Os protestos e manifestações continuam no Paquistão, depois de o partido do ex-primeiro-ministro Imran Khan e o partido de outro ex-primeiro-ministro, Nawaz Sharif, terem ambos declarado vitória nas eleições para a Assembleia Nacional do país, no dia 8 de fevereiro.

Embora ainda não sejam conhecidos os resultados finais  — o que integra, aliás, a lista de motivos da contestação popular — são conhecidos 264 dos 266 mandatos. Os candidatos independentes, na sua maioria ligados ao partido de Imran Khan, o Pakistan Tehreek-e-Insaf (PTI), obtiveram 101 lugares. A Liga Muçulmana do Paquistão (PML-N), apoiada pelo exército e encabeçada por Nawaz Sharif, conseguiu 75 mandatos, e o Partido Popular do Paquistão, o PPP, consegiu 54 mandatos, indica a Comissão de Eleições do Paquistão.

De acordo com a Al Jazeera, o PML-N e o PPP já estão em negociações para formar um governo de coligação. Contudo, o líder dos Populares, Bilawal Zardari — um ambicioso ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, com 35 anos — exige ser primeiro-ministro, algo que o septuagenário Sharif, que passou três vezes pelo cargo entre 1990 e 2017, não aceita.

O PTI, por outro lado, afirma que o resultado teria sido “uma maioria clara e esmagadora” do partido sem a alegada fraude eleitoral. Imran Khan divulgou no dia 9 de fevereiro um vídeo nas redes sociais com o discurso de vitória, onde agradece o apoio popular e critica o adversário por fazer o que apelida de “discurso de vitória” quando os resultados oficiais o colocavam em 2º lugar. O vídeo tem uma particularidade: como o candidato está preso, foi gerado a partir de inteligência artificial.

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Por seu lado, o Chefe de Estado-Maior do Exército paquistanês, Asim Munir, celebrou o sucesso do ato eleitoral e pediu aos partidos “maturidade política e unidade”. “As eleições não são um jogo de soma zero, mas um exercício para determinar o mandato do povo”, declarou o general, segundo o Telegraph. Devido às suspeitas de fraude e à surpreendente derrota do PML-N, que os observadores internacionais consideram ter o apoio dos militares, a France24 batizou as legislativas de 2024 como “a eleição dos ‘generais’ que se virou contra os militares”.

“Em todo o Paquistão, as eleições foram subtilmente manipuladas”, declarou o presidente do PTI, Gohar Ali Khan, no sábado, que apelou aos seus apoiantes para que manifestassem pacificamente no domingo.

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Um candidato do mesmo partido, Salman Akram Raja, denunciou a alegada interferência com urnas eleitorais, onde terão sido depositados centenas de votos para condicionar o resultado. “Eles decidiram reescrever os resultados”, declarou ao Guardian. Os resultados foram impugnados em vários círculos eleitorais, e a decisão dos tribunais irá moldar o futuro político do Paquistão — e condicionar o início da legislatura.

É que, além dos 266 lugares eleitos em na passada quinta-feira, a Assembleia Nacional é ainda composta por um conjunto de 70 lugares reservados a mulheres e não-muçulmanos, distribuídos por representação proporcional ao resultado obtido. Assim, a decisão judicial condiciona não só o resultado imediato da eleição de dia 8, mas também afeta a distribuição destes mandatos.

O partido de Imran Khan não foi autorizado a aparecer nos boletins de voto, tendo os seus candidatos de se apresentar como independentes, mas como os independentes não podem formar governo, é provável que se sigam semanas de incerteza política enquanto os partidos rivais negoceiam possíveis coligações.

A semana que precedeu as eleições foi marcada por uma escalada nos protestos populares contra o governo e os militares, que levou inclusivamente à morte de candidatos.

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O corte dos serviços de telemóvel e Internet pelas autoridades na quinta-feira, dia das eleições, e a lenta contagem dos resultados levantaram suspeitas de tentativas de manipulação do processo eleitoral por parte dos militares para ajudar o PML-N a vencer, acrescenta a AFP.

As autoridades tinham avisado que iriam tomar medidas rigorosas contra essas manifestações, ao abrigo de uma lei da era colonial que proíbe ajuntamentos de cinco ou mais pessoas. “Serão tomadas medidas legais contra as concentrações ilegais”, avisou a polícia de Islamabad.

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Um aviso semelhante foi emitido em Rawalpindi, onde a polícia disparou gás lacrimogéneo contra dezenas de apoiantes do PTI que se recusaram a retirar os piquetes do exterior de um gabinete de recolha dos resultados eleitorais.

O Paquistão, o quinto país mais populoso do mundo, foi a votos no dia 8 de fevereiro para determinar a composição do parlamento nacional, assim como dos quatro assembleias provinciais. Às urnas foram convocados 128 milhões de eleitores: cerca de 12 vezes o número de eleitores portugueses espalhados pelo mundo, ou mais do dobro do eleitorado alemão.

O exército ocupa um lugar central na política paquistanesa, já que o país tem sido governado por generais durante quase metade da sua jovem história, desde a separação da Índia em 1947.