Era o dia de aniversário de um dos clubes com mais história no mundo, era também um dia de estreia numa das maiores inovações em termos de recinto desportivo do século XXI no futebol. Não é por acaso que todos os anos os adversários do Real Madrid têm tendência a confirmar que os 90 minutos de um jogo no Santiago Bernabéu são mais longos do que em qualquer outro campo. É um clube grande, que nunca perde esse ADN de vitória, que se torna até atípico por ser um dos poucos para quem um triunfo europeu é mais objetivo do que uma conquista nacional, mas ao mesmo tempo funciona como uma verdadeira empresa, estruturada, pensada a médio/longo prazo, onde se percebe a diferença entre um custo e um investimento. Agora, e mais uma vez, era também isso que estava colocado à prova apesar da vantagem frente ao RB Leipzig.

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A cumprir 122 anos de existência, os merengues iriam aproveitar as condições climáticas desfavoráveis para utilizarem pela primeira vez a cobertura retrátil instalada nas obras de remodelação do estádio, recriando a imagem de um pavilhão para mais de 80.000 mas onde se joga futebol. Mais um ponto de destaque numa intervenção que chegou a colocar a equipa a jogar em Valdebebas durante o período da pandemia mas que vai tornar o complexo do novo Santiago Bernabéu numa máquina de fazer dinheiro para amortizar o que foi gasto e ir melhorando as condições desportivas. Nesse particular, a mais do que provável chegada de Kylian Mbappé será uma espécie de coroa final (ou quase, tendo em conta que em Inglaterra continuam a apontar Erling Haaland como um sonho a médio prazo dos espanhóis) num conjunto que foi “reformulado”.

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Já não há Ronaldo, Sergio Ramos, Marcelo, Casemiro ou Benzema. Outros, como Modric, Toni Kroos ou Carvajal, interpretam de outra forma o contributo individual que podem dar ao coletivo. Agora, estamos na era de Vinícius Jr., de Rodrygo, de Brahim Díaz, de Camavinga, de Fede Valverde, de Tchouaméni, todos jogadores com 25 ou menos anos que formam uma nova base para o futuro a quem se vai juntar Mbappé. E tudo com uma particularidade: a renovação foi feita de forma discreta, atempada e sem nunca perder aquela competitividade necessária para lutar por todos os títulos. Grande obreiro desse projeto além do presidente Florentino Pérez? O treinador, Carlo Ancelotti, um nome muito falado agora por outras razões.

Na antecâmara do encontro que iria decidir a passagem aos quartos da Liga dos Campeões frente a uma formação germânica que jogou para mais do que a derrota na primeira mão por 1-0, e que tem nos quadros alguns dos jovens mais cobiçados como Dani Olmo, Xavi Simons, Loïs Openda ou Benjamin Sesko, o técnico italiano ficou a saber que o Ministério Público espanhol pediu uma pena de prisão de quatro anos e nove meses por alegadas dívidas ao Fisco no valor de mais de um milhão de euros relativos a 2014 e 2015, na primeira passagem pelos espanhóis, mais uma vez com a questão dos pagamentos por direitos de imagem a não serem alvos de tributação através de um alegado esquema de empresas. Em Espanha, entre as grandes figuras ligadas ao desporto que tiveram o mesmo problema, só Xabi Alonso conseguiu que o seu processo fosse arquivado sem acordo. No futebol como fora dele, era no agora treinador do Bayer Leverkusen (única equipa das grandes ligas sem derrotas está época) que Ancelotti se podia “inspirar”.

À semelhança do que aconteceu com os farmacêuticos, que tinham ganho os dois jogos na Bundesliga por 3-2, o Real Madrid sentiu dificuldades e a primeira parte foi exemplo paradigmático disso mesmo com o RB Leipzig sempre mais perto de poder inaugurar o marcador com Openda a ser a unidade mais em foco e os espanhóis a serem incapazes sequer de criarem uma oportunidade que desse para enquadrar um remate. Além do receio, havia assobios. Num jogo europeu, em casa e em vantagem, havia assobios. E Ancelotti não demorou para tentar inverter algo, com a saída de Camavinga para a entrada de Rodrygo ao intervalo.

A segunda parte foi bem melhor, teve mais motivos de interesse mas nem por isso a resistência dos alemães foi menor. Pelo contrário. Vinícius Jr., que arriscou algo mais do que um amarelo depois de uma “pega” com um defesa contrário sem necessário, aproveitou um passe de génio de Jude Bellingham para inaugurar o marcador naquilo que muitos pensaram ser uma pedra final na eliminatória (65′) mas o central e capitão Willi Orbán demorou apenas três minutos para explicar a Openda e companhia como marcar e fez o empate de cabeça (68′) deixando tudo novamente em aberto até ao final, altura em que Dani Olmo, num fantástico chapéu na área em período de descontos, acertou na trave e viu a reviravolta cair por centímetros.