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Benjamin Netanyahu tornou-se esta quarta-feira no líder estrangeiro que mais vezes discursou perante o Congresso norte-americano: Churchill detinha o recorde com três intervenções, Netanyahu fez a sua quarta. Agradecendo o apoio que os Estados Unidos têm dado a Israel, o primeiro-ministro alertou que é do interesse de Washington este manter-se firme.

Ao longo de quase uma hora, Netanyahu fez um discurso bem estudado e planeado, que contornou os temas mais difíceis. Não se ouviu a expressão “cessar-fogo”, não houve menções à ausência de Kamala Harris, nem aos entraves e pressões que Joe Biden tem colocado a Israel para a aceitação de um acordo.

Em vez disso, o primeiro-ministro israelita deixou vários agradecimentos, apresentou os “heróis” da nação, identificou inimigos comuns aos Estados Unidos e Israel e apresentou planos para o futuro. Entre promessas de luta e vitória, conseguiu galvanizar os ânimos na sala, principalmente do lado republicano.

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“Não se trata de um choque entre civilizações, mas entre bárbaros e civilizações”

Depois de agradecer o convite para falar perante o Congresso norte-americano, Netanyahu partiu ao ataque e definiu a primeira dicotomia. De um lado, a civilização, o bem, nos quais se contam Israel e os Estados Unidos. Do outro lado, a barbárie, o mal, o “eixo do terror” liderado pelo Irão e do qual faz parte o Hamas. “Para as forças da civilização prevalecerem, os Estados Unidos e Israel têm de permanecer unidos. Quando permanecemos juntos, nós ganhamos e eles perdem”, declarou, numa promessa que lhe valeu a primeira ovação de pé.

Como exemplo do “mal”, descreveu os ataques do 7 de outubro e as ações “dos monstros do Hamas”. Como prova viva da tragédia, Netanyahu apresentou Noa Argamani, que esteve refém do Hamas e acompanhou a comitiva israelita a Washington, marcando presença no Capitólio. A jovem foi resgatada, juntamente com outros três reféns, no início de junho, numa operação em que foram mortos pelo menos 271 palestinianos.

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Relembrando a conversa emocional que teve com a mãe de Argamani, Netanyahu prometeu a mesma felicidade a outras famílias. ““Não vou descansar enquanto todos os vossos entes queridos não voltarem a casa”, garantiu aos vários familiares de reféns presentes nas galerias.

Apresentou depois quatro soldados das Forças de Defesa de Israel (IDF), que também se encontravam na audiência. Partilhando de forma detalhada as suas histórias, o primeiro-ministro definiu-os como exemplos da “tremenda coragem” do exército. “Estes são os soldados de Israel: não se deixam abater, não se deixam ameaçar, não têm medo”, declarou, sendo os soldados aclamados com uma nova ovação de pé.

Netanyahu assinalou ainda a presença do pai de um outro soldado, que morreu em Gaza, citando o elogio fúnebre que este escreveu para o filho. Neste, defendia que antes da II Guerra Mundial a imagem na memória coletiva de um judeu era a de um menino indefeso no Holocausto, “mas devido ao nascimento do Estado de Israel, o povo judeu já não está indefeso face aos seus inimigos“.

A menção ao Holocausto foi apenas a primeira de várias referências à história do povo judeu, que o primeiro-ministro utiliza para justificar a sua resiliência face à adversidade e os seus desígnios históricos. Retomando a apologia às IDF, que já definiu anteriormente como “o exército mais moral do mundo“, Netanyahu apelou: “Os soldados aqui presentes não devem ser condenados pela forma como estão a levar a cabo a guerra em Gaza, mas louvados por isso”.

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“Os idiotas úteis para o Irão” e “as mentiras fabricadas pelo Hamas”

Por oposição aos elogios à coragem do povo judeu e do exército israelita, Netanyahu também deixou críticas: aos manifestantes pró-Palestina, ao Irão e até ao Tribunal Penal Internacional. Utilizando novamente a dicotomia entre o bem e o mal, o israelita afirmou que “muitos manifestantes anti-Israel decidem ficar do lado do mal, do Hamas” e que “deviam ter vergonha”.

Mencionando os protestos nos campus universitários norte-americanos, Netanyahu alertou para uma interferência de Teerão. “Tanto quanto sabemos, o Irão também pode ter financiado esta manifestação lá fora. Não são muitos, mas estão lá”, argumentou, referindo-se aos mais de cinco milhares de pessoas que se reuniam à porta do Capitólio.

Insistindo na ligação entre os manifestantes e o Irão classificou-os como “idiotas úteis para o Irão”, sob aplausos e gritos do Congresso. Em linha com a “idiotice”, acusou-os de não perceberem de geografia ou história. De geografia, porque gritam “do rio até ao mar, Palestina será livre”, mas “não sabem indicar a que rio ou a que mar se referem”. De história, pois “Israel sempre foi a casa do povo judeu por mais de 4 mil anos”, citando os profetas para quem Israel foi “a terra prometida”.

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Netanyahu declarou que estes manifestantes se “deixaram convencer pelas mentiras do Hamas”. O mesmo aconteceu aos juízes do Tribunal Penal Internacional, que emitiram mandados de captura em nome do líder israelita. Contrariando o TPI, que identificou os crimes de guerra perpetrados por Israel em Gaza, Netanyahu insistiu que as IDF nunca mataram civis palestinianos, exceto “num acidente” durante uma ofensiva em Rafah, que começou um incêndio num campo de refugiados. As mais de 35 mil mortes relatadas em Gaza? Foram utilizadas como escudos humanos pelo Hamas, assegurou.

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A decisão do TPI põe em causa a liberdade das democracias lutarem contra o terrorismo, defendeu, acrescentando num novo aviso que “se Israel está de mãos atadas, a seguir os Estados Unidos estarão de mãos atadas”.

“O antissemitismo é a forma de ódio mais antiga do mundo. As mentiras de que Israel é um Estado genocida têm como objetivo retirar a legitimidade a Israel e demonizar judeus em todo o lado”, argumentou.

Desmitilitarização e desradicalização: o dia seguinte em Gaza

Depois de comentar o passado, Netanyahu pôs os olhos no futuro. “No dia em que derrotarmos o Hamas, uma nova Gaza pode emergir. A minha visão para esse dia é de uma Gaza desmilitarizada e desradicalizada. Israel não pretende reinstalar-se em Gaza”, explicou.

Contudo, detalhou que Israel deve manter controlo militar da região, por questões de segurança, para limitar a emergência de novas ameaças. “Gaza deve ter uma administração civil, liderada por civis que não queiram destruir Israel. Isso não é pedir demais”, defendeu Benjamin Netanyahu.

Para além da segurança nacional, o primeiro-ministro também se mostrou preocupado com a segurança regional, onde a maior ameaça é o Irão. Uma vez mais, Netanyahu argumentou que as ameaças a Israel são ameaças aos Estados Unidos.

“O Irão compreende que, para derrotar os Estados Unidos, tem de conquistar o Médio Oriente. E faz isto através de proxys como os houthis, o Hezbollah e o Hamas. Mas no coração do Médio Oriente, no caminho do Irão, está uma orgulhosa democracia pró-americana: o meu país, o Estado de Israel”, defendeu, tentando aproximar-se da sua audiência.

Depois de deixados os avisos, ficaram também os pedidos: que o apoio a Israel continue. Afinal, a segurança dos Estados Unidos depende do seu único aliado na região, garantiu. Sugeriu ainda uma coligação de segurança, liderada pelos EUA, contra a ameaça iraniana, comparando-a à aliança do pós-guerra para fazer frente à ameaça soviética.

Netanyahu argumenta que todos os países em paz com Israel devem poder fazer parte dessa potencial aliança, cujo sucesso já ficou provado quando os norte-americanos lideraram a resposta de vários Estados a um ataque em massa de drones e mísseis iranianos.

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“Deem-nos ferramentas, nós damos resultados”

Se à presidência de Biden, Netanyahu elogiou a liderança nesta coligação, os elogios também sobraram para a administração Trump, sob a qual foram assinados os acordos Abraham. À menção do ex-Presidente, o Congresso irrompeu em aplausos na maior ovação da sua intervenção.

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A Biden também já tinha agradecido a visita a Israel, logo após o 7 de outubro, “numa altura sombria” da sua história e o facto de se ter declarado “um sionista orgulhoso”.

Os elogios ainda se estenderam ao povo norte-americano, pela sua disponibilidade para “se sacrificarem pela liberdade”. “A América permanece o farol da liberdade”, defendeu.

Entre os alertas, os elogios e os pedidos, a declaração ao Congresso norte-americano resumiu-se num único apelo: “Deem-nos as ferramentas mais rápido e nós acabamos isto mais rápido”. “Juntos, vamos lutar pela civilização! Juntos, vamos construir um futuro brilhante para as nossas nações!”, concluiu, pouco depois.

Apesar dos protestos nas ruas, na galeria do Capitólio e nos lugares vazios dos deputados, Benjamin Netanyahu saiu do Congresso entre gritos, aplausos e pedidos de fotografias. A mensagem ficou clara: Israel pode precisar dos Estados Unidos, mas os Estados Unidos também precisam de Israel.

*Texto editado por Cátia Andrea Costa