O que diria o Batman, o super-herói por detrás do qual está o milionário Bruce Wayne, se descobrisse que está condenado a possuir apenas um Batmobile por filme, enquanto há um grupo de amigos que têm, nada menos, do que dois? E fazem questão de os utilizar em corridas como o Gumball 3000.

Vamos por partes. Não há miúdo que não gostasse de ter um Batmobile. A maioria até se delicia ao ter uma miniatura, ou mesmo a máscara do próprio Batman. Mas a questão é que esta paixão pelo carro do herói de Gotham City também parece afectar graúdos, alguns dos quais fazem questão em participar numa espécie de corrida, que não é bem uma corrida (já lá vamos), com réplicas perfeitas dos modelos destinados a combater o crime.

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Mais do que uma competição, o Gumball 3000 é um evento onde um vasto grupo de indivíduos ricos se junta a outros que também são famosos. Têm todos em comum uma paixão por carros. Daqueles que andam muito. A organização britânica descreve a iniciativa como um rali reservado a celebridades internacionais, que se disputa em estradas públicas ao longo de 3.000 milhas (4.800 km) e que visa combinar carros vistosos, e de preferência exclusivos, com música, moda e entretenimento. Sendo que todos os participantes, ou quase todos – há sempre um ou outro frouxo, ou menos irresponsável, que evita problemas com a lei –, excedem largamente os limites e são agarrados pela polícia que controla a velocidade. E o ruído. E praticamente tudo o resto.

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De início muito criticado, tendo inclusivamente provocado dois mortos em 2007, na travessia da Macedónia, o Gumball 3000 tem vindo a tornar-se mais respeitável e os seus participantes mais bem-comportados, apesar de as multas por excesso de velocidade continuarem a ser uma constante. Tanto quanto a apreensão dos veículos.

A primeira edição deste rali/passeio para vedetas milionárias teve lugar em 1999 e, deste então, tem-se repetido anualmente, com incursões por praticamente todos os países europeus. Espanha já foi contemplada – Portugal ainda não, obviamente com bastante pena para os oficiais da Brigada de Trânsito da GNR –, e os EUA foram palco do evento múltiplas vezes, tendo o programa até tido direito à visita da mansão Playboy de Hugh Hefner. China, Canadá, Turquia e Ibiza também acolheram o Gumball 3000, com a edição de 2016, que arrancou em Maio, a ligar Dublin a Bucareste.

São muitos os críticos que consideram os participantes do Gumball 3000 verdadeiros alarves sobre rodas. Ao que os organizadores respondem com factos: “Ajudamos os necessitados mais do que muitas outras iniciativas, mesmo de maiores dimensões, e estimulamos o comércio e o negócio local de todos os pontos que visitamos.” Certo é que cada equipa participante paga 62.000 dólares (cerca de 52.000€), o que explica a facilidade com que o evento reuniu em 2015 mais de 1 milhão de dólares para apoios sociais. Já em relação aos gastos nos restaurantes e bares das zonas visitadas é melhor nem falar. É a “desbunda” total.

Às voltas de Batmobile

Os melhores e mais recentes superdesportivos do mundo podem ser vistos no Gumball 3000. O problema para muitos dos participantes é que os Bugatti Veyron, Lamborghini Aventador, Ferrari 488 e Koenigsegg One, se bem que veículos impressionantes, a este nível já não fazem suspirar nem virar a cabeça, pois todos já parecem ter um.

Para manter vivo o espírito da prova, pelo menos na opinião de alguns, é forçoso ir um pouco mais longe. E gastar mais uns milhões no processo. Foi este o princípio que presidiu à formação da equipa (Team Galag) que inclui apaixonados por automóveis velozes, entre os 21 e os 34 anos, a maioria sauditas, mas também americanos, alemães e ingleses. Para se destacarem entre mais de 100 superdesportivos, nada melhor do que recorrer ao carro de um super-herói. E, entre eles, ninguém bate o Batman. Assim, para edição de 2013 da Gumball 3000, que ligou Copenhaga ao principado do Mónaco, o Team Galag alinhou num Batmobile Tumbler. Mas como não há Tumblers à venda no “stand” de Gotham City, nem em qualquer outro local, os rapazes deitaram mãos à obra e encomendaram um. Recorreram a um especialista em carros para cinema, o Parker Brothers Concepts, na Florida, que não só produziu o monstro, como o fez de forma a poder circular legalmente na via pública e suportar os 4.800 km do percurso.

É bom recordar que o Tumbler não foi o primeiro Batmobile a correr numa Gumball, pois já em 2010 (de Londres a Nova Iorque) houve um corajoso que adaptou uma carroçaria em fibra em tudo similar ao carro utilizado pelo Batman – representado por Michael Keaton em 1989 e 1992 – a um automóvel convencional. Não era uma réplica perfeita, mas teve a honra de ser a primeira participação de Bruce Wayne na corrida.

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Para a edição deste ano, o Team Galag voltou ao ataque, decidido a continuar a surfar a onda do homem morcego. Aborrecidos com a falta de fiabilidade que o Tumbler tinha evidenciado três anos antes, e sem tempo para conceber um veículo com base no “Batman vs Superman” de 2016, os homens do Galag decidiram mudar de ares. Dos EUA saltaram para a Suécia. O preparador escolhido foi Leif Tufvesson, o engenheiro que trabalhou na Volvo e que durante anos foi o responsável pelos Koenigsegg. Tufvesson restaura clássicos e produz Hot Rods na Caresto, que fundou em Ängelholm, desde 1996. A sua empresa já concebe veículos impressionantes, mas um Batmobile seria um desafio estimulante. O projecto do Team Galag passava por produzir uma réplica do recente Batmobile que surgiu no “Arkham Knight”, o mais recente videojogo da Rocksteady Studios. A falta de tempo levou Tufvesson a partir como base de um Lamborghini Gallardo e do seu 5,2 V10 de 520 cv, o que não o impediu de conceber uma estrutura tubular mais volumosa para suportar a carroçaria, bem como adaptar as suspensões à montagem de jantes de 26” e pneus de alto perfil. O resultado foi um veículo fiável e, decididamente, o mais exuberante do Gumball 2016 – o objectivo último dos homens do Team Galag, que parecem apostados em fazer o Batman morrer. De inveja.

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Uma carreira de altos e baixos

Descontando as séries televisivas e as bandas desenhadas, o Batman já foi estrela em nove filmes desde que se iniciou na Sétima Arte, em 1966. Há quem diga – um grupo de estudantes da Universidade de Leicester, em Inglaterra, publicou um trabalho científico sobre o tema – que a principal dor de cabeça dos bandidos de Gotham City, é o super-herói menos bem equipado no que respeita a superpoderes. Mas o Batman não é homem para ficar melindrado com as conclusões de um bando de miúdos ingleses que se entretêm a analisar os heróis da DC Comics e da Marvel. Já salva gente das garras dos maus há precisamente 50 anos, e a prova de que a sua popularidade continua em alta é que, depois de já este ano ter sido uma das estrelas no filme “Batman vs Superman: A Origem da Justiça”, vai actuar a solo numa película que está prevista estrear em 2018.

Batmobile há seis

Mesmo “mal equipado”, o Batman continua a operar verdadeiros milagres e os seus carros são considerados os mais exuberantes do cinema de ficção. Há meio século que deliciam miúdos e graúdos – menos os de Leicester.

Ao longo dos 50 anos da carreira de Batman na Sétima Arte – fora dela, em série televisivas e cartoons, o super-herói aparentado de morcego deu os primeiros passos em 1939 –, foram produzidos seis diferentes Batmobile. Tantos quanto os actores que interpretaram o papel do homem que enfrenta o mal vestindo um fato de borracha com orelhas em bico e uma capa negra.

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O primeiro Batmobile, o que anima o filme de 1966, era uma versão ligeiramente alterada de um Ford Lincoln Futura de 1955. Apesar de pouco sofisticado, o carro criado por George Barris e que serviu o actor Adam West foi vendido num leilão a 19 de Janeiro de 2013, em Scottsdale, no Arizona, pela impressionante quantia de 4,62 milhões de dólares. Empatou, numa licitação similar, com o valor pago pelo Aston Martin DB5 de James Bond utilizado no “Goldfinger”, convertendo-se no líder, em “ex-aequo”, do carro de cinema mais valorizado da história.

Foi necessário esperar 23 anos para se assistir ao segundo filme de Batman, cuja aceitação foi de tal forma positiva que três anos depois surgiria o terceiro produto cinematográfico dedicado ao defensor de Gotham. Ambos os filmes tiveram Michael Keaton no principal papel e o seu Batmobile foi o primeiro a suscitar grande notoriedade. Impressionante de dimensões, com 6,62 metros de comprimento e 2,40 metros de largura, era equipado com uma turbina herdada de um antigo avião a jacto da Boeing. Na realidade, o carro que ajudou Keaton a enfrentar os criminosos em “Batman” e “Batman: O Retorno”, respectivamente em 1989 e 1992, era mais um adereço do que um verdadeiro veículo funcional e foi construído tendo como base um Chevrolet Impala de 1985. A turbina não funcionava e todas as capacidades do veículo eram devidas à habilidade da equipa de efeitos especiais. O Batmobile original, dos dois filmes dirigidos por Tim Burton, está em exposição no Museu Petersen Automotive, em Los Angeles. E há por aí muitas réplicas, mas a melhor é a construída pelo piloto e preparador de carros de competição Casey Putsch, a única em que a turbina a jacto funciona e locomove o Batmobile. E se não acredita, veja o vídeo.

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Depois de dois filmes de sucesso com a dupla Tim Burton e Michael Keaton, a realização e a personagem principal foi confiada a Joel Schumacher e a Val Kilmer (“Batman Forever”, em 1995) e a Shumacher e George Clooney (“Batman and Robin”, em 1997). A coisa não podia ter corrido pior. Ambos os filmes figuram nas duas primeiras posições, mas da nada invejável tabela dos piores filmes do homem morcego. Foi tudo tão mau, que nem os Batmobile ficaram na memória.

Para ultrapassar a catástrofe, foi lançada uma trilogia de filmes (“Batman: O Início”, em 2005, “O Cavaleiro das Trevas”, em 2008, e “O Cavaleiro das Trevas Ressurge”, em 2012), com Christopher Nolan ao leme e Christian Bale como herói. Foi o melhor conjunto de filmes até aqui, os únicos a ultrapassar o sucesso das obras de Burton/Keaton. A popularidade desta trilogia estendeu-se ao Batmobile, com o Tumbler a assumir-se como o mais popular alguma vez construído e o único (para além do Lincoln Futura do filme de 1966) a ser utilizável.

Este monstro produzido pela Wayne Enterprises, com fins militares, de que foram construídas sete unidades – uma das quais sem mecânica e três que foram destruídas durantes as filmagens –, pesava 2.300 kg, possuía um motor 5.7 V8 a gasolina da Chevrolet e era capaz de atingir 160 km/h, ultrapassando os 100 km/h em 5,6 segundos. Foi o Batmobile que gerou mais réplicas – há cinco a circular por aí, uma das quais foi vendida em 2014 por um milhão de dólares. Para fazer uma ideia do que estamos a falar, o melhor é ver o vídeo, com o conhecido Jay Leno ao volante deste impressionante e ruidoso veículo.

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No mais recente filme protagonizado por Batman, o herói não entrou a solo – “Batman contra Superman” – e o filme está longe de poder ser considerado um sucesso. Pelo menos pelos críticos, que o tratam como lixo. É mais um ciclo negativo de Bruce Wayne e do seu Batmobile, que se arrisca a também não ficar para a história. Resta-nos depositar esperança em 2018, no filme em que o defensor de Gotham volta a trabalhar a solo. Tanto quanto se comenta em Holywood, Batman continuará a ser interpretado por Ben Affleck, que também vai assumir a realização.

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