Ela era Miss Sinaloa, ele um dos maiores traficantes do mundo. Uma jovem ingénua com 17 anos que aceitou o convite para partilhar a pista de dança com um “senhor” de 51. Uma história digna de um romance de Jane Austen, com um cenário ligeiramente diferente. Onde, em vez da verdura dos prados britânicos, reinava a escuridão das celas norte-americanas.

A metáfora não é escolhida ao acaso. Foi a própria Emma Coronel Aispuro quem comparou a sua história com Joaquín Guzmán, mais conhecido como El Chapo, a uma novela da autora britânica. E tudo começou num rancho em 2006.

Quando o líder da Cartel de Sinaloa lhe estendeu a mão, a jovem modelo de 17 anos não foi capaz de acenar com a cabeça. “Claro, respondi. Nos ranchos, mesmo quem tem um namorado precisa de dançar com todas as pessoas que a convidem”, disse numa entrevista ao canal Telemundo, a primeira que alguma vez deu.

O que Emma não sabia é que, ao estender a mão ao traficante de droga, estava também a fazê-lo a todos os seus negócios obscuros. Os quais sempre fez questão de negar publicamente, mesmo quando foi condenada a “acompanhá-lo” na vida na prisão.

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Conhecida como a Kardashian de Sinaloa, a terceira mulher de El Chapo foi condenada, em novembro de 2021, a três anos de prisão e quatro de condicional, pelos crimes de tráfico de droga e lavagem de dinheiro. No julgamento, foi ainda acusada de compactuar com a fuga “histórica” do marido da prisão, em 2015, através de um túnel aberto por baixo de um chuveiro.

Emma Coronel foi então transferida para o estabelecimento prisional Federal Medical Center, na cidade de Carswell, no estado do Texas, de onde saiu no passado dia 13 de setembro.

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Apesar do império criminal associado ao marido, condenado a prisão perpétua quando foi detido novamente, Emma sempre o declarou inocente. “É um homem bom. Não é violento, nem agressivo. Aliás, nunca o ouvi a dizer um palavrão”, disse à jornalista mexicana Anabel Hernandez, a primeira a quem concedeu uma entrevista.

Essa entrevista, aliás, foi a que colocou Emma diretamente nas luzes da ribalta. Quando a mulher insistiu que Joaquín Guzmán “não era um traficante” e que estava muito “apaixonada por ele”, acabou por conquistar muitas das pessoas que veneravam o traficante. Especialmente, por garantir era um “bom pai” para as suas duas filhas gémeas, María Joaquina e Emely, que deu à luz com apenas 22 anos, e para os outros quatro filhos, conhecidos como Los Chapitos, frutos de duas relações anteriores.

Ainda assim, não foi apenas a aliança no dedo que lhe deu a fama. Além das poses com “roupa provocadora” para as fotografias nas redes sociais, a sua participação no programa “Cartel Crew”, em 2019, onde se sentou à mesa com diversos descendentes de líderes de tráfico de droga e expôs os Los Chapitos por renegaram o pai, também lhe deu diversos louvores junto à Casa Branca, um episódio que descreveu à jornalista mexicana.

Esse ano, contudo, não foi apenas marcado pela sua estreia num programa de televisão, mas também pelo julgamento que denunciou todos os esquemas com o seu marido.

Em pleno tribunal, foram reveladas várias mensagens em código entre El Chapo e a sua mulher, intercetadas pelo FBI, que foram apresentadas como prova de que esta sempre soube dos negócios do marido. Nomeadamente, quando Emma referiu que a sua filha María Joaquina não tinha medo do historial do pai: “Vou presenteá-la com uma AK-47 [um tipo de espingarda], para que possa vir comigo”, escreveu o pai, num SMS trocado entre 2011 e 2012, quando estava fugido da polícia.

Nestas mensagens, o homem “dava-lhe instruções sobre como comunicar”, aconselhando-a a usar telemóveis Blackberry, devido à sua criptografia, como reporta o El País.

Numa outra troca de mensagens, a mulher confessou ter receio de que a polícia aparecesse em casa. “Tens uma arma?”, perguntou El Chapo. “Sim, uma tua, que me deste”, respondeu Emma. De seguida, o marido aconselhou-a a escondê-la e a seguir uma “vida normal”. Mas a sua vida já não tinha nada de “normal”.