A petrolífera norte-americana ExxonMobil tinha em mãos projeções feitas nos anos 70 e 80 que previam o aumento da temperatura global devido a emissões de gases de estufa e não só não fez nada para o impedir, como ocultou as informações durante as últimas décadas.
Esta não é a primeira vez que a petrolífera se é investigada por causa de pesquisas feitas no passado. Em 2015, uma investigação da Inside Climate News expôs os estudos levados a cabo pela empresa a partir da década de 1970, onde se conclui que a ExxonMobil tinha conhecimento sobre o perigo das alterações climáticas e a relação entre o dióxido de carbono e o aquecimento global.
Porém, agora a revista Science vai mais longe, deixando duas questões bem claras: as investigações dos cientistas contratados pela petrolífera norte-americana têm uma qualidade equivalente às de universidades e do próprio governo; e a ExxonMobil tentou negar as conclusões ou, pelo menos, escondê-las.
Os dados não deixam dúvidas: 63 a 83% das projeções feitas pela empresa previam que o aquecimento da temperatura do planeta nos anos seguintes — os cientistas calculavam um aumento de 0,2 graus a cada década (um número muito perto dos 0,19 graus comunicados por investigações de alguns dos principais especialistas em clima).
As conclusões de um aumento da temperatura global não só se vieram a confirmar como se percebeu que a petrolífera sabia tanto ou mais do que os cientistas especialistas no tema e contratados por organizações e governos — tendo em conta que as projeções destes alcançaram uma taxa de sucesso entre os 28 e 0s 81%. Algumas das mais conhecidas pesquisas da ExxonMobil para medir o cenário climático global tinham uma precisão de 70% (alguns estudos chegaram mesmo aos 99% de acerto), enquanto a NASA por exemplo se ficava por números entre os 38 e os 66%.
Geoffrey Supran, físico e professor da Universidade de Miami, explica que a ExxonMobil tinha recursos financeiros para produzir pesquisas de qualidade, mas sublinha que a empresa utilizava as conclusões para acumular conhecimento científico capaz de prever o futuro, mas apenas para benefício económico da empresa e não para atuar de forma a combater o aquecimento global.
Enquanto as organizações ambientais, alguns países e responsáveis políticos tentaram implementar campanhas universais para comunicar as conclusões e travar o fenómeno, a empresa norte-americana optava por negá-lo, tentando até contrariar o aquecimento global e as suas consequências.
O relatório que inclui investigadores da Universidade de Miami, da Universidade de Potsdam e da Universidade de Harvard analisou 32 documentos produzidos pela ExxonMobil entre 1977 e 2002 e 72 artigos publicados em revistas científicas ou com colaboração de funcionários da empresa entre 1982 e 2014.
“A empresa ficou em silêncio o máximo tempo que pode, durante a década de 1980, e apenas no final de 1988 e 1989, quando o aquecimento global encheu as manchetes de todo o mundo, percebeu que se tratava de um momento crítico e que era preciso dizer alguma coisa. Infelizmente, escolheram atacar os cientistas em vez de contribuir para uma energia limpa“, esclareceu Geoffrey Supran, um dos especialistas que assina o relatório.
Os especialistas consideram que nos últimos 30 anos a ExxonMobil podia ter “agido para reduzir emissões”, o que permitiria que o combate ao aquecimento global fosse hoje menos desafiante. “Escolheram contribuir para nos levar em direção a uma crise climática. Hoje, para reduzir as emissões, estamos diante um enorme precipício”.