Pep Guardiola, quando questionado sobre as razões do seu sucesso e o que deviam os treinadores menos experientes fazer para obterem bons resultados, respondeu: “Tenham bons jogadores. Tive o Messi no passado, tenho o Haaland agora. Esse é o meu sucesso. Não é uma piada, é verdade”.

Os nomes enunciados foram os das espécies mais raras de futebolistas. No entanto, há outros que, maquilhados com algumas indicações e posicionamentos diferenciados podem fazer as vezes dos galácticos quando estes se escondem a uma distância medida a anos-luz mesmo quando é dia de serem estrelas. Pegando no exemplo dado por Guardiola, Haaland não fez, na final da Liga dos Campeões, contra o Inter, o jogo da sua vida, como, aliás, também não o fizeram os mais criativos do Manchester City. Não podendo pintar óleo sobre tela, que se pinte guache sobre cartão, desde que no fim se perceba que está ali desenhado o que todos querem: a taça.

O treinador espanhol do City tinha avisado que as equipas italianas se sentem a ganhar quando o resultado é de 0-0 e, por isso, o estilo defensivo do Inter ia obrigar os citizens a procurarem soluções diferentes na construção de jogo. O anúncio do onze inicial da equipa de Manchester dava logo a entender que vinha lá algo especial.

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O City iniciou o jogo com quatro centrais de raiz na defesa: Stones, Akanji, Rúben Dias e Aké. Era de esperar que as dinâmicas fossem distintas daquelas que normalmente utilizam as equipas com laterais tradicionais. Stones estava encarregue do lado direito do setor defensivo quando o conjunto de Guardiola não tinha a bola, salvaguardado também pelo empenhado contributo defensivo de Bernardo Silva, tão necessário para conter Dimarco.

Rodri tirou a camisola dos calções para mostrar que era o dia de a esperança vencer a história (a crónica da final da Liga dos Campeões)

Com a posse de bola, Stones ganhava outra vida. O City optava por construir a três com Akanji, Rúben Dias e Aké. Deste modo, o jogador inglês juntava-se aos médios, Rodri, Gundogan e De Bruyne, os extremos, Bernardo e Grealish, permaneciam abertos no corredor, garantindo largura, e Haaland fixava a linha defensiva. Aquele que, à partida, era um terreno pouco natural Stones acabou por se revelar um espaço que o City conseguiu explorar.

Pelo facto de não ser comum um lateral realizar incursões interiores, o Inter teve alguns problemas retirar a posse ao City. Mérito para Stones que, em espaços reduzidos, onde jogadores com o seu tamanho e envergadura, normalmente revelam dificuldades técnicas, conseguiu ser uma mais-valia, recebendo orientado e, se necessário, carregando jogo para o último terço.

Só pela sua presença no miolo, o Inter teve que tomar decisões defensivas que nem sempre foram coordenadas. Por exemplo, viu-se Bastoni a saltar na pressão a Stones (na teoria, um central a marcar um lateral), o que podia ter complicado a vida ao setor defensivo dos italianos. Ao mesmo tempo, o City conseguiu causar muitas dúvidas à primeira linha de pressão do Inter, composta por Dzeko e Lautaro, que normalmente é bastante incómoda para os adversários. Só que a dupla de avançados via-se confrontada com um dilema: o City tinha superioridade na primeira fase de construção (três para dois) e também na segunda, visto que Stones, Rodri, Gundogan e De Bruyne estavam à responsabilidade de apenas três jogadores (Brozovic, Çalhanoglu e Barella).

Assim, Dzeko e Lautaro, ficavam na dúvida se saltavam na pressão aos centrais ou se aproximavam do setor intermédio, o que ficou visto no golo do City (já com Lukaku a fazer o papel de Dzeko) quando Akanji progrediu no terreno e desmarcou Bernardo Silva com um grande passe, demonstrando que o nerazzurri falharam em empurrar o jogo do adversário para os corredores exteriores.

No final do encontro, Stones revelou-se satisfeito com a conquista da Liga dos Campeões por parte do City. “É um prazer ser parte desta equipa e criar esta história. É a segunda vez que alguém consegue um treble [em Inglaterra], ambos merecidos, em duas eras diferentes e os dois muito especiais”, disse no relvado. “Hoje, joguei mais como número 8, o que adoro fazer. Ainda estou a aprender”.