movimento e remetem para o sadomasoquismo, transparências e aberturas nas costas que transmitem o lado mais sensual e sexual da marca e um estampado animal print desenhado pelo criador. “É um padrão que faz lembrar a pele da vaca, porque na internet somos vacas à espera de sermos consumidas.”

MELISSA VIEIRA/ OBSERVADOR

Em bombers, coletes, calções e t-shirts o sportswear mistura-se com detalhes clássicos, presentes tanto no fitting como na escolha dos materiais. “Optei por sedas, algodões orgânicos, poliéster a imitar tules e alguns detalhes em pele de vaca usadas para consumo. Tentei dar um aspeto confortável com esta seleção de tecidos, até porque na maioria das vezes no digital estamos em casa, bem confortáveis e a encarnar uma personagem. A sua marca homónima é de slow fashion, funciona apenas por encomenda e estão à venda online e em espaços físicos no Porto, na loja Scar.Id, e na Corunha, em Espanha.

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