O Tribunal Administrativo do Desporto espanhol instaurou um processo disciplinar contra Luis Rubiales por infrações graves cometidas pelo presidente da Real Federação Espanhola de Futebol (RFEF) no caso do beijo entre o dirigente desportivo espanhol e Jenni Hermoso.

A decisão do TAD é a resposta à queixa interposta pelo governo espanhol, através do Conselho Superior do Desporto (CSD), contra o comportamento do dirigente, quer no momento em que beijou Hermoso sem o seu consentimento, quer na bancada do estádio de Sydney quando (ao lado da rainha Letizia de Espanha) agarrou os próprios genitais para celebrar a vitória da seleção espanhola na final do Campeonato do Mundo.

O parecer do tribunal é, no entanto, uma vitória parcial para Rubiales, já que o nível de “infração grave” não permite ao Conselho Superior do Desporto (CSD) decretar a suspensão provisória do cargo — para que isso acontecesse, o TAD tinha de enquadrar o comportamento de Rubiales como uma infração “muito grave”. De igual modo, a autoridade desportiva não entendeu que o comportamento do presidente da RFEF configurasse abuso de autoridade, rejeitando assim a tese defendida pelo governo espanhol.

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O processo instaurado contempla assim duas infrações contra o decoro, podendo levar à suspensão de Luis Rubiales de exercer cargos desportivos por um período máximo de dois anos, de acordo com o El Mundo.

Contas feitas, a única medida punitiva de que o dirigente desportivo é alvo neste momento continua a ser só a da FIFA, que decretou a sua suspensão provisória durante 90 dias; no entanto, caso o órgão que tutela o futebol mundial decida levantar a suspensão, ou esta termine sem uma resolução do processo disciplinar em Espanha, o dirigente de 46 anos poderá voltar ao cargo, pelo menos temporariamente.

Rubiales quebra silêncio e acusa governo de estar a “pressionar” justiça

Minutos depois de conhecido o parecer do TAD sobre a acusação do governo espanhol, o ministro do Cultura e Desporto, Miquel Iceta, afirmou que o CSD irá intervir junto do tribunal para instar aquele órgão administrativo a aplicar a Lei do Desporto e suspender Luis Rubiales das suas funções à frente RFEF, de forma temporária e até à conclusão do processo.

Acabou. Já o disse o governo, disse-o a FIFA, disseram-no as jogadores e os presidentes regionais do futebol, disse-o a opinião pública… não podemos permitir este abuso de poder, nem que haja esta falta de respeito”, disse o responsável espanhol.

Iceta deixou claro que a tutela aceitará a decisão do TAD, e confirmou que se mantém em contacto com a FIFA sobre o caso. Em todo o caso, instou “todos os decisores do desporto” a trabalhar para evitar comportamentos como os de Rubiales no futuro. “Peço uma reação a todas as estruturas do desporto do nosso país. Podem fazer muito para que a igualdade avance”, disse o ministro.

Face às declarações do ministro, Luis Rubiales quebrou o silêncio e, num comunicado enviado pelo próprio às redações espanhola, criticou o governo que, diz, não está a agir em conformidade com o princípio da separação de poderes, estando antes a mover uma campanha contra si.

Preocupa-me particularmente que alguns daqueles que devem proclamar e contribuir para garantir a separação de poderes no nosso país estejam empenhados em tomar partidos e fazer pressão contra mim, ao invés de deixar a justiça atuar com todas as garantias, mantendo-se à margem”, pode ler-se no comunicado, publicado na íntegra pelo El Mundo.

Ainda que reconhecendo ter “cometido alguns erros evidentes”, dos quais diz estar “sinceramente” arrependido, Rubiales manteve no comunicado que o beijo polémico foi “mútuo e consentido” (algo que Jenni Hermoso, a outra parte envolvida, já veio negar), fruto de um “momento histórico de espontaneidade e felicidade” que foi a conquista do Campeonato do Mundo.

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Sobre o coro de críticas de que tem sido alvo, quer do mundo desportivo quer da sociedade civil, o presidente da RFEF caracterizou-o como um “linchamento político e mediático” internacional, e disse que sente o apoio das pessoas nas ruas e nas redes sociais. “Sinto que algo mudou e, perante esta injustiça e juízo público tão fabricado, homens e mulheres uniram-se por igual. (…) Este é o momento de lhes agradecer infinitamente pelo seu imenso apoio, por acreditarem em mim e por não se deixarem levar por esta campanha montada contra mim”.

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Um dos maiores pontos de inflexão na polémica em torno do dirigente foi o seu discurso durante a Assembleia Geral extraordinária da RFEF. Aquilo que todos antecipavam como um discurso de demissão acabou por se revelar um desafio, com Luis Rubiales a recusar demitir-se perante um coro de aplausos.

Entre estas vozes de apoio estava, nesse dia, o selecionador masculino espanhol, Luis de la Fuente. O técnico, que esta sexta-feira de manhã anunciou a convocatória da seleção espanhola para os jogos contra a Geórgia e o Chipre, de qualificação para o Campeonato Europeu do próximo ano, aproveitou a ocasião para fazer um mea culpa e, perante a comunicação social, pedir desculpa por ter aplaudido o discurso de Rubiales.

“Quero dizer que tenho recebido críticas, e que as críticas que tenho recebido são totalmente merecidas. Lamento o que fiz e peço perdão por tê-lo feito”, disse o selecionador, logo no início da conferência de imprensa. “Não me reconheço naquelas imagens”, acrescentou De La Fuente, ao mesmo tempo que ofereceu como possível explicação o facto de, como os restantes presentes na assembleia, estar à espera de um discurso de demissão:

Fiquei em branco, foi uma situação que me ultrapassou. É injustificável aquilo que fiz. Sempre estive do lado da igualdade, e claro que nem Jenni Hermoso nem as suas companheiras são responsáveis pelo que ali se passou”.

De La Fuente não foi o único selecionador a pronunciar-se sobre a polémica esta sexta-feira. O também espanhol Roberto Martínez, treinador da Seleção Nacional, também foi questionado sobre o tema após o anúncio da convocatória de Portugal para os jogos de apuramento contra Eslováquia e Luxemburgo.

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“Cargos públicos e importantes têm responsabilidades importantes. Precisamos de ter uma conduta exemplar e isso não aconteceu”, reconheceu o técnico à margem do anúncio da convocatória.

Já sobre se a polémica em torno de Rubiales afetaria de alguma forma a candidatura tripartida Espanha-Portugal-Marrocos para a organização do Mundial de 2030, o técnico rejeitou a ideia. “A candidatura ibérica é um processo que tem sido trabalhado, são muitas horas de trabalho, uma candidatura que está acima de qualquer pessoa. Não é um momento que uma pessoa pode dificultar. Este momento é muito forte e esperamos que possamos ter sucesso”, afirmou.

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