– O que quer passar ao certo com isto?
– Só quero que ela [Jenni Hermoso] diga a verdade, o meu filho é uma pessoa honrada.
E por quanto tempo vai continuar a greve de fome?
Até que o meu corpo aguente…
Ángeles, conseguiu falar hoje com o seu filho?
Não, não. Nada.
Mas o que lhe tinha dito antes?
Que está preocupado.
Está disposta a chegar até ao final com a greve de fome?
Sim, até que o meu corpo aguente

Mãe de Luis Rubiales está em greve de fome até que termine a “caça desumana e sangrenta” ao filho

Começa a haver uma história à parte de todas as histórias do caso Rubiales uma semana e meia depois da conquista do primeiro Campeonato do Mundo feminino de sempre pela Espanha que foi em larga medida resumida ao que se passou após o apito final no Estádio Olímpico de Sidney. Essa história tem como grande epicentro Granada, terra do ex-presidente da Real Federação Espanhola de Futebol, mais concretamente a localidade de Motril que se vai dividindo entre as manifestações de apoio a Rubiales e as várias pinturas nas paredes contra o dirigente. E, claro, ainda há a Igreja da Divina Pastora de Motril, onde a mãe do ex-jogador, Ángeles Bejar, cumpria o terceiro dia de greve de fome. Esta manhã, voltou a falar aos jornalistas; horas depois, o padre da igreja revelou aos jornalistas que Bejar foi transportada de urgência para o hospital, fruto de “uma crise” de saúde.

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Olhar para aquilo que se passa nos arredores daquela pequena igreja é quase considerar que alguma medida poderá sair dali, num ato de fé ou por obra do divino. No meio da confusão, a Polícia Nacional foi chamada ao local para evitar incidentes as dezenas e dezenas de pessoas que aproveitaram a abertura de portas para celebrarem a missa com um olho em todo o circo mediático montado em redor. A justificação também é fácil de perceber: as portas abriram, os jornalistas entraram, as pessoas não gostaram, a cerimónia foi mesmo interrompida e as autoridades vieram quase de forma preventiva esvaziar a pressão que se começava a sentir no ar. No entanto, e enquanto essa história se vai desenrolando, o caso ganhou novos capítulos. E capítulos que têm mais uma vez Luis Rubiales como “queixoso” mas também como “acusado”.

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Por um lado, o ElDiario.es avançou esta manhã que Luis Rubiales enviou à FIFA o vídeo partilhado na última noite de terça-feira do autocarro da seleção espanhola após a conquista do Mundial, onde é visível que Jenni Hermoso fala da situação com as companheiras comparando com o que acontecera em 2010 entre Casillas e Sara Carbonero entre outras referências ao beijo do agora ex-presidente. “Beijo, beijo, beijo” e “Presi, presi, presi” são alguns dos cânticos que se ouvem. O objetivo do antigo líder passa por reforçar a sua defesa no processo que culminou em primeira instância com a suspensão preventiva por 90 dias do cargo.

[Já saiu: pode ouvir aqui o quarto episódio da série em podcast “Um Espião no Kremlin”, a história escondida de como Putin montou uma teia de poder e guerra. Pode ainda ouvir o primeiro episódio aqui, o segundo episódio aqui e o terceiro episódio aqui.]

Num outro plano, o antigo árbitro Xavier Estrada Fernández apresentou esta quarta-feira uma denúncia ao Conselho Superior de Desportos de Espanha contra Luis Rubiales, Andreu Camps (secretário técnico da RFEF), Velasco Carballo (presidente da Comité Técnico de Árbitros até 2021) e Medina Cantalejo (que chegou ao Comité Técnico de Árbitros a partir dessa data). O catalão, num documento a que a Marca teve acesso, acusa os quatro envolvidos de utilização incorreta de fundos privados, falando em incumprimento por parte da RFEF do acordo de retribuição da arbitragem profissional que tinha sido feito em agosto de 2018 com a Liga. De acordo com as contas de Estrada Fernández, o montante que acabou por não ser pago como devido aos árbitros da 1.ª e 2.ª Ligas espanholas foi de quase dois milhões de euros.

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Entretanto, continuam a cair reações a toda a polémica, a mais agressiva por parte de Javier Tebas, líder da La Liga que tinha há muito Rubiales como um “inimigo”. “É indigno coagir as jogadoras da seleção, colocar o foco nelas ou na sua reação a quente. Elas não são culpadas da imagem de Espanha dada por Rubiales. Nenhum oportunismo ou hipocrisia política justifica que a imagem de Espanha tenha sido representada por um energúmeno a tocar-se nos genitais, a forçar beijos, a carregar jogadoras como um saco e a tocar na rainha de forma inapropriada num momento tão importante. Não é uma questão de esquerdas ou direitas, o Rubiales não beliscou com a sua atitude apenas a dignidade da Jenni Hermoso mas também a de Espanha”, voltou a escrever o dirigente espanhol na sua conta oficial do X, antigo Twitter.

“Quando assumimos determinadas funções na nossa vida, temos de assumi-las com a capacidade de perceber que, em determinados momentos, não podemos praticar determinados atos. Acho que as pessoas devem tirar consequências do que fazem. Mesmo em momentos de êxtase, não nos é permitido tudo”, comentou Pedro Proença esta quarta-feira, à margem da entrega de uma certificação da Sport Integrity Global Aliance (SIGA) em matéria de boa governança no desporto, nas instalações da Liga, em Oeiras.

Também Irene Montero, ministra da Igualdade em funções, voltou a abordar o tema agora à TVE. “Como se pode reparar que te tenham impedido de desfrutar de algo tão importante na tua carreira profissional e na tua vida como ganhar um Mundial? Todos os que aplaudiram aquela intervenção de Luis Rubiales não se inteiraram de que a sociedade mudou de uma forma profunda e que o que até agora parecia normal e invisível como os beijos não consentidos e as formas de violência sexual acabaram”, defendeu. De forma mais sucinta, e após a vitória na primeira ronda do US Open frente a Dominik Koepfer (que desistiu), Carlos Alcaraz também abordou o tema: “Segui o tema. Deu muito que falar e chegou até aqui, o que mostra o quão grande se tornou. São atitudes que um alto cargo não pode mostrar”, resumiu o tenista.

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Assim, e quando todas as atenções se voltam a centrar na Igreja da Divina Pastora de Motril (pelo menos enquanto não há mais novidades sobre todo este tema), surge também a notícia de que o Grupo Municipal Socialista de Madrid vai propor na próxima reunião que o Centro Desportivo Antiguo Canódromo, em Carabanchel, ganhe o nome de Jennifer Hermoso. “Nasceu aqui, jogou aqui durante muito tempo e com apenas 12 anos deu o salto para o Atl. Madrid e depois para o Rayo Vallecano. Temos que lhe dar um reconhecimento, assim como foi feito a outros campeões do mundo como Pepu Hernández ou Vicente del Bosque”, justificou o porta-voz do grupo, Reyes Maroto. O encontro irá decorrer na próxima semana.