O governador do Banco de Portugal disse esta terça-feira que espera que “nos próximos tempos se reflita” nos custos das comissões bancárias o facto de as taxas de juro já não estarem em níveis tão baixos (ou negativos). Mário Centeno argumentou, no parlamento, que a banca é um setor que tem de “prestar contas” aos seus acionistas e têm de ser rentáveis – mas diz que, como o setor trabalha “em concorrência”, é expectável que os bancos possam baixar os custos cobrados aos clientes.

“A banca é um setor que é regulado, que está em concorrência, mas tem de prestar contas”, disse Centeno, “devemos ser muito exigentes com o setor mas não podemos querer que o setor possa, por algum motivo, passar por dificuldades como as que passou há pouco tempo”. Lembrando que “os bancos no mundo inteiro tiveram de rever o seu plano de negócios por causa do período muito longo de taxas de juro”, agora o cenário é diferente: os juros estão a subir pelo que há uma menor necessidade por parte do bancos de obter rentabilidade através das comissões.

Espero que isso se reflita nos próximos tempos“, atirou Centeno, que já tinha usado o mesmo tipo de argumentação no tópico da subida da remuneração dos depósitos.

Centeno voltou a falar sobre os depósitos e sobre o ritmo de subida das taxas. O governador lembra que quando as taxas de juro eram negativas, os bancos nunca cobraram taxas de juro negativas em Portugal (algo que aconteceu noutros países). “Temos de ter paciência mas não podemos deixar de fazer pressão” para que os bancos aumentem as taxas dos depósitos, afirmou Centeno, notando que “já há depósitos que pagam mais de 1% para novos clientes em alguns bancos, novos clientes que é sempre por onde começa a mudança dos ciclos”.

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A subida dos juros dos depósitos “é um processo que está em curso e que gostaríamos que continuasse”, concluiu o governador do Banco de Portugal.

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Mário Centeno comentou ainda que, devido à inflação, o BCE teve de subir as taxas de juro num tempo muito curto. “O importante é que o fenómeno de redução da inflação nos últimos três meses possa materializar-se nos próximos meses, trazendo a inflação para perto de 3% no final de 2023 e que no horizonte de 2025 possamos ter novamente ter taxas de 2%, que é o objetivo do BCE”, antecipou Centeno.

Estamos a aproximar-nos do final do processo de aumento das taxas de juro“, confia Mário Centeno, antecipando alguma volatilidade nos dados da inflação na Europa no início deste ano (porque há certos aumentos que acontecem no início do ano e que são indexados à inflação do ano anterior). Porém, a partir de março, depois desse efeito técnico, o governador do Banco de Portugal antecipa que a inflação continuará o caminho de normalização.

A declaração de Centeno contrasta com aquilo que foi dito por um outro membro do Conselho do BCE, o holandês Klaas Knot, que disse que o BCE ainda vai “a meio do caminho” na trajetória de subida dos juros.

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Mário Centeno comentou, porém, que embora não tenha ainda os dados mais atualizados o que se verificou em 2021 é que dois terços dos processos PARI – de prevenção de incumprimento em crédito – acabam por ser encerrados por inexistência de risco de incumprimento. “O número de incumprimentos continua a ser residual”, afirmou o governador do Banco de Portugal.

Questionado sobre o impacto da subida das taxas de juro e das prestações de crédito e considerou que a generalidade das famílias “tem condições para continuar a suportar estes encargos adicionais enquanto a situação do mercado de trabalho permanecer como hoje”.

O PCP perguntou a Centeno se sensibilizou os colegas do Conselho do BCE sobre o peso maior em Portugal dos empréstimos em taxa variável, Mário Centeno lembrou que durante os anos dos juros negativos os países onde há mais taxa fixa não “aproveitaram” tanto como os portugueses.

O governador do Banco de Portugal afirmou, também, que agora tem subido “bastante” o número de contratos de taxa fixa no crédito. “Se são contratos em condições vantajosas ou não, é outra dimensão, mas pelo menos o número tem vindo a subir bastante”, atirou Centeno.

Livro sobre Carlos Costa “passa ao lado da verdade”

Mário Centeno foi, também, questionado sobre o livro “O Governador”, de Luís Rosa, sobre Carlos Costa. Centeno diz que nas “páginas e nos parágrafos em que o meu nome aparece, nalgumas em associação ao Bloco de Esquerda, o livro passa ao lado da verdade, infelizmente”.

“Mas pouco mais posso dizer porque não sei quais foram as motivações do jornalista que escreveu o livro e não gosto de comentar obras de jornalismo”, terminou Centeno.