Tudo indicava que se avizinhava um fim de semana como qualquer outro. Desde dia 27 de agosto dezenas de milhares de pessoas desfrutavam o ambiente quente no Burning Man, um evento de música e arte que se assume contracorrente, singular — até mesmo onde é realizado, no deserto árido do Nevada, nos Estados Unidos — e que não deixa ninguém de parte.

A Black Rock City, “cidade temporária” onde decorrem as atividades, teve um final inesperado. As chuvas torrenciais na sexta-feira conjugadas com o terreno arenoso formaram lamas semelhantes a cimento. Isto deve-se à incapacidade da “argila do solo no deserto absorver água rapidamente, como acontece em solos férteis”, segundo Derek Van Dam, especialista de metereologia, citado CNN. E só esta segunda-feira foi autorizada a circulação de carros pelos participantes que, segundo foi relatado, foi de 70 mil e que tiveram de ficar no fim de semana retidos no acampamento.

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Com o tempo mais favorável na segunda-feira, e com a autorização da organização do evento, os participantes começaram a sair do deserto o que, devido ao número de pessoas, não se provou uma tarefa fácil. 

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Parte dos participantes no Burning Man começaram a sair do festival

O trânsito, que se formou das dezenas de milhares de pessoas que estiveram presas no deserto durante o fim de semana, ficou congestionado. Embora a organização do evento tivesse alertado para tal eventualidade — apontando na rede social X (antigo Twitter) que poderia levar sete horas ou mais para sair do local — algumas pessoas esperaram, mesmo, nas filas. Artistas famosos como o comediante Chris Rock ou o DJ Diplo, que estiveram no local, acabaram por sair mais cedo do festival graças à boleia de fãs.

Ainda assim, apesar de terem terminado as chuvas, os organizadores, citados pela BBC, alertaram que “a área do recinto ainda está enlameada” e que, devido ao êxodo em massa dos participantes, “pode ser difícil navegar nalguns bairros e em certas ruas”.

Quem vai ao Burning Man considera que tratá-lo como um festival não lhe faz justiça — nem o próprio evento se assume como tal — considerando-o, antes, um movimento cultural, global, inclusivo a todas as pessoas. Apesar do completo caos que se instalou devido às chuvas e às lamas, esse espírito, apontam alguns participantes, foi sentido por quem acampou nas areias do deserto.

Kaz Qamruddin, que aí esteve quando as chuvas torrenciais começaram a cair, contou à CNN que “pessoas em caravanas começaram a acolher alguns dos campistas, por isso toda a gente estava quente”. “Somos uma comunidade que se junta quando os tempos ficam difíceis, temos que trabalhar em equipa”, acrescentou.

Também Paul Reder, outro participante do evento, declarou à NBC que “há muitas pessoas simpáticas que estão a partilhar o que têm.”, incluindo comida e água, bens essenciais que se tornavam cada vez mais escassos.

Estima-se que as chuvas na região de Pershing County no Nevada, que costuma ser uma região árida ao longo do ano, sejam as piores desde que o festival começou há mais de 30 anos. Uma das consequências das condições metereológicas foi, mesmo, o encerramento temporário das casas de banho, uma vez que os serviços de manutenção não se conseguiam deslocar devido às estradas enlameadas.

“Não há chuveiros aqui. A única coisa que uma pessoa pode fazer é lavar-se com toalhitas para bebé na tenda“, contou Faye, uma das participantes, à BBC.

Como medida alternativa, alguns participantes, informa a BBC, optaram por oito quilómetros na lama até às estradas mais próximas, tentando alcançar povoações perto do recinto.

A lama tornou-se ao longo do fim de semana o “novo normal” e, com condições atmosféricas mais favoráveis, a queima de uma estátua de madeira gigante — o ponto final do evento, que lhe dá o nome –, que estava prevista para domingo acabou por acontecer segunda-feira perante cerca de 62.000 pessoas, que permaneceram no local e que se deslocaram ao centro do recinto para ver o fogo.

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Burning Man visto de cima

DigitalGlobe via Getty Images

Foi registada uma vítima mortal, nos dias do festival, mas os organizadores garantiram que o caso não estava relacionado com as condições meteorológicas.