A contestação ao governo israelita continua a aumentar, com os militares israelitas a aliarem-se aos manifestantes. Dezenas de reservistas da Força Aérea do país anunciaram no domingo que iriam faltar aos exercícios militares marcados para esta semana, em protesto contra o que descrevem como um “regime ditatorial” chefiado por Benjain Netanyahu.

Em causa está a proposta de reformas no sistema de Justiça da coligação chefiada por Netanyahu (o governo mais à direita da história de Israel), que prevê limitações ao poder judicial — em concreto, o plano prevê que o parlamento poderia, através de maioria simples, anular as decisões do Supremo Tribunal que revogassem a legislação do governo.

Especialistas judeus e árabes têm vindo a alertar que a proposta daria a Netanyahu o poder para “passar por cima” dos tribunais e colocar em prática políticas radicais, visando sobretudo minorias étnicas, ao mesmo tempo facilitando a anexação da Cisjordânia.

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Numa carta aberta enviada à comunicação social israelita, 37 pilotos e navegadores da Força Aérea revelaram que não iriam comparecer aos exercícios, marcados para esta quarta-feira. “Vamos dedicar o nosso tempo ao diálogo e à reflexão, para bem da democracia e da unidade nacional”, pode ler-se.

A posição manifestada é significativa uma vez que, tradicionalmente, os militares israelitas mantêm-se fora da esfera política. Uma vez que as forças de Defesa do país são compostas, sobretudo, por reservistas, a realização de exercícios de treino regulares é fundamental para garantir que estes se mantêm prontos a ser chamados. A recusa em treinar tem ainda gerado preocupação junto dos responsáveis pela segurança de Israel, que temem um aumento nos incidentes de insubordinação e recusa em acatar ordens.

O governo já se pronunciou sobre o caso, criticando a posição dos reservistas. Nas redes sociais, Netanyahu, ele próprio um ex-militar, publicou uma fotografia da sua identificação como antigo membro das forças armadas, acompanhada da legenda: “Quando somos chamados para o serviço de reserva, aparecemos sempre. Somos uma só nação”. Numa cerimónia na segunda-feira, o primeiro-ministro israelita foi mais longe ao considerar que os reservistas que se recusem a aparecer representam “um perigo existencial”.

Em sentido inverso, o ministro das Finanças descalorizou o caso. Citado pela Reuters, Bezalel Smotrich apontou o dedo aos meios de comunicação. “Os irresponsáveis media israelitas dão demasiado destaque a qualquer reservista que manifeste uma posição”, afirmou.

A carta dos reservistas da Força Aérea surge numa altura em que uma onda de protestos ameaça varrer o país contra as medidas propostas pelo governo. No sábado, dezenas de milhares de pessoas manifestaram-se em Telavive, num protesto que contou com a presença dos líderes da oposição.

Ao jornal britânico The Guardian, Dan Meridor, antigo ministro da Justiça durante o governo de Yitzhak Shamir (1988-1992), alertou que “se eles forem bem sucedidos, será um sistema diferente, uma Israel diferente”, alertando que o sistema de justiça no país é um contrapeso importante ao poder legislativo num país que não tem uma Constituição. No jornal israelita Haaretz, o jornalista Gidi Weitz vai mais longe: “Se estes passos forem concluídos, teremos em Israel uma mudança governativa, de uma democracia parcial para um regime autoritário.”

Dezenas de milhares protestam em Israel contra reforma judicial