O espírito de chegar a “todos, todos, todos”, sublinhado pelo Papa Francisco durante vários momentos e discursos da Jornada Mundial da Juventude 2023, em Lisboa, continua a ressoar meses depois. Foi este sábado um dos pontos da homilia proferida por Américo Aguiar, que recebeu esta manhã das mãos do pontífice as insígnias cardinalícias e foi elevado a cardeal.

“Às vezes armamo-nos em santos mas nem batizados merecemos ser. Muitas vezes há irmãos com uma consciência tão profunda de serem pecadores que devíamos proclamá-los santos. E é este caminho que eu quero ajudar, dentro do possível, o nosso querido Papa Francisco. Este caminho da ternura, de todos, todos, todos. Inaugurarmos, não um tempo novo, porque sempre foi assim, o evangelho sempre foi para todos”, afirmou, citado pela agência Ecclesia, durante a homilia que preferiu na primeira missa enquanto cardeal, na Igreja de Santo António dos Portugueses.

Américo Aguiar já é cardeal e responde ao desafio do Papa para que Colégio Cardinalício seja uma orquestra: “Vamos dar música”

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O novo cardeal aproveitou o momento para recordar a Jornada Mundial da Juventude, destacando o trabalho e o compromisso dos voluntários que contribuíram para a sua realização. “Foi indispensável a colaboração e o empenho e a dedicação de todos. Os mais de 30 mil voluntários que trabalharam na Jornada, os pequeninos meia dúzia que fomos no início, daquelas centenas que depois se juntaram, os milhares em todo o mundo que trabalharam, foi uma experiência de Deus”, sublinhou o presidente da Fundação JMJ Lisboa 2023. “Eu acho que atingimos a frequência de Deus. A JMJ disse-nos que quando permitimos que Deus aconteça nas nossas vidas, ele apresenta-se, abraça-nos, acolhe-nos e ama-nos”, acrescentou.

Américo Aguiar revelou que os “irmãos cardeais” manifestaram para com ele gratidão pela organização da JMJ em Lisboa, sentimento que diz ser recíproco. “Devemos sentir-nos orgulhosos do que fomos capazes de fazer e daquilo que Deus fez. Daí, a minha e a nossa gratidão, porque durante quatro anos andamos a convidar as pessoas para um encontro com Cristo vivo, vamos até aos limites da geografia e das capacidades humanas e agradeço muito ao COL e a todas as direções da JMJ. Desfizemos-nos em milhares de atividades para que o convite chegasse a todos para um encontro com Cristo vivo”, continuou.

No final da celebração, Américo Aguiar reconheceu que está a viver um momento que não foi programado” e que há alguns “sentimentos mistos” pelo meio. Garantiu, no entanto, que hoje o sentimento de confiança se sobrepõe a qualquer receio. “Sinto que o medo de 9 de julho [dia em que foi nomeado cardeal pelo Papa Francisco] se vai transformando em confiança naquilo que significa ter consciência que é um caminho que faço junto com o sucessor de Pedro, com o Colégio Cardinalício, com homens e mulheres que tentam ser santos e fazer o bem”, referiu.

O cardeal voltou a destacar o carinho que o Papa Francisco mostrou em relação a Setúbal — um dos temas da breve conversa que trocaram –, mostrando-se com grandes expectativas para iniciar a missão na diocese para a qual foi nomeado. “O carinho do Papa Francisco, com muita propriedade falou de Setúbal, mas quanto menos tempo falta, mais quero chegar para conhecer, amar e servir, os quase 900 mil dos cidadãos que moram em Setúbal – eu não sei nada de Setúbal e tenho de aprender com eles”, disse ainda.

Américo Aguiar é um 21 novos cardeais elevados no consistório deste sábado, o nono presidido pelo Papa Francisco. Com a adição, há agora seis cardeais portugueses no ativo, sendo que quatro têm menos de 80 anos de idade e, por isso, direito de voto num conclave. Além de Américo Aguiar, o país está também representado por José Saraiva Martins, Manuel Monteiro de Castro, Manuel Clemente, António Marto e José Tolentino Mendonça no Colégio Cardinalício.

Na cerimónia deste sábado D. Américo recebeu do Papa o anel e barrete cardinalícios, bem como a bula de criação. Como todos os cardeais, foi-lhe atribuída uma igreja titular em Roma: a Igreja de Santo António de Pádua, na Via Merulana. Dela chegaram a ser titulares o cardeal-patriarca de Lisboa D. António Ribeiro (entre 1973 e 1998) e o cardeal brasileiro D. Claudio Hummes (de 2001 a 2022 ), figura muito próxima do Papa Francisco que no conclave em que foi eleito sucessor de Bento XVI lhe sussurrou: “Não se esqueça dos pobres”.

O santo português, o patriarca de Lisboa e o homem que inspirou o nome do Papa. A igreja de Roma atribuída a Américo Aguiar

Na atribuição da Igreja de Santo António de Pádua, o cardeal admitiu ver uma mensagem forte.”Para mim é significativo que esta igreja tenha sido titular do cardeal António Ribeiro e também do cardeal Hummes, o culpado do nome Francisco, ‘não te esqueças dos pobres’. Tudo são sinais, recados e provocações que coloco no coração”, admitiu este sábado após a cerimónia. “Faço parte de uma orquestra sinfónica e sinodal e agora vamos dar música. É isso que é preciso”, sublinhou em resposta ao desafio do Papa para que Colégio Cardinalício seja uma “orquestra”.