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O presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) considerou esta quarta-feira, acerca da Operação Influencer, “excessivo e prematuro” nesta fase “pendurar já o Ministério Público (MP) no pelourinho ou endeusá-lo”, porque se desconhece como vai terminar a investigação.

“Percebendo que haja interesses políticos e partidários em jogo e com as eleições à vista, e que haja a tentação de utilizar este caso também para esse efeito, acho excessivo e prematuro nesta fase pendurar já o Ministério Público (MP) no pelourinho ou endeusar o MP e colocá-lo no altar, porque nós não sabemos ainda como é que vai acabar esta investigação”, declarou à agência Lusa Manuel Soares.

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Perante as muitas críticas que têm sido feitas ao processo que “provocou indiretamente uma crise política”, com a demissão do primeiro-ministro, António Costa, o dirigente da ASJP disse “não embarcar na tese de ninharia penal”, ao assinalar que estão em causa “pessoas com responsabilidades governativas ou próximas de pessoas com responsabilidades governativas que podem ter cometido crimes de tráfico de influência e recebimento indevido de vantagem”, sublinhando que “os factos conhecidos pela imprensa são graves”.

Sobre o facto de nas buscas terem sido encontrados mais de 75 mil euros no gabinete de Vítor Escária, chefe de gabinete do primeiro-ministro, Manuel Soares lembrou que “as pessoas que, por força dos cargos públicos que exercem, estão obrigadas a declarar no Tribunal Constitucional os rendimentos, o património e os interesses dos titulares de cargos públicos”, nomeadamente os membros do Governo ou dos seus gabinetes.

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“Se uma pessoa nessas condições tiver dinheiro na sua posse que lhe pertença e que não foi declarado, independentemente do dinheiro ter proveniência lícita ou ilícita, essa conduta é, desde 2022, punível com pena de prisão de um a cinco anos como crime de ocultação de património”, explicando que a lei foi alterada nessa altura para penalizar quem oculta património às entidades de fiscalização.

Quanto à polémica gerada pelo último parágrafo do comunicado da Procuradoria-Geral da República (PGR) que revelou existir um inquérito autónomo no MP junto do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) envolvendo o primeiro-ministro, o presidente da ASJP defendeu que “o parágrafo não caiu do céu”.

“Uma pessoa reage a um parágrafo não por causa da sequência de palavras e letras, mas porque o parágrafo tem um determinado significado. E o significado daquele parágrafo e dos parágrafos todos daquele comunicado da PGR é que certas pessoas podiam ter praticado atos que, tendo chegado ao conhecimento do MP, foram considerados suspeitos, e o MP foi obrigado, porque a lei obriga, a abrir uma investigação para confirmar ou não essas suspeitas e esses atos”, disse.

Observou a propósito que algumas diligências “foram já até objeto de alguma validação por juízes de instrução”, nomeadamente aquelas que autorizaram a realização de buscas e escutas telefónicas.

“Não sei o que é que lá está, mas teve de haver uns juízes de instrução a dizer que havia indícios suficientes para se autorizarem essas diligências”, vincou.

Manuel Soares questionou ainda que ilações se poderiam tirar caso a PGR tivesse decidido omitir o último parágrafo referente à investigação ao primeiro-ministro.

“Isso mais tarde ou mais cedo iria saber-se, porque a partir do momento em que os advogados podem consultar o processo, viam que tinham sido extraídas certidões e, portanto, facilmente percebiam que tinha havido uma iniciativa processual no STJ a propósito do primeiro-ministro, e o que é que se ia dizer? Que a Procuradora-Geral da República ocultou a informação relevante ao Presidente da República, ao primeiro-ministro, aos cidadãos portugueses, para beneficiar o Governo e o PS”, argumentou.

O juiz desembargador traçou uma linha divisória entre “lobbying” e “a chamada cunha”, frisando que tais conceitos não são confundíveis, desde logo pela lei portuguesa, onde o “lobbying” não está regulado, mas em que existe a tipificação criminal de determinados comportamentos enquadrados no que se designa como “cunha”.

“Acharmos que o comportamento de meter uma cunha para o nosso processo andar mais depressa ou por obtermos uma decisão ilícita, a troco de alguma vantagem económica que entregamos à pessoa que tem a responsabilidade de decidir, achar que isto é ‘lobby’, francamente não é ‘lobby’, isto é outra coisa, pelo menos enquanto a lei não for mudada”, acentuou.

Até se conhecerem todos os factos do processo, Manuel Soares considera que “ninguém responsável consegue dizer que o MP está a perseguir criminalmente pessoas por factos que não são crime”.

O dirigente da ASJP achou “absolutamente normal” que este caso, que “não é coisa pouca” e envolve o primeiro-ministro e outras figuras políticas, tenha provocado “tumultos e perturbação no espaço público”, assim como “críticas sobre o MP”.

“Se amanhã, os tribunais confirmarem decisões neste caso do MP, passarão a ser os tribunais os criticados”, contrapôs, questionando se o que se pretende é uma sociedade em que a Justiça não seja “capaz de incomodar, nos casos em que se justifica incomodar” essas pessoas “mais poderosas”.

Processo Influencer. “PGR foi além do necessário”

No final do interrogatório judicial da operação Influencer, Diogo Lacerda Machado (consultor e amigo do primeiro-ministro) ficou fortemente indiciado por tráfico de influência e sujeito a uma caução de 150 mil euros e entrega de passaporte.

Vítor Escária viu validados fortes indícios de tráfico de influência, ficando proibido de se ausentar para o estrangeiro.

O autarca de Sines Nuno Mascarenhas e os administradores Rui Oliveira Neves e Afonso Salema, da Start Campus, ficaram sujeitos unicamente a Termo de Identidade e Residência (TIR), devendo a empresa pagar uma caução de 600 mil euros. Para o autarca não foram validados indícios de quaisquer crimes, enquanto os dois administradores estão indiciados por tráfico de influência e oferta indevida de vantagem.

O juiz não validou os indícios apontados pelo MP da prática de corrupção e prevaricação que recaíam sobre os arguidos.