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Jacqueline Novak ajoelhou-se para dar a volta ao stand up

"Get on Your Knees" é o especial (na Netflix) que começa na história de um felácio e se transforma num monólogo memorável sobre sexo oral. Mas onde acaba a humorista em pé e começa a atriz de joelhos?

O grande aglutinador do especial é a história do seu primeiro felácio, aos 16 anos, e das consequências do mesmo. Sobre como, na verdade, aquilo era mais um ritual de passagem e menos uma demonstração de desejo ou luxúria
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O grande aglutinador do especial é a história do seu primeiro felácio, aos 16 anos, e das consequências do mesmo. Sobre como, na verdade, aquilo era mais um ritual de passagem e menos uma demonstração de desejo ou luxúria

O grande aglutinador do especial é a história do seu primeiro felácio, aos 16 anos, e das consequências do mesmo. Sobre como, na verdade, aquilo era mais um ritual de passagem e menos uma demonstração de desejo ou luxúria

Depois de anos a discutir, estilo voltas numa rotunda mal sinalizada da qual nunca se consegue sair, quais são os limites do humor, a comunidade de produtores e fãs de comédia parece ter abraçado outra questão filosófica: afinal, para que serve o humor? Serve obrigatoriamente, apenas e só, para fazer rir? Serve inequivocamente para fazer pensar? Um espectáculo de stand up continua a ser de stand up se tiver lá pelo meio coisas que não se categorizam como graçolas? Se uma árvore cair na floresta e ninguém se rir, caiu mesmo?

Tal como a sua predecessora, esta é geralmente uma discussão aborrecida e inconclusiva, que tenta colocar uma forma de arte/entretenimento (riscar o que não interessa) numa caixinha bem arrumada e etiquetada. Mas apesar de sempre me ter escusado a entrar neste debate, não resisto em constatar que Get on Your Knees, o especial de Jacqueline Novak estreado há dias na Netflix, não é stand up. Isso, por si só, não é bom nem mau. O problema é que, a partir do momento em que é embalado e colocado no expositor dessa maneira, fica fragilizado pelo tipo de expectativas do formato.

Jacqueline Novak é uma humorista e atriz (sobretudo de improv) com uma carreira pouco expressiva a nível mundial. Porém, este Get on Your Knees foi um sucesso de palco enorme um pouco por todo o lado em que passou. Estreou-se nesse prestigiado tubo de ensaio que é o Edinburgh Festival Fringe nos idos de 2018, na altura ainda com o nome How Embarrassing for Her. Depois passou por Los Angeles e aterrou em Nova Iorque, onde o sucesso foi tão grande que levou a largos meses em cena e a uma tour pelos Estados Unidos (primeiramente adiada pela pandemia). O reputado New York Times colocou o espectáculo nas suas listas de “Best Theater of 2019” and “Best Comedy of 2019”.

[o trailer de “Get On Your Knees”:]

E pode ser aqui nestas listas que está uma das primeiras pistas sobre o que Get on Your Knees é. Sim, é comédia — mas é, em grande parte, um espectáculo de teatro. Durante mais de uma hora e meia (demasiado tempo para um especial de stand up — e sente-se, não passa a correr), Novak debruça-se com miudeza (juro que não é trocadilho para o que aí vem) sobre um único tema: o felácio. Uma mulher a fazer sexo oral a um homem. O tom e a linguagem são humorados, sim, mas muitas vezes aproximam-se mais de uma TED Talk, de uma contadora de histórias, até de uma poetisa em equilibrismos de spoken word. Há graça, mas nem sempre há uma cadência de piadas no ritmo lógico num espectáculo de stand up. E não compreender isto à partida é ir lançado para uma surpresa — que para alguns espectadores será boa, para outros será só confusa. Basta ver as críticas tão opostas espalhadas pela internet fora.

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Novak entra ao som de Like A Prayer de Madonna — canção icónica da minha infância, e por certo, da infância da comediante, nascida em 1982. Em miúdas não nos aperceberíamos disto, mas na idade adulta torna-se mais óbvio que é um tema que aflora o sexo oral, com alguma metáfora à mistura. No seu especial, Jacqueline é muito menos discreta. Começa logo com um paralelo entre o desconforto de se dirigir para o meio do palco e o desconforto de, pela primeira vez, aproximar a cabeça dos genitais de alguém. Daí para a frente esmiúça-se tudo, na sonoridade da palavra “pénis” até ao facto de se devem ou não usar os dentes. E “esmiuçar” é mesmo a palavra. Novak demora-se em cada detalhe, em cada sub-temática, durante longos minutos. O grande aglutinador do especial é a história do seu primeiro felácio, aos 16 anos, e das consequências do mesmo. Sobre como, na verdade, aquilo era mais um ritual de passagem e menos uma demonstração de desejo ou luxúria (“nunca hesitei perante uma batata frita”, mas assume hesitar perante aquele pénis adolescente). É uma história longa, com princípio, meio e fim.

Jacqueline Novak porta-se sempre em palco como uma atriz e não como alguém que faz stand up. Age como quem já fez aquilo centenas de vezes, milimetricamente, servindo um texto. É expressiva, é confiante, mas sem a espontaneidade (mesmo que estudada) que o stand up pede

Mas não se pense que isso quer dizer que Get on Your Knees não tem ritmo. Em palco, a persona da humorista é uma autêntica maratonista. Faz quilómetros em palco, andando o tempo todo de um lado para o outro. E fala com uma rapidez que por vezes se torna até sôfrega, difícil de acompanhar, com as palavras quase a falhar por falta de ar. A realização vai escoltando a marcha — realização essa que ficou a cargo da atriz e produtora Natasha Lyonne (Pokerface, Russian Doll, Orange is the New Black), uma das mentoras que pegou neste espectáculo e investiu nele, certa de que seria um sucesso. O outro foi o comediante Mike Birbiglia, também ele com vários espectáculos disponíveis na Netflix (Thank God for Jokes é particularmente bom).

Ver Get on Your Knees ao vivo e a cores deve, de facto, ser uma experiência impressionante, dada a energia constante da interveniente. O problema é que o ecrã é frio, é cínico, e faz com que o espectáculo pareça demasiado longo e, novamente, desadequado ao formato ao qual foi espartilhado. Chega a ser uma chatice.  O especial teria muito mais a ganhar assumindo-se como um monólogo. Mesmo que seja a autora do texto (e que este seja autobiográfico), Jacqueline Novak porta-se sempre em palco como uma atriz e não como alguém que faz stand up. Age como quem já fez aquilo centenas de vezes, milimetricamente, servindo um texto. É expressiva, é confiante, mas sem a espontaneidade (mesmo que estudada) que o stand up pede. Mais: mesmo enquanto espectáculo teatral, teria benefícios em assumir-se como tal e em apostar assumidamente numa encenação. Assim, como comédia, necessita pelo menos de uma edição de texto mais rigorosa e certeira.

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