Qual é coisa qual é ela que tem corpo de cavalo, cauda de leão e um corno no meio da testa? É o unicórnio. Esta figura mitológica aparece geralmente envolta numa aura branca como o corpo, simbolizando a pureza e reforçando o mito de que apenas uma virgem a poderia domar. Surge nas lendas da antiguidade, mas terá alguma vez sido visto?

O cientista alemão, Otto von Guericke, queria acreditar que sim. Chegou mesmo a encontrar (ou forjar) um esqueleto parcial de um, com ossos descoberto em Quedlinburg, na Alemanha, em 1663. Agora acredita-se que o crânio seria provavelmente de mamute e os restante ossos de rinoceronte-lanudo. Excepto o corno, que esse tem outra história.

Era relativamente comum encontrar cornos de unicórnios nos Gabinetes de Curiosidades – espaços que, nos séculos XVII e XVIII, reuniam todo o tipo de espécimes e artefactos, fossem de origem natural ou fabricados pelo Homem, estivessem relacionados com a religião ou com o sobrenatural. O mito alimentava a crença de que quem possuísse um corno de unicórnio estava livre do envenenamento.

Mas foi num desses Gabinetes de Curiosidades, no de Ole Worm, que o mito caiu. Já em 1638, o médico e antiquário dinamarquês, que gostava de estudar os espécimes que tinha na coleção de história natural, tinha demonstrado que os cornos de unicórnio eram, na verdade, dentes de narval.

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Cada animal, mais propriamente cada macho, só tem um destes dentes longos e espiralados que deram origem ao mito. O dente direito do macho e os dois dentes da fêmea normalmente não se desenvolvem, e não têm qualquer função. Mesmo sem dentes funcionais tem uma dieta variada, que inclui lulas, peixes e crustáceos, que captura usando um pescoço flexível e um boca capaz de uma sucção poderosa. Um leitor do Science News comenta que o narval seria até capaz de tirar uma bola de um buraco de golfe.

Mesmo sabendo que o dente pertence a um mamífero aparentado dos golfinhos e orcas, este continua a despertar muita curiosidade. É grande, podendo ter cerca de metade do tamanho do animal – até três metros e dez quilos -, e a espiral tem sempre o sentido contrário ao dos ponteiro do relógio, mas a função ainda não é totalmente conhecida.

Pode servir para disputas entre machos e para cativar as fêmeas ou ser um órgão sensorial, como tenta demonstrar Martin Nweeia, dentista no Connecticut e professor da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. O estudo publicado em março deste ano pela revista The Anatomical Record explica que a parte mais externa do dente é porosa e transporta os sinais químicos, como a salinidade da água, até à parte mais interna, um canal nervoso que transmite a mensagem ao cérebro. No entanto, existem ainda muitos mistérios por descobrir sobre este “unicórnio do mar”.