A realidade mudou, o passar dos anos mais não foi do que um adensar do fosso entre um passado que parece vestir-se de ficção e a realidade do presente. Se durante algumas décadas os adeptos do United aproveitavam os dérbis com o City para mostrar tarjas onde gozavam com a falta de títulos do rival, agora são os citizens que estendem autênticos lençóis em campo sob a forma de um futebol único para mostrarem que entretanto os red devils desceram um patamar a nível interno e europeu. Este domingo, mais uma vez, todos aqueles milhares de adeptos que começaram a abandonar Old Trafford a dez minutos do final após o 3-0 de Phil Foden presenciaram essa mudança de hierarquia. No entanto, houve outro destaque a merecer elogios.

Haaland marca, Bernardo assiste, Guardiola tem razão: City vence United em Old Trafford

Para Pep Guardiola, não basta ser melhor. Aliás, o próprio conceito de “ser melhor” mais não é do que um convite para fazer diferente para andar no topo. Inovar, recriar, surpreender. Foi isso que voltou a acontecer no dérbi de Manchester, um palco onde o técnico espanhol parece encontrar o laboratório para aquelas que são as suas melhores experiências. Desta vez, além daquela aposta em John Stones a subir até ao centro do terreno em posse que deixa uma linha de três atrás onde Gvardiol se mostra cada vez mais enquadrado, quis utilizar o prolongamento em campo da sua forma de pensar para mexer: Bernardo Silva. O português fez a assistência para o bis de Erling Haaland na segunda parte mas foi MVP por muito mais do que isso.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Com Jérémy Doku a começar no banco mas sendo um dos jogadores em melhor momento (a primeira parte com o Brighton foi simplesmente arrasadora), Guardiola apostou em Jack Grealish na esquerda mas com a colocação de Bernardo Silva mais a cair nesse flanco para dar maior largura ao jogo do Manchester City. Foi essa nuance, com a colocação do português numa posição a que não está tão habituado e com Rodri a tomar conta de um meio-campo que se tornou num parque para o passeio do Manchester City, que diluiu todas as possíveis dúvidas que pudessem existir em relação ao desfecho de mais um dérbi que até podia ter terminado com uma maior diferença de golos. No final, o técnico espanhol voltou a fazer rasgados elogios à prestação do esquerdino não só pelo que joga mas também pelo que é e pelo respeito que ganha por isso.

“Olhem para ele, sem brincos, sem tatuagens, a conduzir um carro normal… É um jogador incrível. Adora jogar em Old Trafford e não me lembro de uma má exibição aqui, onde até já jogou como falso ‘9’. Tem a capacidade de segurar a bola no ataque. É tão inteligente… Todos o adoram e fez uma prestação fenomenal. É um dos melhores jogadores que já vi na minha vida. Tive a sorte de treinar grandes jogadores e este é um deles. Um dos melhores, pela sua inteligência e por ser uma excelente pessoa”, destacou.

“Até podia dizer o quão bom ele é, mas passaria aqui dez minutos a falar do que ele significa para mim e para esta equipa. Estamos encantados com ele. Não tem grandes carros, nem tatuagens nem se veste de forma aparatosa. É humilde e todos o adoram. Tínhamos medo de perdê-lo pois é insubstituível”, acrescentara antes Guardiola, num dos pontos de entrevistas rápidas após um dérbi com pouca “história”.

Se dúvidas antes existissem em relação ao peso que Bernardo Silva tem no balneário do Manchester City (e cada vez mais na Seleção), as flashes interviews tiveram um episódio que mostrou isso mesmo. Depois de elogiar a exibição da equipa, “uma das melhores que fez esta temporada”, o médio ofensivo recebeu das mãos de Erling Haaland o prémio de MVP e, entre aquela imagem de um gigante norueguês a oferecer o troféu a um pequeno português que é cada vez maior quando entra em campo, sobraram as palavras do avançado a agradecer por tudo. “Amo-te, amo-te muito, amo-te tanto como o Pep”, atirou entre gargalhadas.

“O Bernardo Silva é um jogador de futebol. O que é que isso quer dizer? Ele vai jogar em qualquer lado, porque entende o jogo e todas as ações com e sem bola. Quando o [Alphonso] Davies arranca, não consegues pará-lo, mas o Bernardo tem a capacidade de ler as posições, dar-nos o passe extra. É tão importante neste tipo de jogos. Pode jogar a médio de contenção. É tão, tão importante e ultimamente tem marcado muitos golos, algo que lhe tem faltado. Mas agora tem sido decisivo. É um jogador a quem dizes para jogar numa posição e depois não tens de acrescentar nada. Tive a sorte de treinar jogadores muito bons no Barcelona e Bayern. É um dos melhores que treinei em toda a minha vida, é algo especial em termos de jogador de futebol”, tinha destacado antes o treinador espanhol, na caminhada até à vitória na Liga dos Campeões.

O maior elogio de Pep com a frase mais simples possível: “O Bernardo é um jogador de futebol, dos melhores que treinei na vida”