Ouviram-se as palavras da ordem em qualquer festa. Do Palmeiras, o vencedor. De campeão, pela conquista do ponto que faltava ainda para assegurar que nada de anormal podia acontecer. Do rival Santos, com quem protagoniza o “Clássico da Saudade” e que desceu ao segundo escalão pela primeira vez na história depois de perder em casa com o Fortaleza. No entanto, puxando o filme atrás, o cântico que entoou com maior fulgor no Mineirão após o jogo com o Cruzeiro foi o “Fica Abel”. “Fica Abel, fica Abel, fica Abel”. Em pouco mais de três anos, o técnico português fez o que poucos ou nenhuns acreditavam com a conquista de nove títulos que o tornam não só o estrangeiro com mais troféus no Brasil mas também o segundo com mais troféus no Verdão. Se consegue ou não, só o futuro e uma possível continuidade no clube paulista poderá vir a dizer mas a ideia dos adeptos, e dos próprios jogadores, parece clara: Abel Ferreira é quase “património”.

O “saco cheio” também é de troféus: Abel sagra-se bicampeão pelo Palmeiras e faz história como estrangeiro com mais títulos no Brasil

Durante o encontro, e ao contrário do que é muitas vezes normal, o português mostrou-se com uma dose extra de acalmia. De mãos nos bolsos, sempre a corrigir posicionamentos até mesmo quando o Palmeiras já ganhava com um golo de Endrick (e Atl. Mineiro e Flamengo estavam a perder), Abel Ferreira foi vendo uma festa a começar fora de campo e a alargar-se depois ao relvado no final do empate com o Cruzeiro. Quando ouviu o “Fica Abel”, no pódio dos campeões ao lado de Zé Rafael, agradeceu com acenos, levantou o polegar e ainda fez o habitual gesto de comemoração de Cristiano Ronaldo que deixou vários jogadores a rir. Mais tarde, depois de já ter tirado uma fotografia com outro Ronaldo (o Fenómeno, que detém o Cruzeiro), o treinador ainda teve “direito” ao habitual banho de gelo na sala de imprensa. Sobre o futuro, ainda nada.

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“Subimos a fasquia, criámos os nossos próprios desafios. Ultrapassámos os nossos próprios limites, contra muitos que eu entendo porque o clubismo fala muitas vezes mais alto, mas este grupo é resiliente. As pessoas perguntam qual é o segredo e eu não consigo explicar. Sente-se no grupo um respeito, uma amizade e competitividade muito grandes que são valores que nos acompanham”, referiu na conferência após a conquista do nono título no Brasil pelo Verdão entre duas Taças dos Libertadores (2020 e 2021), dois Campeonatos (2022 e 2023), uma Supertaça Sul-Americana (2022), uma Taça do Brasil (2020), uma Supertaça do Brasil (2023) e dois Campeonatos Paulistas (2022 e 2023), que o tornam a partir de agora no treinador estrangeiro com mais troféus no país além de ser também o único estrangeiro bicampeão nacional.

“Se vou ficar no clube? Para o ano que vem vai ser ainda pior. Não vamos ter descanso, vai ser jogo atrás de jogo. O ano seguinte vai ser pior do que este, vamos ter jogadores chamados para seleções, começamos dia 17 [de janeiro] a competir, os clubes do Paulista estão a preparar-se para enfrentar um Palmeiras que ainda vai estar de férias e, quando voltar, toda a gente vai querer ganhar ao Palmeiras. E o que vão exigir a mim? Que faça melhor do que fiz no ano passado. Não sei se tenho energia suficiente para dar a estes jogadores o que me deram. O que eu preciso nesse momento é descansar e muito sinceramente começar a competir no dia 17. Sei muito bem o que aconteceu quando ganhei a Libertadores e o primeiro jogo que fiz a seguir”, apontou Abel Ferreira, que não só ganhou como mudou por completo o futebol do Palmeiras.

“Qatar? Em primeiro lugar, gostaria de dizer que saem notícias absurdas de dinheiro que eu ganho e que é tudo falso e mentira. Nunca foi uma questão de dinheiro, se não tinha saído há dois ou três meses. Houve treinadores que saíram para outros clubes, o lugar foi-me oferecido e eu não quis. Há um mês, uma equipa também, quase todas desses lados, apareceu e eu não quis ouvir mas também não posso esconder… Só de imaginar que no dia 17 estamos a competir outra vez… Eu tenho que pensar como fiz no final da primeira Libertadores, no final da segunda Libertadores, que tenho um contrato e os contratos são para se cumprir. As cláusulas são para se cumprir para os dois lados. Mas também vos disse que estou cansado, são três anos seguidos. Quanto mais ganhas, maior é a exigência, mais te cobram, mais energia tenho que dar aos outros. É puxar pelos mesmos, vamos lutar pelos mesmos objetivos”, sublinhou.

“Vivo muito com o aqui e com o agora. Sempre aprendi ao longo de 44 anos, comecei a pensar de forma séria a partir dos 18 anos, e a experiência diz-me que a única constante da vida é a incerteza. Não sabia se vinha para o Brasil, se ia ganhar títulos, se ia ser demitido em três meses como fazem aqui… Portanto a única coisa que disse aos nossos adeptos foi: desfrutem desses três títulos, desfrutem de mais um título. Nunca na história o Palmeiras ganhou tanto em tão pouco tempo. Foi o que disse aos nossos jogadores. Vamos desfrutar e o que tiver que acontecer será o melhor para todas as partes, isso que é o mais importante. Seja qual for a decisão, contrato é para se cumprir. O mais importante é que tenho de descansar a minha cabeça. A decisão pode ser ir para casa. Pode ser ficar em casa e descansar. Chegou a altura de dar todo o tempo à minha família que eu retirei, em função do trabalho que tenho, retirei. O que vou decidir é o melhor para a minha família, não é o que é o melhor para o Abel”, acrescentou ainda o técnico português.

Para o Palmeiras, não há dúvidas: Abel é para “ficar, ficar, ficar”. “Não conversei com o nosso treinador. Ele continua a trabalhar da mesma forma mas começou essa polémica na imprensa agora, há pouco tempo. Como estávamos focados no Campeonato, não quis desfocar. Há uma coisa que os adeptos podem ter a certeza: desejo que o Abel fique por muito tempo no Palmeiras e vou fazer o possível e o impossível. Esse é o meu desejo, que ele cumpra o contrato. É uma pessoa muito séria e confio muito no nosso treinador”, destacou após a conquista do Campeonato a presidente do Verdão, Leila Pereira.