Um dos vídeos que estava no computador do conselheiro de Jair Bolsonaro, Mauro Cid, mostra que o antigo Presidente brasileiro pediu numa reunião com membros do seu governo a 5 de julho de 2022 para que se fizesse “alguma coisa” antes das eleições. E falou em “caos” caso perdesse as eleições. “Nós sabemos que se a gente, se a gente reagir depois das eleições vai haver um caos no Brasil, vai virar uma grande guerrilha, uma fogueira no Brasil.”

O vídeo está a circular na imprensa brasileira e foi obtido em primeira mão pelo jornalista Túlio Amâncio, que trabalha no canal de televisão Band.

Na altura, o antigo Chefe de Estado insinuou que as eleições presidenciais marcadas para outubro daquele ano seriam fraudulentas. “Não adianta que eu tenha 80% dos votos. Eles vão ganhar as eleições”, disse, numa alusão a uma alegada vitória — que estaria garantida — do atual Presidente brasileiro, Lula da Silva.

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Nesse sentido, Jair Bolsonaro deu, naquela reunião, “a guerra de papel e caneta” como perdida. “A gente tem de ser mais contundente, como eu vou começar a ser”, garantiu, traçando um cenário. Se no dia 2 de outubro de 2022, data da primeira volta das eleições presidenciais brasileiras, Lula da Silva obtivesse “51% dos votos” — e fosse, por conseguinte, eleito Chefe de Estado — haveria um “caos” e o Brasil poderia “pegar fogo”.

A realidade mostra que Lula da Silva ficou em primeiro lugar com 48,43% dos votos, ao passo que Jair Bolsonaro ficou em segundo com 43,20%.

No mesmo vídeo, Jair Bolsonaro disse aos seus ministros que todos os presentes na reunião tinham uma “inteligência bem acima da média” e deixou no ar que todos que estavam ali e o “povo” tinham “algo a perder”: “Não podemos, pessoal, deixar chegar as eleições e acontecer o que está pintando”. “A gente vai ter que fazer alguma coisa antes”, sublinhou, sem nunca dizer o quê.

O antigo Presidente brasileiro desconfiava ainda dos membros do Tribunal Superior Eleitoral, organismo jurídico que controla a realização das eleições. “Os caras estão a preparar tudo para o Lula ganhar no primeiro turno, na fraude. Vou mostrar como e por quê”, afirmou Jair Bolsonaro, que questionou se alguns dos presentes no encontro acreditava em Edson Fachin, que na altura era o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal e Alexandre de Moraes, juiz do Supremo Tribunal Federal.

“Alguém acredita [neles]? Se alguém acredita, levante o braço. Acredita que eles são pessoas isentas, que estão preocupadas em fazer justiça, em seguir a Constituição?”, questionou Jair Bolsonaro, cuja residência foi alvo de buscas judiciais esta quinta-feira, juntamente com a dos seus antigos aliados.

Polícia brasileira descobre plano de golpe de Estado que Bolsonaro terá ajustado

Bolsonaro e alegados cúmplices podem enfrentar 23 anos de prisão

Ao mesmo tempo em que autorizou a detenção dos aliados de Bolsonaro, Alexandre de Moraes deu como certos os indícios que aponta para a prática de crimes contra a democracia e associação criminosa. A confirmar-se esse cenário, o ex-Presidente e os seus alegados cúmplices enfrentam uma pena de prisão que pode ir até aos 23 anos atrás das grades.

De acordo com a Folha de São Paulo, o crime mais grave em cima da mesa é o de tentativa de golpe de Estado, que por si só acarreta uma pena que vai dos 4 aos 12 anos de prisão efetiva. Em causa, para a investigação, está a possível constituição de uma organização criminosa para impedir a transição de poder após a vitória de Lula da Silva nas últimas eleições. 

Além deste, de acordo com o presidente do STF, está ainda em causa a prática de crimes de abolição violenta do Estado democrático de Direito que, de acordo com a lei brasileira, ocorre quando alguém usa a violência, física ou verbal, para impedir o funcionamento normal dos poderes constitucionais. A moldura penal oscila entre os 4 e os 8 anos de prisão.

Contas feitas, as penas podem superar os 20 anos em cúmulo jurídico. No entanto, diz a Folha, eventuais sentenças podem superar esse número, dependendo de se fica ou não provado que os suspeitos cometeram atos de violência em conjunto com os crimes de que são acusados.