Era para ser uma missão de 180 dias e uma falha técnica arrastou-a para os 371, um novo recorde norte-americano no espaço. Mais 66 dias e era quebrado também o recorde mundial. Mas o astronauta Frank Rubio não aguentava nem mais um segundo.

O astronauta da NASA, agência espacial norte-americana, regressou à Terra esta quarta-feira, juntamente com dois cosmonautas russos, Sergey Prokopyev e Dmitri Petelin. Além de ter aterrado no Dzhezkazgan, no Cazaquistão, com o peso do recorde norte-americano para o maior número de dias passados no espaço às costas, veio também com grandes saudades da família. “É ótimo estar em casa”, disse, depois se sair da cápsula, citado pelo The Guardian.

Para mim, abraçar a minha mulher e os meus filhos vai ser fundamental, como é óbvio. É nisso que me vou concentrar nos primeiro dias”, revelou numa conferência de imprensa na semana passada, citado pelo The New York Times.

Quando Frank Rubio, 47 anos, partiu, em setembro do ano passado, do Cosmódromo de Baikonur, a bordo da nave russa Soyus MS-22, esperava passar apenas seis meses no espaço. No entanto, a viagem estendeu-se devido a um percalço.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O seu regresso foi adiado, após a equipa de controlo ter identificado uma fuga do líquido de refrigeração, que podia provocar “temperaturas perigosamente altas no caminho de volta para a Terra”.

Desta forma, foi enviada uma nova cápsula, para que a tripulação regressasse em segurança. E esse atraso acabou por levá-la a quebrar o recorde norte-americano de 355 dias no espaço, estipulado pelo astronauta Mark Vande Hei. Já o mundial, de 437 dias, foi quebrado pelo cosmonauta russo Valeri Polyakov, nos anos 90.

“O impossível tornou-se possível”. Cápsula da NASA com amostras de asteroide já chegou à Terra

Apesar de orgulhoso, Rubio confessou que, se soubesse que a missão duraria tanto tempo, nunca tinha embarcado na nave. Desta forma, não tinha perdido grandes conquistas da família, como a conclusão do primeiro ano na academia naval dos Estados Unidos da América (EUA) pelo filho mais velho e começo de outro na academia militar de West Point.

“Se soubesse que ia perder esses acontecimentos importantes, tinha dito: ‘Obrigado, mas não obrigado'”, afirmou à CNN.

Esta foi a primeira viagem do astronauta, desde que foi selecionado pela NASA, em 2017, tendo feito uma distância de 253 quilómetros — equivalente a 328 voos de ida e volta para a Lua — e dado cerca de seis mil voltas à Terra.

A estadia prolongada dos tripulantes possibilitou “contribuições científicas inestimáveis”, nomeadamente para perceber “os efeitos que os voos longos têm nos seres humanos”, explicou Bill Nelson, administrador na NASA.

Falta de equilíbrio e perda de visão: a síndrome que afeta os astronautas que vão ao espaço

Antes da sua chegada, Franko Rubio disse ao programa de televisão norte-americano Good Morning America que teria de fazer exames médicos e que ainda ia demorar algum tempo a habituar-se à gravidade da Terra.

A este fenómeno dá-se o nome de Spaceflight Associated Neuro-ocular Syndrome (algo como Síndrome Neuro-ocular Associada a Viagens Espaciais, em português), traduzido pelas mudanças sentidas pelos astronautas nas suas missões ao espaço.

As mais comuns, verificadas por Jennifer Fogarty, chefe do departamento científico da Baylor College of Medicine’s Translational Research Institute for Space Health, são a dificuldade em manter o equilíbrio e andar, após passar muito tempo numa realidade com microgravidade.

À ABC News, a especialista disse que estas mudanças podem ocorrer logo nos primeiros dois meses da missão, sendo que, quanto maior esta for, também o será o tempo de recuperação. Por exemplo, viagens entre quatro a seis meses implicam cerca de dois a três dias para o corpo se voltar a habituar à Terra. No caso de Rubio, durará mais tempo.

Estas não são as únicas mudanças físicas. Alguns astronautas lidam com inchaço nos olhos e visão turva, pouco depois de chegarem ao planeta. Isto porque sofreram uma mudança na forma como o sangue circula no seu corpo.

As nossas veias têm válvulas para o sangue não fluir para trás quando estamos de pé. Mas, quando estamos num ambiente sem peso, há uma grande deslocação de fluidos do corpo para a cabeça”, explicou o Dr. Michael Decker, co-diretor do Centro de Fisiologia Aeroespacial da Faculdade de Medicina da Universidade Case Western Reserve.

Segundo o especialista, tal “pode efetivamente afetar o olho e levar a uma deficiência visual”. “Por vezes, quando os astronautas aterram, essa deficiência visual não desaparece”, acrescentou.

Os astronautas são ainda impactados psicologicamente pelo tempo passado numa cápsula espacial. Este período de isolamento pode levar a mudanças comportamentais, nomeadamente fadiga, stress e perda de sono.

Segundo Jennifer Fogarty, que é também a antiga chefe científica da NASA, tal também provoca mudanças no sistema imunitário, podendo dar origem a um stress crónico.