“Estão a tornar o Livre em tudo o que criticam nos outros, matando as primárias abertas”, diz ao Observador uma fonte dentro do partido. Na tarde desta terça-feira, os inscritos no colégio eleitoral no processo de primárias do Livre para as Eleições Europeias foram notificados de que, na segunda volta — em que seriam votados os seis candidatos apurados até agora — apenas poderão participar na eleição membros e apoiantes do partido. Isto significa que apenas poderão votar filiados, tendo as quotas em dia, no caso dos membros, e os apoiantes, mesmo que não as tenham regularizadas.

De acordo com o regulamento das Primárias Abertas do Livre, o Colégio Eleitoral para as eleições europeias é composto por “membros e apoiantes do Livre de pleno direito, com pedido de filiação até ao fecho das inscrições para votar na segunda fase das primárias e ainda “os cidadãos que, não sendo membros ou apoiantes do Livre, tenham capacidade eleitoral ativa para votar na eleição em questão e se inscrevam no
processo de primárias abertas do Livre”.

Assim, ficam de fora na escolha do cabeça de lista do Livre às Europeias os membros da sociedade civil que, mediante inscrição, estariam habilitados a votar. O Observador sabe que está em causa a deteção de um número significativo de votos singulares no candidato Francisco Paupério, o candidato mais votado na primeira ronda eleitoral. Ou seja: votos online de membros externos ao partido que optaram por votar apenas neste candidato, não ordenando assim a restante lista. A opção de escolher apenas um candidato é dada no boletim de voto eletrónico.

Em resposta às questões enviadas pelo Observador, a Comissão Eleitoral do Livre confirma que se trata de um caso de “grande número de inscritos a votarem massivamente numa única candidatura e apenas numa“. “Comparando com resultados de primárias anteriores esses resultados apresentam uma desproporção significativa”, acrescenta a mesma fonte, que diz ter recebido “diversos pedidos de informação e queixas de outros candidatos, que se sentiram lesados por estes factos”.

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“Na impossibilidade da Comissão Eleitoral, tendo em conta o secretismo do voto, identificar os votantes em causa, foi decidido não incluir a votação dos inscritos externos ao partido na votação da segunda volta”, aponta ainda, informando que vai ser adiado o inicio da votação da segunda volta em 24h para permitir que decorram os prazos de recurso para o Conselho de Jurisdição.

Ao Observador, Francisco Paupério entende que a situação detetada e que envolve a sua candidatura “não foge ao regulamento” da votação em curso e informa que vai “contestar a decisão dentro do partido, através do conselho de jurisdição”. “Fiquei surpreendido com a decisão, é abusiva ao espírito das Primárias”, aponta o visado.

O “candidato a candidato” do Livre, tal como se apresenta nas redes sociais — onde nos últimos meses tem feito uma intensa campanha — recorda que anunciou a candidatura publicamente há um ano. Daí que não estranhe que várias pessoas externas ao partido se tenham mobilizado para o apoiar, mesmo que optando por votar apenas na sua candidatura.

“A Comissão Eleitoral tendo recebido várias queixas e pedidos de dados sobre os resultado da primeira volta e analisado os mesmos considera existirem fortes indícios de viciação do processo da parte de votos de não membros e apoiantes do Livre“, informa o órgão eleitoral do partido num e-mail a que o Observador teve acesso. Assim, entende que a única forma de garantir a integridade do processo de Primárias é na segunda volta a votação ficar acessível apenas a membros e apoiantes.

O processo eleitoral interno do partido de Rui Tavares é conhecido por, precisamente, abrir à restante sociedade civil a possibilidade de participar da decisão de escolha dos candidatos que se vão apresentar aos atos legislativos, sem que para tal seja necessária uma associação formal à estrutura partidária. Qualquer pessoa podia, até agora, inscrever-se como externo para participar na eleição da lista que o Livre irá levar às eleições de 9 de junho. As regras mudam, assim, a meio do jogo. A segunda volta das Primárias decorreria a partir da meia noite desta quarta-feira.

O apoio interno a Filipa Pinto. Candidata ficou em segundo lugar na primeira volta das Primárias

Francisco Paupério foi o candidato com mais pontos na primeira volta – 3560,23 – nas últimas eleições legislativas apresentou-se como candidato pelo círculo eleitoral do Porto, no terceiro lugar. Já Filipa Pinto, que foi número dois do Livre pelo mesmo círculo, conseguiu nesta eleição interna 2183,69 pontos. Seguem-se, por ordem decrescente de votação, Carlos M.G.L. Teixeira, Mafalda Dâmaso, Tomás Cardoso Pereira e Inês Pires. Os dois últimos foram, respetivamente, número quatro pela lista de Lisboa às Legislativas e cabeça de lista por Leiria para o mesmo ato eleitoral.

Na contagem dos votos, como se descreve no regulamento do partido, “a cada candidato que seja atribuído o ordinal 1 é atribuída a pontuação de 10”. A cada cardinal subsequente são atribuídos “dois terços da pontuação atribuída ao ordinal imediatamente anterior”. Sempre que o candidato não é ordenado é-lhe atribuído o valor zero.

Ao Observador, fonte dentro do partido destaca o apoio interno que Filipa Pinto recebeu na candidatura, visível na sua página do X, onde revela o apoio do deputado Jorge Pinto, eleito pelo Porto, de Teresa Mota, co porta-voz do partido e de Patrícia Gonçalves, vereadora em substituição de Rui Tavares na Câmara Municipal de Lisboa.

Rui Tavares, co porta-voz e a cara mais conhecida do partido por até 2024 ser deputado único, não apoiou publicamente ninguém, mas dentro do partido há quem destaque o facto de Filipa Pinto ter surgido ao seu lado no sábado passado, em Matosinhos, enquanto o porta-voz falava aos jornalistas à margem do evento em que participavam.

Artigo atualizado às 00:07 com resposta da Comissão Eleitoral e informação sobre os candidatos às Primárias Abertas do Livre.