Foram cerca de 2000 os convidados que compareceram, no passado 19 de setembro, ao elaborado funeral de Estado da rainha Isabel II. Os ensaios foram mais do que muitos e não aconteceram por acaso: os organizadores sabem que os imprevistos acontecem — a História confirma-o — de maneira que, de forma a evitar contratempos, o dia do enterro é apenas o culminar de um processo que já vai sendo ensaiado há tempo suficiente para que tudo corra sobre rodas.

O funeral de Isabel II decorreu, assim, placidamente. Mas não deixou de ter o seu momento, no mínimo original: além dos dois milhares de presentes, uma aranha foi avistada no interior do caixão da Rainha, deambulando sobre um bilhete estrategicamente colocado nos arranjos florais, ao lado da coroa. A nota, assinada por Carlos III, dizia: “Em memória amorosa e dedicada. Carlos R.”. O aracnídeo acabou por desaparecer de vista, talvez de regresso ao bouquet de onde surgira.“A aranha mais famosa do mundo agora”, podia-se ler num tweet.

Embora uma aranha num caixão não faça mossa, nem todas as exéquias estatais passadas ocorreram sem grandes adversidades.

Rainha Vitória do Reino Unido (1837-1901)

Deixar-se instruções acerca do próprio enterro era prática comum na época, e a rainha Vitória não foi exceção. Na verdade, a monarca deixou um detalhado manual de 12 páginas. Conhecida pelas suas excentricidades, os seus últimos desejos não espantaram os demais.

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Começou por solicitar que o seu funeral tivesse o tema branco em vez do tradicional preto. Foi, assim, enterrada com um vestido branco e um véu de noiva. Historiadores interpretaram-no como uma ode ao casamento, mas também um sinal da sua dor não resolvida face a perda do marido. A seu pedido foram colocadas várias fotografias e objetos da sua numerosa família. Uma das camisas de dormir do príncipe Alberto, o seu falecido marido, foi posta junto de si. Embora se acredite que a rainha Vitória tenha tido um romance com John Brown, esta era extremamente devota do marido que morreu 40 anos antes de si. Um dos itens que levou consigo para o caixão foi um molde de gesso da mão de Alberto.

Para completar o misterioso funeral, a Rainha foi enterrada com uma aliança em cada mão: uma correspondia ao seu casamento com o príncipe Alberto; a outra, reza a História, pertenceria a John Brown.

Para terminar “em beleza”: durante o funeral, uma lasca da carruagem de armas, onde o caixão era transportado, partiu-se, fazendo com que um cavalo disparasse. A Marinha Real interveio e arrastou o caixão com cordas.

Guilherme I (1066-1087)

Geralmente apelidado de “o Conquistador” e algumas vezes de “o Bastardo”, Guilherme não era um rei muito amado pelo seu povo. À data da sua morte, todos os seus serviçais o abandonaram, deixando-o sozinho e sem ninguém que pudesse organizar o seu enterro.

O corpo de Guilherme ficou durante um curto período de tempo num centro médico, na cidade onde morreu, até ser decidido o seu enterro. Devido à demora, boa parte do cadáver já se encontrava em decomposição, mas tal não impediu que a missão prosseguisse. O corpo, porém, inchado de tanto esperar, não cabia dentro do sarcófago que havia sido construído para si. Tentativas de forçar o encaixe fizeram com que este explodisse, deixando a pairar no ar um odor insuportável durante o resto da cerimónia fúnebre.

Para a historiadora da Universidade de Glasgow, Miriam Bibby, esta narrativa tem um lado exagerado. Ainda assim, Miriam corroba que é, sim, possível que o corpo tenha deixado um cheiro desagradável, uma vez que demorou tanto tempo a ser enterrado. Nas palavras do cronista inglês, Orderic Vitalis, “as entranhas inchadas estouraram e um fedor intolerável atingiu as narinas dos espectadores e de toda a multidão”.